Diário de um pai em casa — Dia 18


De headphones colados à cabeça, braços atirados ao ar, cantei, diversas vezes, alto e bom som, o refrão:

“Everyday is like Sunday

Everyday is silent and grey”

Convido todos a escutar esta canção. Ficar atentos à letra. Fala de “Armageddon”, referência bíblica à batalha final entre o bem, aqui redirecionado para uma guerra nuclear global, e o mal. E de “How i dearly wish i was not here”, o que para os tempos que vivemos tem toda atualidade de um grito de libertação. Traduzo “Como eu adoraria não estar aqui”. Aqui fechado em casa.

No intervalo das minhas danças matinais, o silêncio da casa foi interrompido pelo som de “Chan Chan” de Compay Segundo, Buena Vista Social Club. A Zezinha, minha mulher, gosta muito de música. E tem muito bom gosto, reconheço.

De imediato, abandonei o Morrissey. Pulei do conforto do sofá. Aumentei o volume. Estendi a mão à minha mulher. Dançámos, por uns segundos, na sala vazia. Foi tão bom. Obrigado, quarentena.

A hora mudou. O sol rodou. Mas tudo ficou na mesma num domingo em que ninguém saiu de casa. As quatro crianças permaneceram de pijama. Cada qual no seu canto, o que me deu uma paz de espírito.

A Teresinha colocou os cadernos da escola em ordem, a Francisca andou de mão dada com a Netflix e o José Maria que ameaçou ver canais desportivos (todos sintonizados numa espécie de Domingo Desportivo revisitando jogos passados à falta de competições do presente), não colocou um pé fora do quarto. Por fim, o António, o benjamim, fez a pergunta da praxe. “Pai, que dia é hoje”. Domingo, respondi.

E lá regressou a música. “Everyday is like Sunday”. Não me sai da cabeça. Nem a dança ao som de Compay Segundo. Apetece-me dançar. E cantar o refrão:

De alto Cedro voy para Marcané
Llegó a Cueto voy para Mayarí