No final do depoimento desta manhã, na 17.ª sessão do julgamento do processo Football Leaks, no Tribunal Central Criminal de Lisboa, o especialista em direito fiscal revelou, após uma questão do coletivo de juízes, que não tinha clientes no universo do futebol, mas não foi tão taxativo em relação ao caso Luanda Leaks.
O caso expôs em janeiro de 2020 alegados esquemas financeiros da empresária Isabel dos Santos e do marido, que lhes terão permitido retirar dinheiro do erário público angolano através de paraísos fiscais.
“Pessoalmente, não me lembro de ter trabalhado [para Isabel dos Santos], mas, se houve uma questão de direito fiscal, de certeza devo ter e-mails sobre isso na minha caixa de correio”, afirmou, acrescentando: “Depois, houve um jornal que publicou uma notícia relacionada com a área fiscal e percebi que poderia ser [através de] algo do nosso departamento [na PLMJ]. Era uma história ligada à engenheira Isabel dos Santos”.
De acordo com João Ramalho, de 51 anos, que esteve ligado ao escritório de advogados entre 1999 e 2019, a intrusão no sistema informático entre o final de 2018 e o início de 2019 gerou “muita preocupação” e levou mesmo “a um corte da relação” por parte de alguns clientes, com “implicações ao nível patrimonial e pessoal sérias” na sociedade.
“Eu era sócio do escritório. Sei o valor que a PLMJ teve de investir em serviços de apoio e melhoria do sistema para perceber o que estava a acontecer, foram milhares e milhares de euros. Houve uma parte desse valor, muito significativo, que representou um prejuízo e foram menos lucros para os sócios”, vincou o advogado, elencando ainda danos ao nível da faturação e em termos pessoais.
Confrontado pela defesa de Rui Pinto com o impacto das revelações no âmbito do Football Leaks e Luanda Leaks, João Ramalho considerou, na condição de cidadão, não apreciar o tipo de operações expostas nesses dossiês. Contudo, reiterou que “os meios não justificam os fins” e que ficou “altamente incomodado e ofendido” com o acesso à caixa de correio eletrónica.
“Há uma ponderação de valores e não justifica tudo. Se não, via alguém a roubar na rua, dava um tiro e era justificado”, atirou, sem deixar de salientar à advogada de defesa de Rui Pinto, Luísa Teixeira da Mota, que este tipo de situação “tolera-se sempre melhor nos outros” e que por o envolver diretamente foi “complicado”.
A primeira parte da sessão de hoje contou também com as audições do advogado Paulo Farinha Alves - que reportou na sala de audiência um “desconforto muito significativo” com a intrusão no sistema informático da sociedade – e do técnico de sistemas de informação António Faria, que contou que chegaram a visualizar o blogue ‘Mercado de Benfica’, onde foram publicados documentos da PLMJ, numa sala segura e sem ligação ao sistema interno.
A sessão prossegue de tarde com as audições dos advogados José Miguel Júdice, Nuno Morais Sarmento, Cármen Vasquez e Inês Pinto da Costa.
Rui Pinto, de 31 anos, responde por um total de 90 crimes: 68 de acesso indevido, 14 de violação de correspondência, seis de acesso ilegítimo, visando entidades como o Sporting, a Doyen, a sociedade de advogados PLMJ, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e a Procuradoria-Geral da República (PGR), e ainda por sabotagem informática à SAD do Sporting e por extorsão, na forma tentada. Este último crime diz respeito à Doyen e foi o que levou também à pronúncia do advogado Aníbal Pinto.
O criador do Football Leaks encontra-se em liberdade desde 7 de agosto, “devido à sua colaboração” com a Polícia Judiciária (PJ) e ao seu “sentido crítico”, mas está, por questões de segurança, inserido no programa de proteção de testemunhas em local não revelado e sob proteção policial.
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