O historiador e docente universitário Avelino Menezes refere que “à luz dos sentimentos proamericanos e anticomunistas da população açoriana, quando se alvitra em 1975 a instalação de um consulado soviético, os Estados Unidos esboçam um plano de intervenção no arquipélago para garantia do livre acesso à base das Lajes e assegurar o controlo do Atlântico e a entrada no Mediterrâneo”.
A 6 de junho de 1975, uma manifestação reuniu cerca de 10 mil pessoas, predominantemente lavradores, que se batiam por diversas reivindicações e se juntaram contra o regime que vigorava em Lisboa. Este ano, o Dia da Região Autónoma dos Açores, que se comemora, na segunda-feira, também dia do Espírito Santo, coincide com a data da manifestação.
A concentração acabou por ficar conotada com a defesa da independência dos Açores e com a FLA – Frente de Libertação dos Açores, cujo fundador e líder histórico, José de Almeida, faleceu a 1 de dezembro de 2014.
Avelino Menezes, em declarações à Agência Lusa, aponta que é a CIA (Central Intelligence Agency) que “assume a dianteira na aproximação aos separatistas açorianos”.
Mas ainda em 1975, em Lisboa, a “contenção dos radicais e a ascenção dos moderados motiva o recuo dos Estados Unidos, que optam pela neutralidade”, ressalva o historiador.
“É o próprio presidente Gerald Ford que protagoniza a inversão de posições quando diz, por exemplo: «teríamos ficado contentes se a independência tivesse acontecido durante um governo comunista mas agora, com um governo melhor é necessário unidade»”, cita Avelino Menezes.
O historiador frisa que, “com a redução do predomínio do Partido Comunista no continente, assistiu-se ao decréscimo da importância da FLA nos Açores”.
Já para o docente universitário, estudioso da geopolítica e geoestratégia Luís Andrade, Washington “poderia ter essa visão”, mas “oficialmente nunca a manifestou”.
Luís Andrade diz que, na altura, tanto o embaixador norte-americano em Lisboa, Frank Carlucci, como o Consulado dos Estados Unidos em Ponta Delgada “nunca admitiram" a perspetiva de uma independência dos Açores.
O docente ressalva que, “se a situação se tivesse deteriorado e houvesse uma enorme imprevisibilidade e instabilidade” no Governo central, sobretudo no verão de 1975, era "muito possível" que os norte-americanos apoiassem a independência.
Citando Henry Kissinger, ex-secretário de Estado dos Estados Unidos, que escreveu que Portugal estava perdido para o comunismo no denominado "verão quente", Luís Andrade refere que “não se pode dizer claramente que os Estados Unidos queriam ocupar as ilhas dos Açores se a situação se complicasse a nível nacional”, mas não se admira “absolutamente nada que se tenha pensado seriamente no assunto”.
O docente universitário admite que “houve alguns contactos” do líder da FLA com “várias entidades americanas”, visando a independência dos Açores, mas “ao nível mais elevado da administração norte-americana" o responsável "nunca foi recebido”.
Tendo a necessidade de salvaguardar a base das Lajes, na ilha Terceira, os norte-americanos "jogaram com os dois lados, com o governo português, mantendo uma relação mínima, não quebrando o relacionamento, por um lado, mas atentos à situação nos Açores, por outro”, disse Luís Andrade.
De acordo com documentos secretos norte-americanos que foram entretanto divulgados publicamente, Washington - que deu indicações aos seus militares para defenderem a base das Lajes a tiro, se necessário - tinha vários cenários previstos para os Açores, o primeiro dos quais apontava por manter a sua neutralidade, não informando o governo português sobre as atividades separatistas e possível ataque, e dizendo à FLA que não se iriam envolver.
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