Na abertura da 201.ª Assembleia Plenária da CEP, que tem a questão dos abusos no seio da Igreja como tema que suscita as maiores atenções, sendo dada como certa a criação de um grupo coordenador nacional para tratar do tema, o também bispo de Setúbal, José Ornelas, disse que o tema é “desafiador para toda a sociedade” e que a Igreja o toma “como prioritário”.

“É um dos assuntos desta Assembleia, no propósito de verificar os processos em curso, articular melhor as instâncias diocesanas e a coordenação nacional, de modo a oferecer oportunidades seguras e fiáveis no acolhimento de denúncias e acompanhamento às vítimas de abusos, na clarificação de processos e, sobretudo, na formação de pessoas”, disse o presidente da Conferência Episcopal, deixando a garantia: “Faremos tudo para proteger as vítimas, apurar a verdade histórica e impedir estas situações dramáticas que destroem pessoas e contradizem o ser e a missão da Igreja”.

José Ornelas aproveitou ainda o momento para citar o Papa Francisco, segundo o qual “a proteção dos menores é, cada vez mais, concretamente, uma prioridade ordinária na ação educativa da Igreja, é promoção de um serviço aberto, fiável e autorizado, em firme contraste com qualquer forma de dominação, desfiguração da intimidade e silêncio cúmplice”.

Como admitiu o secretário da CEP, padre Manuel Barbosa, em 12 de outubro, a Igreja Católica em Portugal vai avançar com a constituição de uma comissão nacional de coordenação das comissões diocesanas de proteção de menores e adultos vulneráveis.

Esta comissão terá como objetivo definir critérios e procedimentos comuns às 21 comissões diocesanas, bem como prestar-lhes apoio, nomeadamente na gestão da informação.

A criação de um manual de procedimentos comum a todas as dioceses e organismos da Igreja perante denúncias de abuso sexual será um dos objetivos do grupo coordenador a ser criado na Assembleia Plenária do episcopado que hoje começou e se prolonga até à próxima quinta-feira.

No final da reunião do Conselho Permanente da CEP, em 12 de outubro, o padre Manuel Barbosa disse que “a Igreja reconhece a gravidade da situação” dos abusos no seio da Igreja e “continua a tratá-la com toda a seriedade”.

Além da constituição do grupo coordenador, a Conferência Episcopal, “se julgar conveniente, poderá tomar outras medidas, sempre no propósito de rejeitar qualquer encobrimento de casos”.

Alguma expectativa tem sido criada, entretanto, em torno da possibilidade de, à semelhança do que aconteceu já noutros países, em Portugal vir a ser também constituída uma comissão independente que investigue a situação dos abusos no seio da Igreja no país.

O bispo de Leiria-Fátima, cardeal António Marto, já admitiu que “a Igreja está disposta a olhar e a realizar com determinação todos os esforços necessários para pôr fim a estes dramas, a esta chaga que a atingiu profundamente, quer com o cuidado das vítimas, no acolhimento, do apoio humano, psicológico, espiritual e de reparação, quer atendendo ao presente numa atitude preventiva, de prevenção, e sem contemplações”.

“Não há contemplações neste campo e todas as ações que tiverem de ser feitas pelo reconhecimento da verdade deverão ser feitas”, acrescentou António Marto, em conferência de imprensa no âmbito da peregrinação de 12 e 13 de outubro ao Santuário de Fátima.

Abordando na ocasião a divulgação de um relatório segundo o qual mais de 300 mil menores terão sido abusados e agredidos em instituições da Igreja Católica francesa, António Marto evocou as palavras do Papa Francisco - “a dor, tristeza, a vergonha” - e o “seu apelo a fazer todos os esforços”, para que “tais dramas não se possam repetir”.

Mais recentemente, em entrevista ao Expresso, foi a vez do presidente da CEP, José Ornelas, admitir que está a ser seguido “o caminho que está a fazer a Igreja inteira de tolerância zero para atos deste género”.

“Temos pena de ter de enfrentar coisas destas, mas não temos medo! Pior é não o fazer, porque isso é traição ao que é ser Igreja”, adiantou o prelado.

Além da questão da “proteção de menores e adultos vulneráveis”, os bispos portugueses vão debater também, na reunião de Fátima, o “itinerário de iniciação à vida cristã com as famílias, crianças e adolescentes”, o sínodo dos bispos que o Papa Francisco abriu em Roma no início de outubro e a Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023.

Durante os dias de reunião, haverá ainda um período de formação sobre o Livro VI do Código de Direito Canónico, sob a orientação de Juan Ignatio Arrieta, secretário do Conselho Pontifício para a Interpretação dos Textos Legislativos

Com a Constituição Apostólica "Pascite Gregem Dei", o Papa Francisco reformou o Livro VI do Código de Direito Canónico, um trabalho de revisão iniciado com Bento XVI, através do qual “são sancionados novos delitos”.

O novo texto é um instrumento corretivo mais ágil, a ser usado prontamente para "evitar males mais graves e acalmar as feridas causadas pela fraqueza humana", segundo o portal de notícias do Vaticano, Vatican News.

O novo texto entrará em vigor em 08 de dezembro deste ano.

A Assembleia Plenária da CEP vai ficar marcada também, na quinta-feira, às 08:00, pela celebração pelos bispos, na Capelinha das Aparições do Santuário de Fátima, de uma missa pelas vítimas da pandemia de covid-19.

Presidente da Conferência Episcopal apela ao “sentido de Estado” dos políticos perante a crise

O presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) apelou ainda aos agentes políticos para que, perante a atual crise política, “encarem com credibilidade e sentido de Estado os grandes desafios e oportunidades que se encontram no futuro imediato” dos portugueses.

“No nosso país, vivemos tempos de dificuldades, mas também de grande esperança, que exigem, uma vez mais, o empenho e a mobilização de todos. O momento é delicado”, alertou José Ornelas, também bispo de Setúbal, na abertura da 201.ª Assembleia Plenária da CEP, que hoje se iniciou em Fátima e se prolonga até quinta-feira.

Para o presidente da CEP, “depois da rejeição da proposta do Orçamento do Estado, da dissolução anunciada da Assembleia da República e consequente realização de eleições antecipadas, exige-se agora que todos” estejam “à altura”.

Segundo o bispo, “isto significa tomar decisões certas que tenham por base única e exclusivamente o bem comum, sobretudo numa atenção particular aos mais frágeis e marginalizados e a todos aqueles que por causa da pandemia enfrentam agora tantos problemas sociais e económicos”.

“Por mais que o processo tenha levado muitas pessoas ao ceticismo sobre o panorama político nacional, é fundamental que esta nova etapa da vida do país possa contar com a participação acrescida dos cidadãos, na clarificação do panorama político”, sendo também “urgente que os partidos e todos os intervenientes encarem com credibilidade e sentido de Estado os grandes desafios e oportunidades que se encontram no futuro imediato de todos nós”, disse José Ornelas perante o plenário do episcopado português.

O bispo de Setúbal aproveitou depois para criticar a aprovação, na semana passada, da legislação sobre a eutanásia, tendo em conta o anúncio de dissolução do parlamento.

“Diante deste quadro político em que o país mergulhou, torna-se ainda mais incompreensível a discussão e aprovação da lei da eutanásia por uma Assembleia da República moribunda”, afirmou o presidente da CEP, acrescentando que “o modo e o momento desta iniciativa parlamentar lançam um ulterior manto de sombra sobre todo o processo desta lei, que não dignifica os últimos dias desta legislatura”.

“A ideologia não se pode sobrepor à defesa intransigente do direito à vida, plasmado na nossa Constituição. As mais altas instâncias do país devem, por isso, pronunciar-se de acordo com as prerrogativas constitucionais de que dispõem”, apelou o prelado, assegurando que “do lado da Igreja fica a garantia de que continuará a fazer tudo para que a dignidade da vida humana seja respeitada sem ser necessário o recurso à morte”.