José Afonso comentava à Lusa a importância da primeira 'fotografia' de um buraco negro, o da galáxia M87, graças às observações de uma rede de oito radiotelescópios espalhados pelo mundo - Event Horizon Telescope.
A imagem foi hoje divulgada e os resultados das observações comunicados em diversas conferências de imprensa em simultâneo, incluindo em Bruxelas, Bélgica, e publicados num número especial da revista da especialidade The Astrophysical Journal Letters.
"É uma vitória do espírito humano e da técnica", expressou José Afonso, astrofísico especialista no estudo de galáxias, assinalando que "pela primeira vez" foi possível "observar diretamente" um buraco negro, um "corpo denso" que não deixa escapar nada, nem mesmo a luz.
"Só foi possível devido ao avanço tecnológico", insistiu, acrescentando que foi preciso conjugar de "uma forma fina" os vários instrumentos e "mantê-los em sintonia".
Segundo José Afonso, nem mesmo os astrónomos acreditavam que era possível usar os "melhores radiotelescópios" e "pô-los a funcionar como um único para serem capazes de obter esta imagem".
O diretor do IA lembrou que os oito radiotelescópios, que, como todos os radiotelescópios, captam as ondas de rádio emitidas por corpos celestes através de uma ou várias antenas de grandes dimensões, foram construídos para "observar galáxias, como nascem estrelas".
"Um buraco negro é uma coisa minúscula no céu. É necessário mesmo um telescópio do tamanho da Terra [para obter uma imagem]. Depois, é preciso estar a observar na radiação indicada [no caso foram as ondas de rádio emitidas] para o buraco negro não ficar escondido [pela luz emitida por outros corpos celestes], uma vez que está no centro de uma galáxia", esclareceu.
Para José Afonso, a imagem do buraco negro da galáxia M87 é também "mais uma vitória" da Teoria da Relatividade Geral, de 1915, do físico Albert Einstein, pois "é novamente comprovada". A teoria postula que a presença de buracos negros, os objetos cósmicos mais extremos do Universo, deforma o espaço-tempo e sobreaquece o material em seu redor.
O astrofísico português explicou que na imagem "há uma zona mais escura" e uma auréola, que corresponde a luz proveniente de material que está por detrás do buraco negro propriamente dito, sendo que a luz "vem na direção" de um observador na Terra "devido à deformação do espaço" provocada pelo próprio corpo.
A sua sombra é, de acordo com a equipa científica envolvida na observação, o mais próximo da imagem do buraco negro, uma vez que este é totalmente escuro.
Sobre o alcance da observação, o diretor do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço disse que a obtenção da imagem de um buraco negro permitirá aprofundar o estudo destes objetos celestes, uma vez que "agora é possível medir a massa de forma direta a partir da zona escura".
Além disso, a luz da auréola "permite estimar se um buraco negro está a rodar ou não" e "saber quais são as velocidades" do material do qual emana a luz.
José Afonso adiantou que, conhecendo melhor a natureza de um buraco negro, é possível perceber como se formaram as galáxias.
"Muito do que sabemos, ou pensamos saber, sobre a história do Universo está também baseado nos buracos negros, que agora podem ser estudados de uma forma mais detalhada", sublinhou.
O buraco negro da galáxia M87 tem uma massa 6,5 mil milhões de vezes superior à do Sol e está a 55 milhões de anos-luz da Terra.
Da equipa de mais de 200 investigadores que participaram na sua observação faz parte o astrofísico português Hugo Messias, do observatório ALMA, no Chile.
Comentários