Em causa está a remoção deliberada do preservativo durante a relação sexual sem o consentimento do parceiro. O PAN pretende, segundo o projeto de lei apresentado em novembro, que a prática integre o crime de fraude sexual e seja punido com pena de até três anos de prisão.

Associações de apoio especializado à vítima de violência sexual:

Quebrar o Silêncio (apoio para homens e rapazes vítimas de abusos sexuais)
910 846 589
apoio@quebrarosilencio.pt

Associação de Mulheres Contra a Violência - AMCV
213 802 165
ca@amcv.org.pt

Emancipação, Igualdade e Recuperação - EIR UMAR
914 736 078
eir.centro@gmail.com

No parecer remetido ao Parlamento e consultado hoje pela Lusa, o CSM saúda a abertura da discussão, mas contesta o entendimento de que o “stealthing” constitui fraude sexual, uma vez que este ilícito tem como “pressuposto da incriminação o aproveitamento do erro da vítima sobre a identidade” do agressor, e “não qualquer outro erro”.

O órgão de gestão e disciplina dos juízes afasta igualmente a integração da prática no crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência, admitindo que possa antes tratar-se do de violação. O CSM ressalva, porém, que esta última posição não é consensual na doutrina.

“Qualquer alteração à lei vigente, tendo presente a relativa novidade do tema, carece de aprofundado debate jurídico que importe soluções devidamente amadurecidas, por forma a evitar sucessivas alterações do sistema penal que em nada contribuem para a boa administração da justiça”, lê-se no parecer enviado à Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, à qual foi distribuído o projeto de lei do PAN.

A Ordem dos Advogados (OA) contesta, por sua vez, o enquadramento jurídico do “stealthing” quer na fraude sexual, com argumentos similares aos do CSM, quer na violação.

“O crime de violação consagra o ato de obrigar outra pessoa a praticar atos sexuais, enquanto no ‘stealthing’ os atos são voluntários, até à remoção não consentida. Parece-nos que, em respeito por este elemento do tipo, o crime de violação não se afigura como solução para o desiderato de assegurar a criminalização do ‘stealthing’ e a proteção das vítimas”, sustenta, no parecer remetido à Assembleia da República, a associação profissional.

Em alternativa, a OA propõe que seja ponderada a criação de um novo tipo de crime, acrescentando que “a dificuldade de obtenção ou de produção de prova não poderá, nunca, ser obstáculo à criminalização de uma conduta”.

“Em suma e em jeito de conclusão, a Ordem dos Advogados concorda com a criminalização do denominado ‘stealthing’, mas não pode, contudo, emitir parecer favorável a esta concreta proposta, com as reservas e considerações acima expostas”, remata a associação profissional.

Já a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) – para a qual a prática se trata de violação e não de fraude sexual – sublinha que, “mais do que uma alteração cirúrgica para garantir a relevância penal da remoção não consentida do preservativo”, se impõe uma “mudança de paradigma”.

Tal passa pela substituição no crime de violação do conceito de constrangimento pelo de consentimento.

“E é por esta via, complementada por uma correta descrição do que se entende por consentimento e pela exigência de que este abranja não apenas a participação no ato sexual mas também as condições essenciais que o envolvem, que se dissipará qualquer dúvida quanto à natureza criminosa e à qualificação jurídica do comportamento de remoção não consentida do preservativo”, antevê, no seu contributo, a APAV.

A discussão preliminar do projeto de lei do PAN, que visa a alteração do Código Penal, está agendada para 08 de janeiro, na Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

Em novembro de 2024, uma petição pela criminalização do “stealthing” em Portugal juntou mais de 10.000 assinaturas. O abaixo-assinado foi lançado depois de terem surgido denúncias de violação, abuso sexual e assédio no mundo do jazz.