Num ano marcado pela pandemia de covid-19, a percentagem de portugueses que não foram ao médico dentista nos últimos 12 meses subiu quase cinco pontos percentuais, face aos valores de 2019.
Os dados do Barómetro de Saúde Oral, realizado pela consultora QSP para a Ordem dos Médicos Dentistas (OMD), mostram que 17% dos portugueses diminuíram o número de idas ao dentista, sendo que destes, 56,5% justificam a redução com a pandemia e 9,8% com questões monetárias.
Há, no entanto, diferenças significativas entre o comportamento dos homens e das mulheres. Enquanto 44,1% dos homens não visitam o dentista há mais de um ano, a percentagem entre as mulheres é de 36,7%.
Em 2020 o estudo não foi realizado devido à pandemia e os dados deste ano mostram “um agravamento relativamente às não idas da população portuguesa aos médicos dentistas”, disse à agência Lusa o bastonário da OMD, Miguel Pavão.
Para Miguel Pavão, a situação de pandemia “veio agravar mais ainda a desvalorização da medicina dentária e dos cuidados de saúde oral entre os portugueses", uma tendência que “é necessário contrariar”.
O Barómetro, que tem validade estatística, revela que aumentou a taxa de pessoas que afirmam que os gastos com o dentista diminuíram, quer consigo, quer com os familiares, uma evolução em linha com a diminuição da frequência das idas ao dentista.
Dos interrogados, 16,6% diminuíram os gastos pessoais e 10,9% cortaram nas despesas de todo o agregado familiar.
Cerca de 28% nunca visitam o dentista ou apenas o fazem em situações de urgência, ainda assim uma melhoria face a 2019.
O número de portugueses que nunca marca consulta para check-up é de 28,6%, um número que também evoluiu positivamente (38,2% em 2019).
Entre as justificações para não marcarem consultas regularmente, 70% dizem não precisar, 22% afirmam não terem dinheiro e 17% alegam não ter problemas com os dentes.
O barómetro conclui que 61% dos portugueses visitam o dentista pelo menos uma vez por ano.
Os resultados desta edição vão ao encontro do verificado em 2019, com quase 70% da população a ter falta de dentes naturais, à exceção dos dentes do siso e com 9% a ter falta de todos os dentes, problema mais sentido entre as mulheres.
Mais de metade (52,6%) dos portugueses com falta de dentes naturais não têm dentes de substituição (+4 p.p.), o que contraria a tendência que se vinha a verificar nas últimas edições do barómetro, o que aponta para uma degradação do estado da saúde oral em Portugal no último ano, fruto dos impactos da pandemia.
Para Miguel Pavão, estes dados mostram que é necessário valorizar a saúde oral principalmente no pós-pandemia, “mostrando que há muitos benefícios ligados à saúde oral”.
“A população portuguesa deverá investir e valorizar mais a saúde oral e também deve haver melhores condições de acesso à Medicina Dentária. Os reforços que existem anualmente, que diria quase corretivos, para o investimento no SNS não aportam nada à saúde oral”, afirmou o bastonário da OMD.
“Ficamos anos, atrás de anos, a verificar realmente que a saúde oral continua a ser o parente pobre ou o parente mais distante para o investimento em saúde oral”, disse, lamentando que os ciclos políticos não sigam “uma verdadeira estratégia para a saúde oral”, o que disse ser preocupante.
Miguel Pavão defendeu a importância de existir “uma estratégia a médio e longo prazo, para que a saúde oral venha a ter impactos e benefícios na população e que estes números realmente possam ser reduzidos”.
Mais de 70% das crianças até aos seis anos nunca vão ao dentista
O mesmo barómetro mostra que 73,4% dos menores de seis anos nunca vão a uma consulta de medicina dentária, uma percentagem que subiu face à edição anterior do barómetro, em 2019.
Analisando estes dados, o bastonário da OMD disse à agência Lusa que este é o dado do barómetro que traz “maior preocupação” aos profissionais.
“Isto significa que há um trabalho a montante a ser feito”, defendeu Miguel Pavão, explicando que a OMD tem apelado para que o cheque dentista contemple crianças “desde tenra idade”, numa “visão muito mais preventiva e de promoção da saúde oral”.
Segundo Miguel Pavão, o acompanhamento durante a infância acaba por ter “mudanças comportamentais para uma melhor saúde oral da população".
"Acima de tudo para que a valorização da saúde oral também aconteça pelos indivíduos” para que não se recorra ao dentista apenas quando se está doente, porque “depois já é um caminho difícil de reverter, tratar e curar”.
Os dados compilados pelo barómetro indicam que as crianças com idades entre os 10 e os 12 anos são os que mais utilizam o cheque dentista, enquanto os menores com 16 ou mais anos são os que menos utilizam, seguidos das crianças até aos 6 anos.
Quanto à higiene oral, 76,2% dos inquiridos afirmam escovar os dentes com frequência, pelo menos duas vezes ao dia, percentagem semelhante à registada na edição anterior do barómetro.
Segundo o estudo, a que a Lusa teve acesso, aumentou a percentagem de portugueses que lava os dentes três ou mais vezes por dia, o mesmo se verificando relativamente à limpeza da prótese/dentadura.
O uso de fio dentário e de elixir, embora tenha aumentado ligeiramente, ainda está aquém do recomendável, indicam os dados do barómetro.
Em relação ao barómetro de 2019, existem mais portugueses (mais sete pontos percentuais) a ir ao dentista para rotina de limpeza, check-up ou consultas de ortodontia.
Mas a dor de dentes tem causado menos visitas ao dentista, voltando a diminuir a exemplo das últimas edições (de 23,7% em 2014, para 6,3% em 2021).
O tratamento de dentes específicos, devido a cárie dentária, ou o restauro de dentes partidos, voltou a aumentar (3,2 pontos percentuais).
Mais de metade dos inquiridos (53,1%) não sabe que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) disponibiliza serviços de medicina dentária.
Nos últimos anos, o número de utentes que recorre ao SNS tem vindo a diminuir, sendo que nos últimos 12 meses, 3,1% recorreram aos centros de saúde para tratar de algum problema oral e 2,8% ao hospital
O acesso a serviços de medicina dentária no SNS e a comparticipação das consultas no setor privado é considerado como muito importante pela população portuguesa, com 92,9% e 90,4% respetivamente a afirmarem essa opinião.
O barómetro indica ainda que 60,5% dos portugueses consideram a Medicina Dentária como sendo “uma área médica mais cara que as demais”, uma situação que se acentuou face a 2019 (53,8%).
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