De acordo com uma nota publicada no ‘site’ da Presidência da República, Marcelo Rebelo de Sousa devolveu sem promulgação o diploma que altera o exercício do direito de petição, aprovado no dia 23 de julho.
Na mensagem que acompanha o veto, dirigida ao presidente do parlamento, Ferro Rodrigues, o chefe de Estado considera que “o passo dado representa um sinal negativo” para a democracia e anuncia o veto “por imperativo de consciência cívica”.
Com a alteração proposta, as petições que tenham entre quatro mil e 10 mil cidadãos subscritores passam a ser debatidas em comissão parlamentar, sem votação, que existirá apenas para o relatório, e só subirão a plenário sob a forma de iniciativa de deputados.
“As razões invocáveis para esta alteração prendem-se com a racionalização do trabalho parlamentar, a maior facilidade da obtenção de assinaturas nesta era digital e o excesso de petições que pode afetar a lógica do sistema de governo instituído”, refere.
“Com o devido respeito, afigura-se-me, apesar de todas essas razões, que o passo dado representa um sinal negativo para a democracia portuguesa”, escreve Marcelo Rebelo de Sousa.
O Presidente defende que “num tempo já complexo para a reforma e a atualização dos partidos políticos e de aparecimento de fenómenos inorgânicos sociais e políticos de tropismo anti sistémico, tudo o que seja revelar desconforto perante a participação dos cidadãos não ajuda, ou melhor, desajuda a fortalecer a democracia”.
O chefe de Estado questiona as razões que poderão ter estado na base da alteração, sublinhando que o número de petições desceu em 2018 e 2019, relativamente a 2017, “e não ocorreu o temido aumento do uso do envio de ‘e-mail’”.
O aumento do número mínimo de assinaturas para que uma petição seja debatida em plenário “pode ser visto como um sinal de fechamento na Assembleia da República, na participação dos cidadãos e na vitalidade da própria democracia”, alerta.
Na carta, com 10 pontos, Marcelo Rebelo de Sousa defende que “esta era de sociedade de informação, com maior acesso dos cidadãos através da internet e das redes sociais, aconselha o desenvolvimento da democracia participativa a par da representativa, permitindo maior ligação entre representantes eleitos e representados”.
“Nestes termos, e por imperativo de consciência cívica, devolvo sem promulgação o decreto n.º 55/XIV, solicitando à Assembleia da República que pondere se deve dar o passo proposto, e, a dá-lo, se o não deve mitigar nos seus contornos”, afirma.
De acordo com a Constituição da República Portuguesa, face ao veto político do Presidente da República, a Assembleia da República pode alterar o diploma ou confirmar o voto por maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções e, nesse caso, o chefe de Estado deverá promulgar o diploma no prazo de oito dias a contar da sua receção.
O diploma hoje vetado resultou do texto final apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais com base numa iniciativa do PSD e foi aprovado no passado dia 23 de julho com os votos a favor de PS e PSD, contra dos restantes partidos e deputadas não inscritas, bem como da deputada socialista Ana Paula Vitorino.
Na iniciativa original, o PSD pretendia que o número mínimo de assinaturas necessárias para discussão de uma petição em plenário passasse a ser de 15.000, mas esse artigo acabou ‘chumbado’ na especialidade, em que foi aprovada uma proposta de alteração do PS que fixa esse limite mínimo em 10 mil assinaturas.
BE, PCP, PAN e Verdes ainda avocaram para plenário artigos do diploma, acusando PS e PSD de quererem dificultar o debate das petições em plenário, mas o texto manteve-se, com o PS a alertar que ainda nenhuma das petições que deram entrada na XIV legislatura foi agendada para debate em plenário.
(Notícia atualizada às 19:27)
Comentários