Ministro do Ambiente e da Transição Energética, João Pedro Matos Fernandes falava à Lusa a propósito da cimeira de Ação Climática, marcada pelo secretário-geral da ONU, António Guterres, para Nova Iorque na segunda-feira, na qual vai participar, bem como o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Na entrevista, o ministro fala desses compromissos e do facto de Portugal ter sido o primeiro país a marcar a meta da neutralidade carbónica (não produzir mais do que aquilo que pode resgatar) em 2050.
Afirmando que “alguns países muto dificilmente vão assumir o compromisso da neutralidade em 2050″, Matos Fernandes diz que, se algumas grandes economias o fizerem, arrastando outros países, será muito bom.
“Não esperamos unanimidade, essa unanimidade não existe na União Europeia” (UE), diz Matos Fernandes, lembrando que na Europa nem todos os países assumiram compromissos sobre a neutralidade carbónica.
Mas a verdade, afirma, é que o principal objetivo da cimeira é o de tentar que o maior número de países do mundo se comprometa com a neutralidade carbónica em 2050.
“É absolutamente claro desde o ano passado que, para que os 1,5 graus (de aumento global da temperatura) não sejam ultrapassados no final do século, que o mundo seja neutro em 2050″, frisa.
Na cimeira vai ainda procurar-se compromissos sobre o abandono do carvão para a produção de energia e sobre o fim de subsídios a combustíveis fósseis.
No primeiro caso, Portugal já se comprometeu em encerrar as centrais termoelétricas e quanto aos subsídios, Matos Fernandes afirmou que há dois anos que estão “a desaparecer”.
Em Portugal, “apesar de este Governo já levar dois anos de abandono dos subsídios, ainda existem os subsídios perversos que fazem com que por exemplo no ano passado se tenham perdido 400 milhões de euros no Orçamento do Estado com apoios, que veem de trás, de há muitos anos, e que correspondiam a isenções que eram dadas por exemplo na produção de eletricidade a partir do carvão”, apontou.
Mas o principal objetivo, insiste Matos Fernandes, é alcançar compromissos com a neutralidade carbónica em 2050, tendo sempre em conta a perspetiva de aceitação popular.
Que não são fáceis. Se em Portugal é relativamente fácil absorver os desempregados das centrais de carvão tal será mais difícil num país como a Polónia.
Ainda assim, o ministro não tem dúvidas de que a UE devia falar a uma única voz na luta contra as alterações climáticas, tendo-se batido por isso num dos últimos Conselhos europeus.
Ainda que a quase totalidade dos países tivesse assumido compromissos “a UE, de forma unânime, ainda não o fez”, referiu Matos Fernandes, afirmando acreditar que em 2021 a UE possa apresentar em bloco uma contribuição mais exigente nesta matéria.
Portugal, ao contrário, foi o primeiro país a apresentar as suas metas e vai explicá-las em Nova Iorque: “Vou apresentar o Roteiro (para a neutralidade carbónica), explicando que é uma peça de uma estratégia onde o território tem uma componente muito relevante, e onde a remuneração dos serviços de ecossistema é da maior importância para uma transição justa, tanto quanto possível igualitária no próprio território, e que garanta que o rendimento nunca baixará nos territórios de baixa densidade, porque só dessa forma é que o país como um todo pode de maneira justa ser neutro em carbono”.
Na entrevista à Lusa, Matos Fernandes assinalou que, das diversas coligações que vão ser construídas agora, a partir da cimeira, Portugal escolheu as soluções de base natural e territorial (‘nature-based solutions’).
“Nós não vamos chegar a 2050 com emissões zero (de dióxido de carbono, CO2). As 68 megatoneladas de CO2 de há dois anos serão, correndo as coisas de acordo com a nossa ambição, 13 megatoneladas em 2050. E a nossa capacidade de sumidouro hoje nem é dessa dimensão, anda entre as nove e as 10 megatoneladas”, explica.
E conclui o ministro: “Portanto temos de aumentar a nossa capacidade de sumidouro, e a capacidade de sumidouro em Portugal é basicamente de origem florestal e também com as pastagens biodiversas que queremos aumentar. E por isso esta perspetiva da valorização do território, com uma consequência imediata e positiva que é a de aumentar a capacidade de sumidouro, tem muito a ver com a capacidade de continuar a criar rendimento em todo o território”.
Salientando que o roteiro para a neutralidade carbónica tem de ser articulado com a economia circular e o ordenamento do território, Matos Fernandes lembra que é preciso reduzir para metade a área ardida nos incêndios rurais, cada vez mais difíceis de controlar devido ao aumento das temperaturas, para reafirmar a importância de “redesenhar a paisagem”.
Referindo-se ao Acordo de Paris como o “referencial”, admitindo que nos últimos anos nem tudo correu bem e que os Estados Unidos anunciaram que o iam abandonar, o ministro considera que ainda assim se chega à cimeira de Nova Iorque com uma boa notícia, a exigência de ação por parte das novas gerações.
A dois dias da cimeira, com intervenções já nas iniciativas previstas para domingo sobre desenvolvimento sustentável, neutralidade carbónica e “nature-based solutions”, diz João Pedro Matos Fernandes que há agora um ambiente menos associado à responsabilidade dos líderes políticos, que havia na cimeira de Paris há quase cinco anos, mas mais associado ao que é o desejo da sociedade de mudança.
“Por isso eu direi que temos aqui um bom clima, politicamente falando, para que nos possamos comprometer”, conclui.
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