Em comunicado enviado às redações o Ministério da Administração Interna informa que "face às notícias publicadas sobre aspetos contratuais relativamente ao material de sensibilização" dos programas "Aldeia Segura” e “Pessoas Seguras”, o Ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, pediu "esclarecimentos à Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil" e "determinou a abertura de um inquérito urgente à Inspeção-Geral da Administração Interna".

O Jornal de Notícias noticiou na sexta-feira que 70 mil golas antifumo fabricadas com material inflamável e sem tratamento anticarbonização, que custaram 125 mil euros, foram entregues pela proteção civil no âmbito dos programas “Aldeia Segura" e "Pessoas Seguras”.

A Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) disse então que os materiais distribuídos no âmbito dos programas não são de combate a incêndios nem de proteção individual, mas de sensibilização de boas-práticas.

Questionado pelos jornalistas, em Mafra, o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, considerou num primeiro momento “irresponsável e alarmista” a notícia e sublinhou a importância do programa que está em curso em mais de 1.600 aldeias do país, assegurando que a distribuição das golas antifumo não põe em causa nem o projeto nem a segurança das pessoas.

Desde então surgiram notícias que lançam suspeitas sobre os contratos celebrados com a Foxtrot Aventura, sediada em Fafe e fornecedora deste material. A empresa pertence a Ricardo Nuno Peixoto Fernandes, casado com a autarca socialista Isilda Gomes da Silva, presidente da junta de freguesia de Longos, em Guimarães.

No portal “Base: Contratos Públicos Online” constam dois contratos distintos com a empresa Foxtrot Aventura: o “Contrato para aquisição de kits de autoproteção, no âmbito dos programas ‘Aldeia Segura’ e ‘Pessoas Seguras’”, assinado em 12 de junho de 2018, e o “Contrato para aquisição de ‘golas’, no âmbito dos programas ‘Aldeia Segura’ e ‘Pessoas Seguras’”, datado de 28 de maio do mesmo ano.

O seu fundador, Ricardo Fernandes, indicou que o material fornecido à Proteção Civil não está preparado para combate aos incêndios, porque essa exigência não constava do caderno de encargos. "O que posso dizer é que o equipamento não é para ser utilizado no combate aos incêndios", afirmou, acrescentando que o ‘kit’ se destinava a ações de ‘merchandising’, "material demonstrativo para distribuir à população". Segundo a empresa, parte do material, nomeadamente as máscaras de proteção respiratória, até pode ser utilizado no teatro de operações de algumas catástrofes, mas nunca no combate a incêndios.

O contrato relativo à aquisição de 70 mil golas, que não refere o termo “autoproteção”, indica um encargo, suportado pelo orçamento da ANEPC para 2018, de 125.706 euros, com Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) incluído. O contrato inclui uma cláusula em que a empresa se compromete a “guardar sigilo e confidencialidade sobre os assuntos” constantes do documento. O outro contrato que tem também uma cláusula de sigilo e confidencialidade, tem um valor de 202.950 euros (com IVA) e “tem por objeto principal a aquisição de 15 mil kits de autoproteção”, cuja composição não é descrita.

Hoje, o Jornal de Notícias avançou que a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) pagou 1,80 euros por cada gola inflamável, num total de 125 706 euros. Mas, numa consulta ao mercado, o diário apurou que o valor por peça, também de poliéster, ronda entre 63 e os 74 cêntimos (com IVA).

Em 2018, aquando da apresentação dos programas “Aldeia Segura” e “Pessoas Seguras” (em parceria com as associações nacionais de municípios e freguesias), foi anunciada a distribuição de sinalética e de 10 mil 'kits' de autoproteção e outros materiais, além da criação da figura do oficial de segurança para transmitir avisos às populações, organizar evacuações e realizar ações de sensibilização.

No guia de apoio à implementação dos programas “Aldeia Segura” e “Pessoas Seguras”, o ‘site’ da ANEPC refere um “kit de abrigo”, constituído por reserva de água engarrafada, alimentos não perecíveis, estojo de primeiros socorros, um rádio, lanterna, itens de higiene, artigos especiais para lactentes/idosos/pessoas com deficiência, máscaras com filtros de partículas, água e alimentos para animais de companhia, e um apito ou outro equipamento para sinalização. Estes programas estabelecem também a definição de lugares de refúgio nas aldeias.