António Gomes, de 47 anos, desde o início da paralisação dos motoristas passa “todos os dias várias horas” debaixo do viaduto, junto à Companhia Logística de Combustíveis (CLC), onde dia e noite se concentra o “piquete” de greve.
António fez na sexta-feira o primeiro “serviço mínimo” e voltou para o piquete “até cerca de meia-noite”. Hoje de manhã, lá estava de novo, depois de ter descansado algumas horas.
A vida de dezenas de motoristas tem sido assim nos últimos dias. Dividida entre o cumprimento dos serviços mínimos para que são requisitados e a luta, debaixo do viaduto onde se vai vendo quem conduz os camiões que saem da empresa, carregados de combustíveis.
Na manhã de sábado, a greve regista em Aveiras de Cima, no concelho de Azambuja, distrito de Lisboa, uma das menores concentrações de motoristas.
“Muitos foram a casa descansar, porque têm de estar em condições para cumprir os serviços mínimos”, explica António Gomes, um dos motoristas que estão “cada vez mais desiludidos com os patrões”.
A Associação Nacional de Transportes Rodoviários (Antram) “está irredutível, com o Governo do lado do dela, e não quer chegar a um consenso para acabar com a greve”, lamenta o motorista, que exerce a profissão há 21 anos, nove dos quais a transportar matérias perigosas.
Francisco Marques, motorista de matérias perigosas há 30 anos, admite hoje “desilusão com alguns colegas” que não passam ali “tanto tempo como deviam”.
Desde o início da greve não fez um único serviço, “disse sempre que não, apesar de ter sido chamado pela empresa duas vezes”, esclarece, vincando ter estado “todos os dias” em Aveiras”.
Ao sexto dia de greve, o corpo acusa o cansaço, a “rotina familiar ressente-se e surgem os problemas”, e as condições a que estão sujeitos, debaixo do viaduto, vão sendo “mais complicadas”.
Nos dias melhores, à hora de almoço, surgem colegas, com carros carregados de sandes e bebidas que colocam em cima de uma mesa e que todos vão comendo.
Mas neste sábado, a mesa não se pôs. O repasto vai saindo dos sacos e geleiras que vão ficando de dia para dia no separador central da via cortada ao trânsito.
Por baixo do viaduto reina a calma, não se gritam palavras de ordem e aguarda-se o resultado das reuniões que vão acontecendo entre os dirigentes sindicais “para preparar o plenário de domingo”, diz António.
“É nisso que estamos concentrados agora”, afirma, convicto de que do encontro, previsto para Aveiras de Cima, sairão “novas estratégias” de luta.
Até porque “a Antram pode ter a certeza de que, se não for recetiva às reivindicações, e se a greve for desconvocada”, os motoristas garantem “voltar à luta, este ano, no próximo e nos que vierem”.
Mas até ao plenário — agendado para as 16:00 de domingo, na Junta de Freguesia de Aveiras de Cima -, tanto a saída dos camiões como os protestos parecem a meio gás em Aveiras de Cima.
Os motoristas de matérias perigosas cumprem, assim, mais um dia de uma greve por tempo indeterminado, depois de, nesta madrugada, ter falhado um acordo mediado pelo Governo numa reunião que durou cerca de 10 horas.
A paralisação foi inicialmente convocada pelo SNMMP e pelo Sindicato Independente dos Motoristas de Mercadorias (SIMM), mas este sindicato desconvocou o protesto na quinta-feira à noite, após um encontro com a Antram sob mediação do Governo.
No final do primeiro dia de greve, o Governo decretou uma requisição civil, parcial e gradual, alegando incumprimento dos serviços mínimos que tinha determinado.
Portugal está em situação de crise energética, decretada pelo Governo devido a esta paralisação para evitar que fossem afetados serviços essenciais à população.
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