“Fica a sensação de que o concurso foi intencionalmente preparado para favorecer este ou certos operadores. E, se assim é, então é caso de polícia”, afirma o presidente do Sindicato Nacional dos Motoristas (SNM), José Costa, num comunicado.
Para o SNM, em causa estão as declarações do Primeiro Secretário da Comissão Executiva da Área Metropolitana do Porto (AMP), Mário Rui Soares, no Congresso da ADFERSIT – Associação Portuguesa para o Desenvolvimento dos Sistemas Integrados de Transportes, que decorreu online entre 03 e 04 de novembro.
De acordo com o sindicato, num painel sobre a “Importância dos transportes públicos na Mobilidade Sustentável”, aquele responsável revelou uma conversa privada que manteve com um operador bem posicionado para vencer um dos cinco lotes do concurso internacional para o transporte rodoviário na AMP.
Nessa conversa, diz o SNM, o operador terá reconhecido, de acordo com o relato do responsável da AMP que, se vencesse, iria “ou ser subcontratante de parte de um lote” ou “buscar emigrantes [para o cargo de motorista] à Venezuela e a Cabo Verde e dar-lhes formação”.
À data, a revelação gerou a indignação do moderador do debate, o professor catedrático José Manuel Viegas, que disse ser “uma vergonha que o país que organize concursos de serviço público que não são compatíveis nem sequer com os salários baixos que hoje são praticados”.
“Para além de tamanha irresponsabilidade com tais afirmações, talvez agora se compreenda ou não, o porquê de um concurso internacional como o da AMP (com 5 lotes) não prever nem identifique o número de trabalhadores motoristas, necessários para a execução daquela operação e não salvaguarde os direitos desses trabalhadores, caso outros vençam os lotes onde operam os atuais operadores, como parece acontecer”, salientou o SNM.
O sindicato mostrou-se “perplexo, indignado e preocupado” com as afirmações do representante da AMP.
Tentando responder à pergunta porque foi o valor do concurso calculado com base em salários baixos, o representante da AMP explicava que foi definido um preço base por quilómetro de 1,70 euros, tendo havido operadores que apresentaram preços por quilómetro “de 1,1 e 1,3 euros”, descreve o SNM.
Em jeito de justificação, o mesmo responsável salientava ainda que a AMP tem realidades diversas, com territórios de muito baixa densidade, pelo que “com a exclusão de um ou dois lotes”, vai haver “eventualmente défice de exploração”.
“Os municípios, alguns deles, vão se torcer todos para financiar este défice, mas vão ter transporte”, acrescentou, segundo o sindicato.
Com base nestas declarações, o SNM pergunta se os operadores que apresentaram o preço por quilómetros mais baixo estão “já preparados para fazer recrutamento da Venezuela ou Cabo Verde e em que condições vão contratar esses trabalhadores”.
Questionam ainda se os atuais trabalhadores das empresas operadoras na AMP vão todos para o desemprego, se os operadores atuais têm capacidade financeira para pagar as indemnizações, ou vai ser o Estado a pagar.
O sindicato quer ainda saber se o contrato coletivo do setor deixa de ter aplicação e se a Associação Nacional de Transportes de Passageiros (ANTROP) foi ouvida no processo.
“Que raio de concurso é este que não tem em consideração os trabalhadores das empresas, as suas famílias e que coloca em risco a situação social de todos na AMP? Nós dizemos, investigue-se! E os senhores presidentes dos municípios da AMP que dizem a isto tudo?”, interroga-se o SNM.
A Lusa tentou obter uma reação da AMP, mas até ao momento sem sucesso.
De acordo com o avançado pelo Jornal de Negócios, em outubro, o transporte rodoviário de passageiros vai ser operado, nos próximos sete anos, “por três empresas espanholas, e duas portuguesas”.
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