Licenciado em Pintura, pela Faculdade de Belas Artes de Lisboa há um ano e meio, Luis Bernardino, está entre os que preferiu ficar.

Hoje a partir de um computador, em sua casa, em Ho Chi Minh, antiga Saigão, um dos principais centros urbanos do país, Luis trabalha como freelancer para os seus clientes, agora poucos, mas todos fora do Vietname.

A vida barata e os riscos que correria e poderia transportar para a família, neste momento, ao atravessar vários aeroportos na Europa para chegar a Portugal, foram fatores que pesaram na sua decisão de ficar, quando confrontado com o cenário de uma pandemia que afeta todo o mundo.

“Muitas vezes pensei que não faz sentido estar aqui, porque não trabalho propriamente neste país. Eu estou só a viver aqui. Mas sempre que pensava ir para Portugal via que as contas são muito mais caras. O que pago aqui num mês [com todos os gastos] era o que pagava só por uma renda em Portugal. Aqui eu consigo viver com à volta de 300 ou 350 euros, em Portugal isso era só [o custo] um quarto”.

Por outro lado, a arte “é uma área muito complicada” em termos de trabalho no país, por isso não tinha mais motivos para voltar, “a não ser ver a minha família”, confessou à Lusa.

Há três semanas, curiosamente quando a pandemia gerada pelo Covid-19 já se espalhava pelo mundo, teve a primeira oportunidade de emprego no Vietname. “Ia ensinar arte a crianças”, mas com a pandemia e as escolas a fecharem, a oportunidade desapareceu e com ela também a hipótese de ter um visto de trabalho.

No país, o ambiente está a mudar até no comportamento das pessoas em relação aos turistas. “Agora que a China acalmou e que a Europa é o grande problema e os Estados Unidos, os turistas começaram a ser vistos como os que têm o Covid” e até há estabelecimentos comerciais que põem um papel a dizer: “não aceitamos turista”.

Ao contrário do jovem pintor, Tiago Rosas, sócio-gerente da Alumiasas, criada em 2013 em Barcelos, que conseguiu em novembro um contrato com uma multinacional norte-americana para um primeiro trabalho numa fábrica no Vietname, não quer mais ficar, apesar da decisão implicar a perda de parte de um negócio que representava 20 a 30% da faturação total da sua empresa neste primeiro semestre do ano.

“Aqui sentimo-nos menos estrangeiros do que em muitos países europeus”, afirmou em declarações à Lusa Tiago Rosas, com a concordância de dois colaboradores, Paulo Salgueiro e Luis Gonçalves, quando ainda não sabiam que voo teriam para juntos regressarem a Portugal.

Porém, acrescentaram: “agora queremos regressar a Portugal”, para junto das famílias, mas com segurança, para não as colocar em risco.

Tiago esclareceu: “Também porque por aqui a situação agravou-se” e “temos receio de ficar aqui e não conseguir regressar a casa”, por falta de voos.

O primeiro contrato da empresa de Tiago terminou na passada sexta-feira e o empresário e os seus trabalhadores estão de regresso a casa em breve, com a Alumiasas a decidir perder um outro contrato com a mesma multinacional norte-americana, para como subcontratada, realizar outro trabalho no país.

Já após a conversa com os três, a Lusa confirmou com o Cônsul de Portugal em Ho Chi Minh que aquels portugueses já tem lugar garantido num voo de resgate da Alemanha, que sai a 08 de abril do país.

Num outro voo de dia 6, também da Alemanha, partem mais dois portugueses e uma eslovaca que reside em Portugal, adiantou Afonso Vieira.

Depois destes voos, os 60 portugueses que ficam no Vietname são “todos residentes ou trabalhadores a viverem nos países da Ásia do Sudeste”, que vivem uns meses na Tailândia e outros ali, referiu o cônsul, que reporta à Embaixada de Portugal em Banguecoque.

Uso de tecnologias permitiu contacto e apoio a portugueses no Vietname

O consul de Portugal em Ho Chi Minh, no Vietename, disse hoje que as tecnologias foram e continuam a ser essenciais no apoio aos portugueses estiveram e aos que ainda vivem naquele país, num cenário da pandemia.

"Esta foi a minha primeira experiência de dar assistência portugueses em situação de emergência e aquilo que senti é que no máximo posso estar em contacto direto com 150 pessoas, com as regras que impus desde o dia 16 de março, tudo numa mesma plataforma", afirmou Afonso Vieira, responsável do Consulado de Portugal no Vietename que reporta à Embaixada portuguesa em Banguecoque.

A plataforma era o WhatsApp, a única que usou não respondendo diretamente a ninguém no facebook ou qualquer outra rede social.

"A partir do dia 18 [de março] começou tudo a ficar muito confuso porque o espaço aéreo europeu e as fronteiras começaram a fechar-se (...) com voos e destinos a serem trocados. As companhias aéreas deixaram de atender telefones ou responder a mails. Era preciso ir ao aeroporto para se conseguir comprar um novo bilhete de avião”, explicou.

Nos aeroportos havia “pessoas a chorar, pedido de intervenção da polícia para afastar os passageiros que já estavam a debruçar-se em cima dos balcões", continuou, considerando que esses foram dias de grande tensão.

"Por sorte, aqui no consulado uma das grandes promoções que fizemos nos últimos dois anos foi turismo em Portugal. Por isso temos ótimas relações com os ‘country manager’” de companhias de aviação, procurando avaliar em cada voo “encaixar mais um português ou não", afirmou Afonso Vieira.

Segundo o cônsul de Portugal no Vietname, toda a tensão e frustração que os portugueses estavam a sentir, por não conseguirem reservar um voo, por estarem a pagar voos que estavam a ser cancelados ou por verem as ligações posteriores de avião ou de comboio a serem anuladas, estavam ser canalizadas para as estruturas diplomáticas do país.

"E sou eu é que tenho de arranjar soluções, ou pelo menos sugeri-las para que as pessoas consigam arranjar uma maneira de regressar a casa", assumiu.

Até ao dia 15 de março estavam naquele país 150 portugueses, entre residentes, turistas ou pessoas em viagens de negócios, afirmou. Mas só entre os dias 16 e 23 de março saíram do Vietname pelo menos 60.

Sobre os que residem e com trabalho fixo no país, o diplomata assegura que “estão a reagir de uma forma perfeitamente normal”, e todos têm uma situação financeira “confortável”.

Entre estes, salientou “há um grupo de dez pilotos portugueses que trabalhavam e ainda têm contrato de trabalho com as companhias aéreas do Vietname, mas que estão em casa e não estão a receber salário”, aguardando que as coisas melhorem, afirmou.

Mas o país começa a parar. Já só funcionam quatro aeroportos. Os comboios, já só funcionam na linha Ho Chi Minh para Hanói, capital do país, e nos autocarros andam no máximo nove pessoas, explicou.

Pela via das dúvidas e porque não consegue prever o que possa acontecer no futuro o cônsul garante que tem os contactos de todos no WhatsApp.

Porém, não considera “expectável que o Vietname chegue ao estado de emergência”.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou cerca de 1,2 milhões de pessoas em todo o mundo, das quais morreram mais de 63 mil.

Dos casos de infeção, cerca de 220 mil são considerados curados.

Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se por todo o mundo, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia.

A pandemia afeta já 50 dos 55 países e territórios africanos, com mais de 7.700 infeções e mais de 300 mortes, segundo o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças da União Africana (África CDC). São Tomé e Príncipe permanece como o único país lusófono sem registo de infeção.

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