Caxemira, situada ao sul dos Himalaias, é uma região atualmente dividida entre a Índia e o Paquistão, com parte do território sob domínio chinês.

A juntar à disputa pelo território entre a Índia e o Paquistão, ambos potências nucleares, a religião está também muito presente na discórdia que divide os povos da Caxemira indiana e paquistanesa, com hindus de um lado e muçulmanos do outro.

O que aconteceu a 22 de abril?

No dia 22 de Abril, num ataque ao lado indiano de Caxemira, homens armados mataram a tiro 26 pessoas, maioritariamente homens hindus. O incidente ocorreu na cidade turística de Pahalgam, que as vítimas visitavam no momento do ataque.

Embora o ataque não tenha sido reivindicado, a polícia indiana disse procurar, pelo menos, dois cidadãos paquistaneses por acreditar que estavam ligados ao movimento extremista Lashkar-e-Taiba, sediado no Paquistão, já suspeito dos ataques de 2008 em Bombaim, nos quais morreram 166 pessoas.

"O Paquistão, desde essa altura, que disse que queria provas concretas da ligação do Estado paquistanês ao grupo terrorista que matou os turistas. Eles têm algumas ligações ao Afeganistão, inclusive aos Talibã, mas as ligações ao Paquistão não são muito claras. Não é que não existam, mas não são claras", explica o Professor de Relações Internacionais da Universidade Lusíada, Tiago André Lopes, ao SAPO24.

No entanto, segundo o Paquistão, as provas que até agora foram apresentadas são inconsequentes. Já a Índia, afirma que as provas existem e que justificam os ataques que se seguiram, que Nova Delhi considera "proporcional e cirúrgico".

Em resposta, a Índia lançou esta terça-feira, a "Operação Sindoor", uma ofensiva militar que atingiu nove alvos em território paquistanês e na Caxemira sob controle do Paquistão. O ataque causou pelo menos 26 mortes e 46 feridos, segundo autoridades paquistanesas.

"A Índia atacou nove zonas civis, porque na Ásia do Sul, normalmente, os ataques às zonas militares são considerados uma escalada para a guerra. E, por isso, o ataque às zonas civis", explica o especialista.

No entanto, apesar deste tipo de dinâmica ser comum no continente, os ataques de ontem trazem uma grande diferença para o panorama do conflito.

"Normalmente, os ataques optam por alvos civis não habitados. Ou seja, destroem-se uns prédios, dá umas imagens bonitas, dá para limpar a honra dos militares e a honra dos políticos, não causa propriamente danos do ponto de vista da vida humana e não justifica uma resposta da outra parte.
Desta vez não foi o que aconteceu. Desta vez o ataque causou dezenas de mortos e, entre os alvos escolhidos, estão duas mesquitas.”

O Paquistão condenou os ataques, classificando-os como um "ato de guerra". O primeiro-ministro Shehbaz Sharif prometeu retaliação "no momento e local da sua escolha".

Desde então, os países vizinhos continuaram a afirmar o direito à defesa e adotaram uma série de sanções, como a suspensão de um tratado sobre a partilha das águas do rio Indo, o encerramento do principal posto fronteiriço terrestre e a expulsão de diplomatas.

Qual é a origem do conflito?

A região montanhosa de Caxemira tem estado no centro das tensões desde a divisão da Índia e do Paquistão após a independência do Reino Unido, em 1947.

De seguida, a província de maioria muçulmana com um líder hindu hesitou entre juntar-se à Índia de maioria hindu ou ao Paquistão de maioria muçulmana, levando, em 1949, à primeira guerra entre os dois vizinhos. Outros conflitos ocorreram em 1965 e 1999.
O Paquistão e a Índia controlam partes de Caxemira, mas reivindicam todo o território e mantêm tropas estacionadas para monitorizar a Linha de Controlo, que separa as regiões.

Quem pode mediar o conflito?

"Este é um conflito com várias décadas, que tem uma particularidade. O acordo de Simla, de 1972, que termina com a Segunda Guerra Indo-Paquistanesa, expulsa a ONU do processo negocial. Porque a Índia e o Paquistão dizem que este é um conflito bilateral. Não aceitam o papel de mediação da ONU", explica Tiago André Lopes.

Depois de inúmeros Estados terem pedido contenção ao longo do dia de hoje, existem alguns que dificilmente podem vir a mediar o conflito. Entre eles está a China, que é parceira e aliada económica do Paquistão, e os Estados Unidos, que têm tentado uma reaproximação com a Índia.

"Os únicos que poderiam ser mediadores são os Emirados Árabes Unidos, mas não tenho a certeza que o governo hindu de Narendra Modi esteja disposto a negociar com mediadores árabes, ou a Rússia, que tem relações com os lados todos, e que, portanto poderia fazer isso. Sergey Lavrov já mostrou disponibilidade para esse papel de mediação, o que seria peculiar, a Rússia com uma guerra em curso, ser o mediador para a paz num outro conflito.”

O que esperar nos próximos dias?

Uma vez que estão em causa duas potências nucleares, o especialista afirma que "o perigo existe e é real". No entanto, a escalada do conflito vai depender da resposta que pode vir a ser dada pelo Paquistão.

"Depende da dimensão, da destruição e das mortes causadas por essa resposta. E depois, de uma eventual contra-resposta que a Índia considere ter legitimidade, ou não, para fazer. É aí que nós vamos perceber se o conflito escala ou não"