Em causa está um investimento que a Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (DE-SNS) considera ser estratégico para o Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN) e para toda a região sul de Portugal, mas já que levou a exonerações de responsáveis clínicos e a demissões de médicos especialistas.
Qual o investimento previsto?
A partir de agosto, arranca o processo de requalificação e expansão do departamento de ginecologia e obstetrícia do maior hospital do país, num investimento de cerca de seis milhões de euros.
Trata-se de uma das maiores fatias de investimento do recente programa de apoio à requalificação de 33 blocos de partos dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS), que foi dotado de um financiamento global de 27 milhões de euros.
Destes seis milhões de euros, três milhões são assegurados por esta linha de financiamento e a outra metade será garantida diretamente pelo plano de investimentos do centro hospitalar.
Qual o benefício deste investimento?
Quando estiverem concluídas as obras, o Hospital de Santa Maria, em Lisboa, passará a dispor da maior e mais diferenciada maternidade do país, de acordo com a DE-SNS, que garante será, assim, reforçada a capacidade de resposta às grávidas e aos recém-nascidos, com melhores condições também para os profissionais de saúde e acompanhantes.
Após a conclusão das obras, o bloco de partos do Hospital Santa Maria vai ter capacidade para realizar mais 1.500 partos anualmente face aos atuais cerca de 2.900.
Que obra está prevista?
Na prática, serão cerca de mil metros quadrados de área nova, que incluirá a construção de novos quartos de dilatação, a remodelação da urgência de ginecologia e obstetrícia, o aumento do número de camas para o bloco de partos e para a sala de observação.
Está também prevista a ampliação do internamento de puerpério, novas instalações para ecografia e a renovação do serviço de neonatologia, num valor estimado de cerca de três milhões de euros de investimento total do CHULN.
O que está planeado para a fase das obras?
Os preparativos para as obras da nova maternidade arrancam em agosto, os trabalhos estarão no terreno em setembro e estarão concluídos até final de março de 2024, de acordo com o calendário já anunciado.
Foi elaborado um plano de contingência, que prevê a concentração da atividade no Hospital São Francisco Xavier, uma colaboração em rede que a direção executiva do SNS garante que foi delineada pelos “profissionais de ambas as equipas em conjunto”.
Isso quer dizer que serviço de ginecologia e obstetrícia do Hospital São Francisco Xavier será reforçado enquanto decorrerem as obras no Santa Maria ao nível dos recursos humanos e de equipamentos para acomodar o aumento da procura.
A unidade do São Francisco Xavier foi construída há poucos anos, tendo sido projetada para 4.500 a 5.000 partos.
Porque estão a ser reencaminhadas grávidas para hospitais privados?
No início de julho, o CHULN anunciou que as grávidas de baixo risco referenciadas para o Hospital de Santa Maria poderiam vir a ser reencaminhadas para hospitais privados devido a "constrangimentos na escala clínica" da sala de partos.
Esta decisão surgiu na sequência da indisponibilidade de prestação de trabalho extraordinário acima das 150 horas anuais assumida por médicos do departamento e da demissão de chefes de equipa da Urgência de Obstetrícia e Ginecologia.
Quais as razões para a exoneração do diretor do departamento?
Em junho, a administração do CHULN anunciou que o diretor de Obstetrícia, Ginecologia e Medicina de Reprodução, Diogo Ayres de Campos, foi afastado por questionar o projeto de restruturação no Hospital de Santa Maria e a colaboração com o São Francisco Xavier.
Na altura, os responsáveis do centro hospitalar alegaram que o especialista tinha vindo a assumir posições que, “de forma reiterada", colocavam "em causa o projeto de obra e o processo colaborativo com o Hospital São Francisco Xavier, durante as obras da nova maternidade do Hospital Santa Maria”.
Dias depois, um grupo de médicos do serviço de ginecologia e obstetrícia do Hospital Santa pediu a recondução do diretor do departamento e da diretora de Obstetrícia, insistindo na sua “total confiança” nestes profissionais.
Já no final de junho, os chefes e subchefes das equipas de urgência, com exceção de um, do serviço de obstetrícia do Hospital Santa Maria apresentaram demissão do cargo, uma situação que obrigou a direção clínica do CHULN a garantir a normalidade da atividade do serviço.
Perante o clima instalado no hospital, o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, afirmou que a maternidade do Hospital de Santa Maria estava a “funcionar em pleno”, mas reconheceu que se vivia um “período de conflitualidade” entre a administração e médicos do serviço de obstetrícia.
Relativamente às obras no bloco de partos do Santa Maria, Manuel Pizarro assegurou também que “não é possível fazer uma obra daquela dimensão” sem encerrar, durante alguns meses, a maternidade.
Já a Ordem dos Médicos, que se deslocou ao hospital, apelou ao diálogo entre as partes para que fosse possível garantir o plano de contingência definido.
Em 05 de julho, dezenas de médicos do Departamento de Obstetrícia, Ginecologia e Medicina da Reprodução (DOGMR) do Hospital Santa Maria pediram ao ministro da Saúde uma intervenção “pessoal, direta e urgente” para que a direção afastada seja readmitida.
Quais os argumentos das duas partes?
Ouvido na comissão parlamentar de Saúde em 12 de julho, o ex-diretor do Departamento de Obstetrícia, Ginecologia e Medicina da Reprodução do Santa Maria adiantou que não houve qualquer razão técnico-científica para justificar exonerações no serviço, admitindo razões políticas para tal decisão.
Dias depois, na mesma comissão parlamentar, a presidente do conselho de administração, Ana Paula Martins, justificou a exoneração do ex-diretor do departamento de Ginecologia e Obstetrícia com maus indicadores assistenciais e entraves colocados às obras para a nova maternidade.
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