Ainda antes das 09:00, uma equipa de dois inspetores da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) entrou na Sorisa, uma loja de produtos de saúde e bem-estar no “coração” da cidade de Lisboa, na avenida da República.
A missão destes dois inspetores, tal como a dos mais de 100 colegas, que no âmbito da operação “Lucro ilegítimo”, fiscalizam centenas de estabelecimentos em todo o país, é simples: identificar a prática de margens de lucro excessivas em produtos relacionados com o combate à pandemia de covid-19, nomeadamente equipamentos de proteção individual, álcool etílico e álcool gel.
Surpreendida pela visita da ASAE, Águeda Jiménez, proprietária do espaço, depressa começou a facultar aos inspetores os documentos pedidos e a mostrar os produtos cuja venda, por esta altura, são a única razão para manter as portas abertas.
Aproveitando a presença do secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor, João Torres, esta comerciante explica as dificuldades que tem tido em adquirir este material e que os seus preços dispararam desde o começo da pandemia.
“Temos tido problemas para encontrar luvas e máscaras. Máscaras então tem sido impossível no mercado europeu”, conta Águeda Jiménez, que diz ainda que, na tentativa de encontrar uma alternativa, acabou burlada.
“Como na Europa não encontrávamos máscaras, fizemos uma encomenda a uma empresa chinesa e fomos enganados… não chegou e ficámos sem máscaras e sem dinheiro”, relata revoltada.
Quanto aos preços, assegura a João Torres que estão bastante mais altos, mas que nem sempre a culpa é dos retalhistas.
“Há dois meses, antes de começar a pandemia, vendíamos uma caixa de 50 máscaras por dois euros. Hoje estamos a vendê-las a 50 cêntimos a unidade porque o preço disparou”, assegura.
Consciente deste fenómeno, o secretário de Estado diz que é essa a razão para a (ASAE) estar no terreno.
“É fundamental passar aos consumidores portugueses uma mensagem de confiança no que diz respeito à fiscalização e vigilância do mercado. Temo-lo feito desde o início da pandemia de covid-19, fiscalizando os equipamentos de proteção individual, o álcool etílico e o álcool gel para perceber o impacto da covid-19 nas dinâmicas de mercado”, esclarece o governante.
João Torres lembra que o Governo decretou muito recentemente que todos estes produtos não podem ter uma margem de lucro superior a 15% e que é na sequência desse despacho que as equipas da ASAE partiram para o trabalho no terreno.
“Importa reforçar a vigilância de mercado para que os cidadãos saibam que não estão a ser alvo de uma ação especulativa da parte do vendedor”, assinala João Torres.
Já sobre a disponibilização de máscaras e álcool gel de forma abundante nas superfícies comerciais, condição que o primeiro-ministro estabeleceu como fundamental para que seja levantado o estado de emergência, o secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor elogiou o esforço que a indústria, nomeadamente no setor têxtil, está a fazer para responder às necessidades, mas admite que a situação ainda não é a ideal. Na próxima semana, o governante espera que a oferta aos portugueses seja mais condizente com essa exigência.
“Já houve momentos de maior dificuldade no acesso a estes produtos e, portanto, diria que estamos numa fase de maior disponibilidade e colocação no mercado. Temos a expectativa de que na próxima semana tenhamos muito mais disponibilidade do que aquela que se verifica nesta semana, mas tem havido uma disponibilização crescente de equipamentos de proteção individual, álcool etílico e álcool gel nos estabelecimentos em Portugal”, termina.
A meio da manhã, no centro de Moscavide, uma loja de produtos de beleza foi o local escolhido pela ASAE para mais uma ação de fiscalização. Sara Neto e Liliana Antunes, as duas funcionárias, foram surpreendidas pela visita e atrapalhadas foram correspondendo aos pedidos dos inspetores: preços, faturas e o tipo de produtos que estava a ser comercializado.
Também presente nesta ação de fiscalização, Pedro Gaspar, Inspetor-geral da ASAE, revela que até ao momento foram já levantados 24 processos-crime no âmbito da operação “Lucro ilegítimo”, em resultado de mais de 350 ações de fiscalização. Explica que numa primeira fase toda a análise feita tinha em conta a figura jurídica de “lucro ilegítimo”, agora balizada no valor de 15% por despacho do Governo.
“Temos tido uma estratégia operacional proativa e sabíamos que o tema da especulação ia colocar-se na situação atual”, diz o inspetor-geral, que esclarece que a escolha dos estabelecimentos fiscalizados resulta de um cruzamento entre a análise de informação pela própria ASAE e as denúncias relatadas pelos consumidores.
Relativamente aos resultados já apurados desta operação, Pedro Gaspar informa que os processos já instaurados estão distribuídos de forma homogénea por todo o país, “mas, naturalmente, com maior prevalência nas zonas de maior concentração populacional”, onde foram encontradas margens de lucro “bastante elevadas”, que chegaram “a 500% e 600% face ao preço de aquisição”.
A nível global, segundo um balanço da AFP, a pandemia de covid-19 já provocou perto de 184 mil mortos e infetou mais de 2,6 milhões de pessoas em 193 países e territórios.
Em Portugal, morreram 820 pessoas das 22.353 confirmadas como infetadas, e há 1.143 casos recuperados, de acordo com a Direção-Geral da Saúde.
Portugal cumpre o terceiro período de 15 dias de estado de emergência, iniciado em 19 de março, e o decreto presidencial que prolongou a medida até 02 de maio prevê a possibilidade de uma “abertura gradual, faseada ou alternada de serviços, empresas ou estabelecimentos comerciais”.
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