O estudo levado a cabo por uma psicóloga, uma psiquiatra e uma pedopsiquiatra – publicado na revista científica Research in Developmental Disabilities em abril – comparou pais de crianças com perturbações do processamento sensorial e pais de crianças que apresentam um desenvolvimento considerado típico, num total de mais de uma centena de pessoas.

“O que está na hipótese deste artigo é que a montante de tudo está o processamento sensorial e perturbações do processamento sensorial, a forma como as pessoas reagem a estímulos do dia a dia (…) Os pais de crianças com perturbação do espetro do autismo ou com perturbação do processamento sensorial tinham, em média, padrões sensoriais mais intensos”, explicou a investigadora Irene Carvalho.

Sublinhando que, com este artigo, “de forma alguma se pretende que os pais se sintam culpados ou responsáveis”, a também professora da FMUP salientou a importância de serem criados programas que ajudem os pais e cuidadores a lidar com as eventuais dificuldades de processamento sensorial, minimizando o impacto na família e nas crianças.

“A nossa insistência é justamente na tónica do apoio às famílias e não em fazer as famílias sentirem-se mal e responsáveis”, frisou Irene Carvalho, em declarações à agência Lusa.

Em causa estão, por exemplo, padrões como a tendência a evitar estímulos sensoriais ou esquivar-se ao contacto durante as interações sociais.

Podem ser consideradas atipias do processamento sensorial as reações aos sons, aos cheiros, a estímulos.

Um ruído que é considerado habitual e perfeitamente intolerável para a maioria das pessoas pode ser absolutamente intolerável para uma pessoa que tem uma perturbação de processamento sensorial.

Em alguns casos estudados estes padrões sensoriais intensos estavam relacionados com a chamada alexitimia, a dificuldade em identificar e expressar emoções.

Para chegar a estas conclusões foi aplicado aos pais um questionário que analisava seis componentes sensoriais: o paladar/olfato, a audição, a visão, o tato, o movimento e a atividade.

Do mesmo modo, foram também avaliados fatores como a atenção e as competências sociais.

Ao realizarem esta bateria de testes as investigadoras da FMUP detetaram diferenças na sensibilidade e resposta a estímulos sensoriais diversos.

Estas características sensoriais, “longe de serem vistas como falhas”, podem representar desafios únicos que afetam a forma como pais e filhos se relacionam.

“Nas interações, os pais transmitem, ainda que de forma inconsciente, mas que pode ser sistemática, que aquilo é um estímulo perigoso, podendo passar essa sensação de ameaça aos filhos”, explicou Irene Carvalho.

Neste contexto, acrescentou a docente, a principal sugestão que nasce com este estudo “inédito” é a importância de fomentar estratégias de apoio que promovam interações familiares positivas, indo para além da questão genética.

“Intervenções e formações que ajudem os pais a identificar e verbalizar sentimentos e emoções podem ser uma ferramenta valiosa para estas famílias, melhorando a qualidade da relação e o bem-estar de todos os envolvidos”, lê-se nas conclusões.

Além de Irene Carvalho (FMUP), esta investigação contou com a colaboração de Goretti Dias (Hospital de Santo António) e de Ana Sofia Machado (FMUP e ULS São João).