Aos 15 anos o pai faleceu e Diogo Freitas do Amaral ficou seu tutor legal. Mas a mãe conta que aos quatro ou cinco anos, no final dos debates políticos na televisão, já perguntava: "Quem é que tem razão?". Disto não tem memória, mas as presidenciais de 1986, tinha então oito anos, marcaram decisivamente o seu interesse pela política.
Mais do que o primo Diogo Freitas do Amaral, o pai, militar e durante anos ajudante de campo do presidente Américo Thomaz, foi uma peça chave na formação de Paulo Freitas do Amaral, como a mãe, editora da revista do CDS "Democracia e Liberdade".
Mora perto de Vendas Novas e é professor em Évora, mas foi em Oeiras que cresceu. O apelido liga-o à fundação do CDS, partido onde militou e que apoiou a sua candidatura à Câmara Municipal de Oeiras, em 2013, mas foi no PS que esteve filiado em primeiro lugar e foi também pelo Partido Socialista que foi eleito presidente da Junta de Freguesia da Cruz Quebrada.
Agora, Paulo Freitas do Amaral é um dos membros da comissão instaladora do Nova Direita, um movimento à beira de se transformar em partido político e que tem como objetivo concorrer já às eleições europeias de 2024.
Professor no ensino privado em Évora, o político fala da Educação em Portugal, da guerra público-privado e de outras bandeiras que o Nova Direita quer abraçar.
"Ocupei o cargo de administrador da Misericórdia de Guimarães, a segunda maior instituição da cidade, com 300 funcionários e 500 utentes"
Foi PS, independente, CDS, desistiu da candidatura à Presidência da República quando Marcelo Rebelo de Sousa se chegou à frente e, agora, está no Nova Direita. O que o leva a estar na política (e a fundar um novo partido)?
Em Portugal vê-se muito a política como o futebol, mas recordo que o maior político de todos os tempos, Churchill, esteve no Partido Liberal antes de se juntar ao Partido Conservador. Em Portugal temos fundadores do CDS que também evoluíram, como Basílio Horta, presidente da câmara de Sintra, Freitas do Amaral, que sempre disse o que pensava, ou Lucas Pires, que foi para o PSD por discordância com o CDS. No Brasil ou em Itália vemos novos partidos singrar e conseguimos ver o mérito de quem os forma.
"É muito difícil haver democracia e liberdade verdadeira dentro dos partidos"
Além disso, fazer um partido e ajudar a fundá-lo - e quem cria partidos debate-se com muitos obstáculos - é um ato de cidadania; os cidadãos passam a ter mais opção política, o que é saudável numa democracia.
E eu também me interrogo: é mais fácil evoluir a nível político, atravessar o campo de batalha e fundar um partido, ou mantermo-nos a vida toda barricados no mesmo partido e sermos coniventes com situações com as quais discordamos?
Quem ascende atualmente na política é quem diz sim a tudo ao líder, muitas vezes concordando com situações que vemos serem denunciadas todos os dias na comunicação social. Sou de Oeiras, onde neste momento existe uma grande polémica, mas as pessoas dos maiores partidos, PSD e PS, são coniventes com muito do que se passa.
Isto é transversal a todos os partidos, é muito difícil ir para a política e ter voz, as coisas estão um pouco afuniladas nos mesmos de sempre. É muito difícil haver democracia e liberdade verdadeira dentro dos partidos. Por isso, fundar um partido é quase a única maneira de ter voz ativa na política nos dias de hoje.
Nunca ninguém vai estar 100% de acordo com as ideias de um partido, as pessoas votam naquele com que mais se identificam. As propostas do Nova Direita são suficientemente profundas e diferentes para justificarem a criação de um partido?
Sim, são. Não mencionamos todas para não nos copiarem antes de sermos um partido, mas podem encontrar já bastantes no nosso site.
Já cá voltamos. Afirmou que existe uma grande polémica em Oeiras. Refere-se a quê, exatamente?
A polémica dos almoços de trabalho pagos pela autarquia. Achar que Oeiras está num plano superior aos outros concelhos ao ponto de governar numa realidade paralela não é ser bairrista, é ser indiferente às dificuldades que o povo português atravessa - talvez devido a uma falta de atualização aos tempos que correm. Apesar de termos o mesmo edil, desde os anos de ouro das décadas de 80 e 90, em que Isaltino foi inovador, já passaram quase 40 anos.
Ainda me lembro do discurso de abertura que Isaltino fez em Algés, no Palácio Anjos, antes de falar o meu primo Diogo Freitas do Amaral, na campanha presidencial de 1986. Comparável a tantos anos no poder só Alberto João Jardim.
Mas em Oeiras há assuntos muito urgentes metidos na gaveta, que são da responsabilidade do governo e da autarquia, como é o caso das 630 habitações prometidas para jovens na zona marítima de Algés. Não se compreende que isto não se resolva, estando o PS no executivo com um pelouro exclusivamente dedicado à descentralização.
Voltemos ao CDS e ao que o levou a entregar o cartão de militante...
Já que faz essa pergunta, veja que o CDS está nas mãos das mesmas pessoas há 30 anos. Fazem todos parte do mesmo grupo. Foi há 30 anos que Manuel Monteiro ganhou o congresso, e aí conquistou um eleitorado mais à direita, até houve uma mudança da sigla de CDS para CDS-PP.
Passados 20 ou 25 anos, o CDS deixou de ter um discurso para este eleitorado, que fugiu. O lado mais social foi desaparecendo da ideologia do CDS, que chegou a ter mais de 500 juntas de freguesia e 43 câmaras municipais, incluindo Lisboa, com [Nuno Krus] Abecassis. Porque os fundadores acreditavam que as autarquias eram a linha da frente no apoio social, na resposta às necessidades das pessoas.
Na minha perspetiva, Paulo Portas e Manuel Monteiro descuraram o poder autárquico - apesar do aumento da representação na Assembleia da República, onde passou de quatro deputados, o partido do táxi, para 16. Mas ao longo destes 30 anos de liderança de Paulo Portas o CDS ficou reduzido a uma autarquia, Ponte de Lima (e em 2013 conquistou mais cinco). Depois, sobretudo a partir de 2012, com o "irrevogável" e alguns ziguezagues ideológicos, foi perdendo poder.
Que ziguezagues?
Por exemplo, com Diogo Freitas do Amaral o CDS era próximo da UNITA [União Nacional para a Independência Total de Angola], mesmo em temos de alinhamento da CPLP [Comunidade dos Países de Língua Portuguesa], enquanto nos tempos mais atuais houve um grande alinhamento com o MPLA [Movimento Popular de Libertação de Angola] - ainda agora Paulo Portas foi convidado como observador do MPLA.
Houve também, já sob a liderança de Assunção Cristas, do grupo de Paulo Portas, o voto a favor da prisão de Luaty Beirão [ativista luso-angolano] na Assembleia da República. Coisas que fizeram o CDS ir noutro sentido que não o da sua matriz. Penso que o eleitorado se tem sentido um pouco defraudado e isso notou-se ainda mais depois da eleição de Francisco Rodrigues dos Santos. Tudo isto agravado por lutas internas.
"Mudei ideologicamente certos aspetos do meu pensamento político devido à sua [de Diogo Freitas do Amaral] influência"
Paulo Portas continua à frente do CDS, mesmo nos bastidores?
Paulo Portas está há 30 anos ligado a toda a estratégia política do CDS. É o principal responsável pela decadência do CDS. Os quatro anos em que Francisco Rodrigues dos Santos, ex-núcleo duro de Portas, presidente da Juventude Popular, e Ribeiro e Castro foram pautados por forte turbulência interna, pela intolerância do núcleo duro liderado por Paulo Portas.
É natural que agora estejam muito aflitos a tentar remediar o mal que fizeram ao partido, mas, a meu ver, o CDS servirá até às eleições presidenciais, para concretizar os objetivos pessoais de Paulo Portas de se lançar como candidato à Presidência da República.
Talvez tenha o sonho de repetir os passos do fundador e a ida à Universidade de Verão do PSD é uma tentativa de imitação de Diogo Freitas do Amaral, que conseguiu agregar PSD e CDS na sua candidatura.
"Aos 15 anos o meu pai faleceu e Diogo Freitas do Amaral ficou meu tutor legal"
Candidatura que Diogo Freitas do Amaral acabaria por perder contra Mário Soares. Qual era a sua relação com Diogo Freitas do Amaral?
Aos 15 anos o meu pai faleceu e Diogo Freitas do Amaral ficou meu tutor legal. A relação até aos últimos quatro anos de vida do meu primo foi sempre de grande proximidade e amizade. Nesses últimos quatro anos de vida fui trabalhar para o norte do país e ocupei o cargo de administrador da Misericórdia de Guimarães, a segunda maior instituição da cidade, com 300 funcionários e 500 utentes, depois de ter ganho as eleições mais renhidas de sempre em cinco séculos de existência.
O cargo também tinha sido ocupado em tempos por Diogo Freitas do Amaral, e sempre lhe pedi conselhos, estivesse na Misericórdia ou em cargos políticos. E confesso que também mudei ideologicamente certos aspetos do meu pensamento político devido à sua influência.
Quais são as bandeiras da Nova Direita e onde pretende ir buscar votos?
Obviamente que a Nova Direita quer ser uma solução moderada da direita, com as bandeiras que ninguém tem no seu campo ideológico, como a cultura, a educação, a lusofonia e iniciativas dirigidas a uma nova geração.
Neste momento existe uma direita que se está a extremar, e PSD e CDS fizeram parte do governo da troika, o mais à direita desde o 25 de Abril, e o povo português ficou escaldado. O CDS tem medo de falar ao centro, mas é importante que surjam novos partidos que possam conquistar o eleitorado que fugiu e que faz parte do centrão - 70% das pessoas votam centrão.
Penso que a Nova Direita, apresentando-se como uma direita desempoeirada, moderna, solidária, uma direita mais social e com a qual eu me identifico, poderá conquistar a confiança das pessoas que ficaram traumatizadas com o governo da troika e também ir buscar votos à abstenção.
O CDS ficou fora da Assembleia da República nas últimas eleições, o PSD perdeu votos e o Aliança, de onde vem Ossanda Liber, cabeça do Nova Direita, nem sequer elegeu. Não teme que ao colocar-se exatamente nesta zona do espectro político o Nova Direita esteja condenado à nascença?
Não temo que aconteça isso porque na Nova Direita não haverá uma guerra aberta em período eleitoral, como aconteceu entre o grupo liderado por Nuno Melo e Paulo Portas contra Francisco Rodrigues dos Santos. Episódios como chamar "associação de estudantes" a um grupo de dirigentes do próprio partido, como fez Paulo Portas enquanto dez milhões de portugueses se preparavam para votar, é um suicídio político.
"Hoje o CDS envergonha-se de estar ao centro e anda atrás da moda do Chega. Em 2023 querem fazer do Partido Popular um partido popularucho"
Referia-me mais ao nível da ideologia, da proposta política.
A Nova Direita é um partido corredor de fundo e não de 100 metros. O Aliança foi tão rápido a aparecer como a desaparecer, pautado por bastante ansiedade. O CDS, por sua vez, desvirtuou-se da sua matriz e o povo percebeu que está entregue a interesses económicos.
A convenção que o CDS irá fazer no próximo dia 9, e que irá mexer na declaração de princípios do partido feita pela mão de Diogo Freitas do Amaral, será mais um golpe profundo no espírito, ideologia e legado que os fundadores deixaram na sociedade portuguesa. Estão a tornar o o CDS num partido ultra-conservador.
A declaração que Diogo Freitas do Amaral, Basílio Horta e Adelino Amaro da Costa entregaram no Tribunal Constitucional em 1974 referia um partido ao centro, aberto ao centro-direita e ao centro-esquerda. Uma das razões que me levou a associar à Ossanda foi ela ter dito com grande clareza que o partido se situa na zona ideológica do CDS e da democracia cristã. Hoje o CDS envergonha-se desta declaração e anda atrás da moda do Chega. Em 2023 querem fazer do Partido Popular um partido popularucho.
A sigla CDS está desadequada: o centro já não lhes diz nada, extinguiram todos os centristas, o partido já não é democrático, porque não permite discussão interna e também já não é social, porque não acredita que o Estado pode ter um papel redutor da pobreza.
Também tenho dúvidas quanto à convenção poder modificar a declaração de princípios, muitas das alterações que Nuno Melo fez no último congresso foram chumbadas pelo Tribunal Constitucional há poucos meses.
De resto, a Nova Direita tem tranquilidade, experiência, combatividade e tolerância, ingredientes decisivos para o sucesso do partido.
Alguém disse que o Nova Direita é uma guerra de egos. É? Porquê?
Se dizem isso, é porque já estão com medo. É bom sinal. Temos uma equipa complementar, humilde e muito forte. Estamos a nascer, a guerra de egos é natural em quem já morreu politicamente e ainda não sabe.
"A Nova Direita é muito clara na questão dos costumes e tradições. Aceita a diferença em termos de orientação sexual, mas não aceita que esta seja imposta, como quer esta ideologia woke"
Falou em algumas das bandeiras do Nova Direita. O partido é claro nos valores, por exemplo, em matérias como o aborto ou a orientação de género?
A Nova Direita é muito clara na questão dos costumes e tradições. Somos um partido que defende a vida em todas as plenitudes e somos um partido que aceita a diferença em termos de orientação sexual, mas não aceita que esta seja imposta, como quer esta ideologia woke, que tentamos combater.
Mas defendemos outras ideias, como o apoio ao pequenos e médios empresários como um garante do funcionamento de toda a economia - pessoalmente, sou uma tendência dentro de várias, acredito que o Estado a nível social pode fazer a diferença entre a classe mais pobre e a classe mais rica. Acredito que o papel do Estado é fulcral nesta matéria, embora não possa descurar o apoio à iniciativa privada.
"A sigla CDS está desadequada: o centro já não lhes diz nada, o partido já não é democrático e também já não é social, porque não acredita que o Estado pode ter um papel redutor da pobreza"
O que me leva a outra pergunta: é professor num colégio privado, os Salesianos de Évora. Como olha para o ensino em Portugal e a crise que atravessa?
Vejo com muita tristeza que os professores do ensino privado nunca foram mencionados no ano letivo que passou, quer pelo ministro da Educação, quer pelos sindicatos. Nem os seus interesses, nem as instituições. E recordo que os pais dos alunos do ensino privado pagam as propinas dos seus filhos e ainda pagam, através dos seus impostos, o ensino daqueles que estão na escola pública.
Os sindicatos estão muito preocupados com o terceiro e o quarto e o quinto escalão, mas esquecem-se que há professores que nem sequer entraram na carreira devido ao Tratado de Bolonha, que exigia dois anos de mestrado, pago do seu bolso, para entrar na carreira de professor, quando na altura em que o sindicalista Mário Nogueira foi professor tiveram o seu estágio e a sua profissionalização pagos pelo Estado.
"Vejo com muita tristeza que os professores do ensino privado nunca foram mencionados no ano lectivo que passou, quer pelo ministro da Educação, quer pelos sindicatos"
Isto acontece devido à subserviência dos ministros da Educação às normas que a Europa nos impôs. Agora está tudo aflito porque não há professores, mas na altura os políticos não tiveram coragem de enfrentar os sindicatos e aos sindicatos dava jeito não haver mais professores, que foram engrossaram as filas do centros de emprego, não tiveram voz.
Mas também me lembro de o presidente de uma universidade privada querer ter um curso de Medicina e do então ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Mariano Gago, responder: "Sou ministro do Ensino Superior, mas as corporações em Portugal têm tanta força que não consigo abrir mais um curso no ensino privado".
Agora dizem que há falta de médicos e a Universidade Católica abriu há pouco uma licenciatura em Medicina com uma propina mensal 1.750 euros por mês, um balúrdio. Acho saudável os médicos novos andarem nesta luta, mas há 20 anos não assistiram aos bastonários a dizerem que não era preciso mais médicos, que os que havia davam conta do recado.
Mais uma vez, houve falta de coragem dos políticos em enfrentar as corporações. O latino é assim, ou oito ou oitenta. Agora chegámos a uma situação limite. No caso dos professores, o governo diz que vai profissionalizar, fazer cursos... A minha geração apanhou o boom das universidades privadas na década de 90 e agora não há professores? O que é feito dos magotes de licenciados? Alguma coisa não funcionou.
"Vejo uma grande debandada do ensino público para o privado nos centros urbanos. Mas há dois países, no interior é diferente"
Por que motivo não se fala no setor privado da Educação?
Porque a dimensão do ensino público é muito maior. E quando começam a fazer contas aos votos, é o público que interessa, apesar de haver cerca de 3.000 estabelecimentos privados em Portugal. Depois, creio que o ensino público faz parte da ideologia dos partidos que estão no poder e dos que estão à esquerda do poder e é esse o discurso que passa na comunicação social, principalmente nas televisões.
"Os pais dos alunos do ensino privado pagam as propinas dos seus filhos e ainda pagam, através dos impostos, o ensino dos que estão na escola pública"
Primeiro por causa da pandemia, depois por causa das greves, muitos pais estão a optar agora pelo ensino privado para os seus filhos. Vê este movimento?
Vejo uma grande debandada do ensino público para o privado nos centros urbanos como Lisboa e Porto, onde as pessoas têm algum poder económico. Mas aqui há dois países. Se formos ver os Salesianos de Trás-os-Montes, de Mirandela, é diferente. Vejo algumas dificuldades nos colégios privados do interior, em que as pessoas têm alguma dificuldade em pagar propinas.
Sou professor de alunos desde o quinto ano até ao secundário e dou sempre os programas até ao fim, faço questão de dar a matéria toda e ter os alunos prontos para as provas de aferição. No final destes três anos, vejo uma grande diferença entre os alunos que estão a ser formados no privado e os que estão a ser formados no público.
No privado, mesmo durante a pandemia, os professores deram sempre aulas online a partir da escola - e houve um período misto. Eu, como os meus colegas, não faltei um dia sequer por greve. Por tudo isto, a formação dos alunos do privado começa a ser muito díspar do que está a acontecer no ensino público. Também tenho filhas no ensino público e um filho no ensino privado e vi que no final do ano elas não tinham acabado a matéria e não estavam bem preparadas.
"No final destes três anos, vejo uma grande diferença entre os alunos que estão a ser formados no privado e os que estão a ser formados no público"
Já que estamos a falar de adolescentes, aproveito para perguntar: é a favor do voto a partir dos 16 anos?
A curto prazo não faz sentido, mas poderá ser uma hipótese a médio prazo. Penso que terá de haver abertura para a discussão inter-partidária e para estudar mais a fundo essa questão, principalmente para analisar os cinco países europeus onde já é permitido os maiores de 16 anos votarem.
Os partidos novos, como será a Nova Direita, são mais abertos a esta questão, mas sabemos que os partidos mais antigos (bloco central) defendem-se no voto das gerações mais idosas, que votam nos partidos tradicionais.
"A carta do senhor primeiro-ministro à Comissão Europeia é o reconhecimento do fracasso do seu programa [de habitação]"
Antes de avançar naquilo que são as soluções do Nova Direita, e porque no início desta conversa falou no problema da habitação em Oeiras e agora falou em subserviência em relação a Bruxelas, pergunto se concorda com a carta que o primeiro-ministro escreveu à Comissão Europeia a pedir ajuda para resolver o problema da habitação?
A carta do senhor primeiro-ministro à Comissão Europeia é o reconhecimento do fracasso do seu programa.
O Nova Direita tem uma solução para este problema?
O setor da habitação requer uma solução urgente e o plano de aproveitamento do património do Estado não sai do papel. Há que libertar património afeto ao Ministério da Defesa.
E já que falo em Defesa, acreditamos que é preciso melhorar as condições dos militares, de forma a atrair mais profissionais. Aliás, é preciso melhorar a situação dos jovens, que desertam para enriquecer, e apoiar de forma real e eficaz os pequenos e médios empresários. Não falo dos empresários de que fala a Iniciativa Liberal, das empresas que já têm um certo caminho feito, falo dos pescadores de Aveiro, dos agricultores do Alentejo, pessoas que vivem do seu pequeno negócio.
Ter estado noutros partidos é uma vantagem ou uma desvantagem para quem constitui uma nova força política?
Constituir um partido político em Portugal é muito difícil. Os partidos que estão fora da Assembleia da República têm uma representação muito fraca, é complicado.
Sabemos que para entrar na Assembleia da República, por causa do método de Hondt, o círculo eleitoral de Lisboa é determinante para os partidos. O Chega começou por ter um deputado por Lisboa, o Livre também, o Bloco de Esquerda, a Iniciativa Liberal. Penso que a Nova Direita é uma mais-valia neste círculo, a Ossanda foi candidata à câmara de Lisboa pelo Aliança, em fui candidato a Oeiras, temos pessoas de Sintra, da Amadora. Agora é uma questão de crescimento do partido, mas penso que podemos dar cartas nas próximas eleições.
E já estamos com cartazes na rua, quem passeia por Lisboa vê cartazes no Saldanha, na 2.ª Circular, na Avenida da República. Ainda aparecemos como movimento político, porque oficialmente ainda não somos um partido, mas isto também serve para passar palavra, cada vez estão a vir mais pessoas de outros partidos.
O que falta para o Nova Direita ser formalizado e que posição assumirá no partido?
Temos uma comissão instaladora formalizada por escrito, faço parte desse núcleo duro. E já temos 6.500 assinaturas reconhecidas pelo Tribunal Constitucional, faltam-nos mil. Mas vamos um pouco além disso, para ter margem de manobra, porque há sempre assinaturas que acabam por ser invalidadas.
Queremos entregar o que falta com a máxima urgência, para nos podermos candidatar às eleições europeias, que devem ser em Maio ou Junho do próximo ano. É preciso cumprir os prazos legais e, se tivermos em conta as últimas eleições, o presidente Marcelo Rebelo de Sousa marcou-as em Janeiro. Como temos de estar formalizados até três meses antes da marcação das eleições para podermos participar, queremos entregar tudo ainda em Setembro.
Se conseguirem ir às europeias, quem será cabeça-de-lista?
O Tribunal Constitucional demora duas ou três semanas a validar tudo e a responder. Depois é preciso convocar o congresso para eleger os orgãos do partido e aí é que será decidido o candidato às europeias. Mas creio que existe uma candidata natural, se for vontade dela, que é a Ossanda.
"De casa do meu primo saíram 250 cartas para empresários para pagar uma campanha [1986] que o PSD disse que pagava e não pagou"
Disse que têm cartazes na rua. Uma campanha custa dinheiro. O Aliança, e não foi o único, teve alguns problemas. Quem são os financiadores do Nova Direita?
Penso que a Ossanda tem muita consciência disso, como eu tenho. Conheci muito bem os problemas deixados por campanhas eleitorais como a de 1986, que foi muito difícil pagar. Da casa do meu primo saíram 250 cartas para empresários para pagar uma campanha que o PSD disse que pagava e não pagou. Mas pagou-se tudo até ao último tostão. Lembro-me dessas dificuldades todas, sei que não é fácil e não vai ser fácil.
Atualmente, o financiamento é o que se chama carolice nossa. Posteriormente, claro que vamos fazer a abordagem necessária e que todos os partidos fazem, que é procurar investidores. Mas só poderemos falar nisso depois de o partido estar formalizado.
Disse "procurar investidores". Que retorno pode esperar quem financia um partido?
A lei do financiamento dos partidos políticos estabelece muito bem as as regras e a Nova Direita cumprirá escrupulosamente a lei de forma transparente. Não vou fazer futurologia sobre o impato que a Nova Direita terá em Portugal, mas se correr bem eleitoralmente, terá certamente recursos económicos para crescer. Se não tiver a adesão da população, não terá acesso a esses fundos. Poderemos ter doações na conformidade da lei, mas o financiamento através do resultado dos votos é sem dúvida o balão de oxigénio de todos os partidos.
Não haverá retorno para apoiantes seja de que forma for. Defendo que a ascensão no partido deve ser através do mérito. Marcelo Rebelo de Sousa deu uma grande lição aos partidos, fazendo a sua campanha sem meios. Hoje, num mundo de redes sociais, a originalidade, a criatividade e a inovação na comunicação fazem a diferença.
"Portugal precisa de uma renovação política, é muito importante que não sejam sempre os mesmos"
O que defende o Nova Direita que não encontremos já em algum dos 23 partidos existentes, incluindo os que têm assento parlamentar?
Precisamente sermos uma direita que tem as bandeiras de que a direita abdicou. Falei-lhe de várias, da cultura, do nacionalismo, da educação, das novas gerações, de não sermos subservientes à Europa, das câmaras na linha da frente do apoio social, mas também podia falar da aposta nas energias verdes, como a polémica energia nuclear, que defendemos porque é limpa e nos torna menos dependentes.
Para terminar, o que faz falta a Portugal?
Portugal precisa de uma renovação política, é muito importante que não sejam sempre os mesmos - o primeiro-ministro, António Costa, anda nas lides políticas desde os 14 anos. Há também quem tenha notoriedade, mas não tenha grande percurso profissional ou académico e acabe por bloquear a voz de outros. Os partidos blindam-se, fecham-se.
Portugal precisa também de duas ou três prioridades estratégicas, porque estamos a ver a governação do quotidiano, fazer face ao que é urgente, mas não estamos a dar resposta ao que é importante. Olharmos para Portugal e vermos que há dois milhões na pobreza, o que devia preocupar os políticos 24 horas por dia é como tirar essas pessoas da pobreza. Mas o que vemos é uma governação de gestão corrente, preocupada com o escândalo de hoje, o escândalo de amanhã. Depois acontece como com o aeroporto, que já devia estar decidido há 50 anos e ainda aqui andamos a estudar. É um exemplo entre muitos das prioridades nacionais que deviam estar definidas e não estão.
Pedi-lhe um adjetivo para o primeiro-ministro e disse "negociador". Em que sentido?
Negociador no sentido político, porque para se manter no poder é capaz de negociar qualquer coisa e criou uma regra que nunca antes se tinha visto - já na câmara de Lisboa tinha conseguido uma aliança com partidos mais à esquerda e está sempre a arranjar formas de se perpetuar no poder.
Bom, mas passou três eleições seguidas, a última com maioria absoluta. O que é que isso diz da oposição?
Mas houve muitas falhas na gestão política de Rui Rio e dos seus vice-presidentes, que andaram aos ziguezagues na campanha, não souberam lidar com a relação com o Chega. O primeiro-ministro consegue sempre ficar à tona, mas a Nova Direita pode ser mais um espinho nesse negócio que António Costa costuma fazer à esquerda.
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