Em 2011 e mesmo em 2013, eram milhares lá. “Sonhávamos com um mundo melhor. Um Egito melhor, não este”, desabafa Alma, que está ligada a um movimento feminista laico perseguido pela Irmandade Muçulmana, que venceu as eleições de 2012, e que agora deixou de ter atividades visíveis sob o regime de Abdel Fattah al-Sisi, ex-chefe das Forças Armadas que promoveu um golpe em 2013 e depois foi eleito em 2014 com uma maioria esmagadora de mais de 95 por cento dos votos.

No que respeita à liberdade religiosa e aos direitos das mulheres, Alma diz que as coisas “estão melhores” porque “já não há uma pressão sobre quem não é muçulmano ou sobre como as pessoas se vestem”.

Sentada num banco de jardim, numa noite amena no Cairo, Alma diz que “era muito difícil” uma mulher como ela andar de cabeça destapada e falar com estrangeiros.

“Aquele ano (em que a Irmandade Muçulmana governou) andámos para trás séculos. Por isso é que fomos de novo para (a praça) Tahrir. Não era aquilo que queríamos e a democracia também se faz nas ruas”, diz, enquanto troca mensagens permanentes de telemóvel nas redes sociais.

E aponta para o telemóvel: “isto é uma ferramenta para nos mobilizarmos, resistirmos e mudar as coisas”.

Hoje, com al-Sisi, o Egito está “como no tempo do Mubarak (antigo ditador durante duas dezenas de anos)”, “há liberdade social, não há liberdade política. Eles controlam tudo, todas as organizações, todas as estruturas”.

Nas ruas do Cairo não é fácil falar de política. Ahmed, de 20 e poucos anos é uma exceção: esteve na praça e diz que al-Sisi é melhor que Morsi e que Mubarak.

“Estamos a construir a nossa democracia. Se ele é democrata? Ele é militar, mas tem de perceber que o povo é quem governa o país”, avisa o jovem, que votou al-Sisi e aponta as questões económicas como aquilo que mais preocupa os egípcios.

O Governo anunciou um pacote de reformas económicas que vão liberalizar a economia, promovendo a privatização de vários setores e o fim dos subsídios estatais, o que irá aumentar ainda mais a inflação galopante.

“Se ele não fizer isso bem, ele está feito. Nós derrubámos Mubarak, derrubámos Morsi e vamos derrubá-lo a ele se não souber responder às nossas necessidades”, acrescenta.

Mais do que as questões religiosas, o afastamento da Irmandade Muçulmana deveu-se à sua política internacionalista, apoiando outras organizações extremistas do mundo árabe, com vários dos seus dirigentes a defenderem o regresso a um califado islâmico que ignorasse o atual mapa político do Médio Oriente.

“Primeiro sou egípcio, depois sou árabe e só depois é que sou muçulmano. Ninguém toca no meu país”, diz um dos milhares de taxistas que enxameiam as ruas do Cairo com manobras de risco.

O nacionalismo árabe de Nasser e Sadat tem hoje os seus frutos, como são exemplo as bandeiras expostas nas janelas de muitas casas de particulares.

Nas ruas, é visível o elevado número de polícias e de elementos de segurança à paisana, principalmente em locais estratégicos, como a praça Tahrir. A confusão de trânsito permanece, mas em redor da grande rotunda, além dos bazares e algumas lojas ocidentais, os agentes de segurança abordam qualquer pessoa que tire sequer uma fotografia de telemóvel.

“Não posso lá ir por enquanto, mas hei de lá voltar de novo”, acredita Alma.