Mesmo as críticas diárias ao candidato da “ultradireita” André Ventura - que Ana Gomes nunca refere pelo nome - acabam sempre por conduzir a Marcelo Rebelo de Sousa, acusado pela antiga eurodeputada de “normalizar” o Chega e de fazer crescer “os adeptos de Trump” em Portugal, também por ter permitido a formação de um Governo nos Açores com o apoio desse partido.
A campanha só arrancou para a estrada a meio da semana passada, depois de ações canceladas no arranque do período oficial, dia 10, devido ao “agravamento da pandemia” e promessas de uma “campanha mais digital”.
Ana Gomes esteve até sob ameaça de ficar em isolamento profilático, devido ao debate com Marcelo Rebelo de Sousa, que chegou a ter um teste positivo à covid-19, seguido de vários negativos.
Depois do início tímido - a diplomata sugeriu ao parlamento e ao Presidente da República que ponderassem adiar eleições, apesar de não o desejar -, a campanha estabilizou em duas, três e até quatro ações presenciais diárias, com os tradicionais comícios da noite a serem substituídos, devido à pandemia, por conversas diárias online nas redes sociais da candidata, que na reta final foram ainda seguidas de conversas com jovens socialistas, também em formato digital.
Foi na iniciativa “Portugal é consigo, Portugal é connosco” que Ana Gomes conversou com especialistas nas áreas dos 21 compromissos com que se apresenta na corrida a Belém e que foi recebendo apoio de alguns nomes de peso do PS, casos de Manuel Alegre, Duarte Cordeiro ou Vera Jardim, bem como do deputado e líder da concelhia do Porto Tiago Barbosa Ribeiro, do ministro do Mar Ricardo Serrão Santos, do antigo governante João Cravinho ou do secretário de Estado Adjunto e da Educação, João Costa.
Foi também por esta via que foram entrando na campanha dirigentes do PAN e do Livre, partidos que deram apoio oficial à antiga eurodeputada socialista, depois de o PS ter decidido não dar indicação de voto nas presidenciais, saudando a candidatura de Ana Gomes e elogiando o primeiro mandato de Marcelo.
Nos últimos dias, a candidata - que tem poupado o Governo e o primeiro-ministro a críticas - tem dramatizado o apelo ao voto dos socialistas, dizendo que “não é digno do PS de Mário Soares” votar no “candidato da direita” (Marcelo) ou em candidatos anti-Europa (João Ferreira), criticando também Marisa Marias por ter partido para a corrida presidencial dando o chefe de Estado como reeleito, depois de o tema da convergência à esquerda ter ‘pairado’ nos debates televisivos.
O discurso contra o atual inquilino de Belém subiu também de tom, com Ana Gomes a defender que, se for reeleito, o Presidente da República irá trabalhar para trazer a direita de volta ao poder, prevendo até um possível regresso do ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho.
“Qualquer bom entendedor percebe, os socialistas percebem”, disse a candidata.
Ao longo da campanha, a militante do PS foi acusando Marcelo de desvalorizar as eleições, de minar uma requisição civil na saúde por parte do Governo e, ao longo do primeiro mandato, de dificultar o aprofundamento da descentralização que poderia conduzir a um novo referendo pela regionalização.
No período oficial de campanha, Ana Gomes centrou as suas iniciativas no distrito de Lisboa e a Norte (distritos do Porto, Braga e com previsão de ainda ir ao de Viana do Castelo), com incursões ao interior de Viseu, à Figueira da Foz e a Coimbra, e não foi mais a sul do que Almada (Setúbal), depois de já ter percorrido o país na pré-campanha.
A antiga dirigente socialista visitou nesta última semana e meia várias esquadras e associações de bombeiros, defendendo que os temas da segurança “são demasiado importantes” para serem deixados apenas à direita.
Além de visitas a instituições sociais, escolas ou universidades - dizendo querer estar próxima dos portugueses que “têm de trabalhar” -, Ana Gomes arriscou por duas vezes a rua: a primeira, em Matosinhos, quando no primeiro dia do novo confinamento fez um percurso a pé de cerca de um quilómetro entre a Câmara e o mercado local, ouvindo alguns protestos pela presença da comitiva, alargada pelos muitos jornalistas que a acompanhavam.
Pelo contrário, foi recebida com aplausos por membros da comunidade cigana no bairro do Navegadores, em Porto Salvo (concelho de Oeiras), naquele que foi, até agora, o momento mais colorido e animado da campanha.
Ana Gomes quase nunca tira a máscara de proteção contra a covid-19, nem para falar à comunicação social, e a exceção foi uma conversa, ao ar livre, com a Associação Académica de Coimbra, sobretudo com o objetivo de pintar os lábios de vermelho em apoio à também concorrente Marisa Matias, depois desta ter sido atacada por André Ventura.
Para hoje está previsto o único comício da campanha, em formato online a partir do Coliseu do Porto, e que contará com a presença do antigo eurodeputado Francisco Assis - o primeiro a sugerir publicamente a sua candidatura a Belém -, Manuel Alegre e Paulo Pedroso, entre outros, e na sexta-feira caberá ao antigo líder da JS Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas, o lugar de ‘cabeça de cartaz’ na última conferência online de Ana Gomes.
As eleições presidenciais realizam-se em plena epidemia de covid-19 em Portugal no domingo, sendo a 10.ª vez que os cidadãos portugueses escolhem o chefe de Estado em democracia.
Concorrem às eleições sete candidatos, Marisa Matias (apoiada pelo Bloco de Esquerda), Marcelo Rebelo de Sousa (PSD e CDS/PP) Tiago Mayan Gonçalves (Iniciativa Liberal), André Ventura (Chega), Vitorino Silva, mais conhecido por Tino de Rans, João Ferreira (PCP e PEV) e a militante do PS Ana Gomes (PAN e Livre).
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