"Repudio veementemente os factos que me são imputados. Nesta medida, irei fazer a minha defesa e de imediato requer a competente instrução", afirmou Rui Moreira na reunião do executivo desta manhã.

O Ministério Público (MP) acusou presidente da Câmara do Porto da prática de um crime de prevaricação, no âmbito do Caso Selminho, por considerar que o autarca violou os deveres de legalidade e de imparcialidade em decisões que tomou na gestão de um conflito que opunha o município à imobiliária da sua família.

Salientando que a acusação é "descabida" e "infundada", o independente sublinhou que este não é o caminho para o arredarem da causa pública.

"Acredito que todas as pessoas de bem defenderão, independentemente da ideologia que professem ou do quadrante político-partidário em que se enquadrem, que uma opinião descabida, infundada e ofensiva de dois Procuradores - não possa ter esse efeito. É em defesa da dignidade e de todos os que empenhada e denodadamente exercem funções públicas que recuso ceder à demagogia de me afastar do exercício das minhas funções", frisou.

Para o autarca, a acusação, assente em conclusões "completamente falsas" visa manchar o seu bom nome e roubar a sua honorabilidade, "surgindo, objetivamente, no conteúdo, no tempo e no propósito, como uma peça de combate político-partidário”.

Moreira reitera que, enquanto presidente da câmara, não teve qualquer intervenção junto dos serviços da Câmara ou dos advogados que a representaram no processo que opôs a autarquia à empresa Selminho, que é da sua família e da qual é indiretamente sócio.

"Era preciso ser muito tolo, e disso ainda não me acusaram, para que, depois de me ter candidatado e recandidatado ao cargo que hoje exerço, me colocasse numa posição tão frágil", observou.

"O único ato que pratiquei, enquanto presidente da Câmara, foi ter outorgado uma procuração a uns advogados que não conhecia e com quem nunca falei, muito menos sobre o assunto, para que representassem a Câmara numa diligência do processo movido contra a Câmara", sublinhou.

O autarca refere que o fez um mês depois de tomar posse como presidente da câmara, porque o seu então Chefe de Gabinete, Azeredo Lopes, lhe garantiu não só que não existia qualquer problema em fazê-lo, como era sua obrigação.

"Os advogados em causa patrocinavam a Câmara nesse processo já há muito tempo, por escolha do meu antecessor, e não me passou pela cabeça substituí-los”, disse.

O independente acrescenta que, não fazia a menor ideia de qual seria o conteúdo da diligência cujo resultado se resumiu a suspender o processo.

"Todos os outros atos relativos a qualquer relação entre a empresa Selminho e a Câmara do Porto foram, sempre, conduzidos, quer formal quer substantivamente, pela vereadora e vice-presidente, Guilhermina Rego", acrescentou.

Moreira recordou que, em 2017, os eleitos da CDU apresentaram uma participação no MP, pretendendo que fosse intentada uma ação judicial de perda de mandato, tentando, "administrativamente", derrubá-lo, ação que foi indeferida.

Segundo a acusação deduzida no dia 10, divulgada na sexta-feira, o MP concluiu que, tendo tomado posse como presidente da autarquia em outubro de 2013, Rui Moreira determinou que o município alterasse a posição jurídica e/ou urbanística "que vinha sucessivamente adotando, quer nos litígios judiciais, quer nos procedimentos administrativos, relativamente à pretensão da sociedade comercial de construir no referido terreno"

"Tal alteração de posição foi motivada pela intenção de beneficiar a sociedade comercial de que era sócio com os referidos familiares; e que se concretizou na assunção pelo município, em transação judicialmente homologada em setembro de 2014", refere a acusação.

Esta transação foi realizada, segundo o MP, "sem qualquer autorização da Assembleia Municipal, do compromisso de diligenciar, nomeadamente durante a revisão do Plano Diretor Municipal (PDM), pela alteração da qualificação do solo do terreno […], de modo a que esta pudesse aí construir, e na aceitação de submeter a um tribunal arbitral a fixação de uma indemnização devida à sociedade comercial caso as alterações ao plano diretor municipal não fossem efetuadas".

No acordo de 2014, no primeiro mandato de Rui Moreira como presidente da autarquia, o município assumiu o compromisso de devolver capacidade construtiva àquele terreno, na Calçada da Arrábida, no âmbito da atual revisão do PDM, ou recorrer a um tribunal para definir uma eventual indemnização à imobiliária.

No centro da disputa está um terreno na escarpa do Douro, vendido por um casal que o registou por usucapião à imobiliária Selminho, em 2001, e que o tribunal considerou ser propriedade municipal, na sequência de uma ação movida pela autarquia em 2017.

O processo foi iniciado após ter sido divulgado que um técnico da autarquia concluiu serem municipais 1.661 dos 2.260 metros quadrados apresentados pela Selminho para construção na escarpa da Arrábida.

Em maio, o Supremo confirmou a decisão do Tribunal da Relação do Porto, julgando improcedentes os recursos apresentados pela Selminho, imobiliária da família do presidente da Câmara do Porto, e pelo casal que em 2001 vendeu à empresa um terreno na Arrábida.

Em outubro de 2019, o Tribunal da Relação do Porto confirmou a decisão da primeira instância que, em janeiro desse ano, julgou "nula" a escritura de venda de 2.260 metros quadrados na Arrábida por um casal à Selminho, ordenando o "cancelamento" da sua inscrição na Conservatória do Registo Predial.

[Atualizada às 12:05]