Escreve o jornal Público esta segunda-feira que, nas últimas semanas, tem sido verificado um aumento da oferta de testes serológicos em Portugal, que permitem perceber se a pessoa já teve contacto com o novo coronavírus e se desenvolveu anticorpos que lhe permitem ficar imune.
Até ao momento, há mais de 50 marcas de testes serológicos rápidos, com certificação CE — conformidade de um produto com a legislação harmonizada da UE — registada no Infarmed (entre os 25 e os 50 euros). Há também testes "automatizados", realizados em laboratórios de análises clínicas (com um preço entre os 78 e os 86 euros). "Contudo, este registo não constitui qualquer autorização ou validação por parte do Infarmed", esclareceu o regulador ao jornal.
Estes testes rápidos, que se assemelham às picadas no dedo para recolher uma amostra de sangue para medição de glicemia nos diabéticos, são já disponibilizados em farmácias e clínicas em Portugal. Porém, restam ainda muitas dúvidas quanto à sua aplicação. A Ordem dos Farmacêuticos pediu em maio um esclarecimento ao Infarmed, para saber se as farmácias estão ou não habilitadas a realizar estes testes rápidos que detetam anticorpos.
Segundo o Público, a resposta do Infarmed "é confusa": foi referido que os farmacêuticos estão habilitados para os fazer e que as farmácias "poderiam" realizá-los "caso se revelassem úteis para a população em geral", mas, "no contexto actual, não estão reunidas as condições para que os testes serológicos rápidos possam ser realizados nas farmácias comunitárias ou em qualquer outro local de forma generalizada utilizado no diagnóstico". Isto porque o seu "resultado isolado não pode excluir a possibilidade de infecção" pelo novo coronavírus. Além disso, o desempenho dos diferentes testes ainda está a ser "alvo de discussão".
Por outro lado, o Infarmed referiu que os testes "são apenas destinados pelo seu fabricante para uso profissional" e que são os que neste momento "levantam mais preocupações [na UE] dada a disseminação da sua comercialização" e porque a sua utilização “é tão simples que muitas vezes são incorrectamente disponibilizados a leigos", sendo também "proibida a sua publicidade junto do público em geral".
Sobre a nota divulgada, Franklim Marques, presidente da Direcção Regional do Norte da Ordem dos Farmacêuticos, referiu que "o está aqui em causa não é a capacidade [de os profissionais] fazerem este teste, mas sim a capacidade da sua interpretação".
Em abril, a Associação Nacional de Farmácias recomendou que os testes sejam realizados apenas internamente aos profissionais das farmácias. Em resposta ao Público, referiu que já se deu início a uma formação que "explica as potencialidades e as limitações dos testes" onde participaram já 110 farmacêuticos. Contudo, a formação "não contempla qualquer realização de testes ao público".
Apesar disso, há já pelo menos nove farmácias que o fazem no Norte, diz o jornal. Nestes espaços, o teste é realizado e interpretado por um profissional que tem o cuidado de explicar que, caso o resultado seja positivo, isso pode não significar imunidade à covid-19.
"Testes devem ser usados com parcimónia"
Neste sentido, o Infarmed refere que a utilização generalizada destes testes pode ser "indesejável porque irá aumentar o número de casos falsos positivos [em que houve contacto com o SARS-CoV-2]". Por outro lado, o regulador alerta ainda que há "o risco de as pessoas, face a um resultado de anticorpos positivos, ficarem com uma falsa sensação de segurança e adoptarem comportamentos de risco".
Henrique Barros, presidente do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), explicou ao Público que "estes testes devem ser usados com parcimónia e em condições controladas" e que "estar a fazê-los de uma forma desorganizada, não pensada em termos de grupo, de comunidade, não faz sentido".
Ricardo Mexia, presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública, corrobora a opinião. "O problema é que as pessoas acham que, com estes testes [caso dêem resultado positivo], estão imunes", frisou, lembrando que importa também saber "o que é que fazem depois com essa informação".
A nível nacional, a DGS informou que já está em curso um projeto piloto que abrange cerca de 2.000 pessoas, num estudo coordenado pelo Instituto Ricardo Jorge. A 21 de maio, o secretário-geral da Saúde, António Lacerda Sales, referiu que "todos os restantes estudos e testes em diferentes segmentos serão importantes para uma avaliação da imunização da população no futuro". Neste sentido, são já várias as entidades com testes serológicos em curso.
A Universidade do Porto começou fazer testes serológicos aos funcionários docentes e não docentes com o objetivo de “caracterizar” a resposta imunológica da comunidade académica à covid-19, bem como o Laboratório de Patologia Clínica da Unidade Local de Saúde da Guarda, que também os faz desde 7 de maio, enquanto o Serviço de Patologia Clínica do Centro Hospitalar e Universitário Lisboa Norte está a fazer testes desde abril.
A 19 abril, o consórcio Serology4Covid, que agrega cinco institutos de investigação, lançou um projeto para implementar um ensaio serológico de deteção de anticorpos para a covid-19 na população portuguesa. Somam-se ainda iniciativas da Fundação Champalimaud que realizou testes serológicos em dois centros hospitalares e do Instituto Gulbenkian de Ciência, também atuando em dois hospitais.
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