Oswald Gracias foi um dos oradores do segundo dia da cimeira histórica do Vaticano sobre a proteção da criança, que decorre até domingo, tendo abordado a questão da prestação de contas numa igreja colegial e sinodal.

Ouvir as vítimas, aumentar a consciência, aumentar o conhecimento, desenvolver novos procedimentos, e partilhar boas práticas são alguns dos objetivos do encontro que se centra em três temas principais: responsabilidade, assunção de responsabilidades e transparência.

O abuso cometido por um membro da Igreja é também "um comportamento criminoso público", disse o cardeal.

"A Igreja não vive sozinha num mundo isolado. A Igreja vive no mundo e com o mundo. Aqueles que são culpados de um comportamento criminoso têm de prestar contas perante as autoridades civis.

O cardeal Oswald Gracias, que também faz parte do conselho de cardeais que aconselham o papa Francisco, disse aos 190 líderes da igreja católica, incluindo 114 representantes de conferências episcopais de todo o mundo que participam na cimeira, que a abordagem deste problema tem de ser "colegial".

"O ponto é claro: nenhum bispo pode dizer a si mesmo: “Este problema de abusos na igreja não me preocupa, porque as coisas são diferentes na minha parte do mundo”, assegurou.

"Enfrentar o abuso sexual na Igreja é um desafio complexo e multifacetado, talvez sem precedentes. Isso faz com que a colegialidade seja ainda mais decisiva na situação atual”, explicou.

Oswald vincou a necessidade de dar justiça às vítimas e pediu que "a lei e o processo eclesiástico devem ser implementados de forma justa e efetiva”.

O bispo de Chicago, Estados Unidos, o cardeal Blasé J .Cupich, fez também uma intervenção, recordando que os pais e mães das vitimas de abusos sexuais por parte de membros do clero exigem que os bispos sejam responsabilizados pela "cegueira" sobre a extensão desse fenómeno.

Blasé Cupich defendeu que sejam estabelecidas leis e estruturas sólidas relativamente à responsabilidade dos bispos.

O cardeal recordou aos presentes “que há que rejeitar categoricamente o encobrimento” ou o conselho para se distanciarem dos sobreviventes de abuso por razões legais ou por medo de escândalo e defendeu que sejam envolvidos especialistas leigos nestes processos de investigação.

Por outro lado, defende que as investigações sobre "casos de abuso contra um bispo devem ser transparentes e bem conhecidas pelos fiéis".

"As vítimas e suas famílias, assim como as pessoas que apresentam a acusação, precisam de ser tratadas com dignidade e respeito, e devem receber cuidados pastorais adequados", disse, acrescentando que "ninguém deve ser discriminado ou sofrer represálias com base numa queixa. "

O cardeal disse ainda que "a denúncia de um crime não deve ser prejudicada por regras de confidencialidade" e recomendou que possam ser tomadas medidas cautelares apropriadas, incluindo a retirada temporária do acusado.

No primeiro dia da cimeira, o papa pediu “medidas concretas e efetivas” para erradicar os abusos sexuais por parte do clero, considerando que não basta apenas condenar os crimes, e apresentou um guia de 21 medidas para reflexão durante este encontro dos líderes católicos.

Cinco vítimas apresentaram os seus testemunhos, um momento considerado “muito tocante” por membros da comissão organizadora do encontro.

“Fiquei muito tocado com os testemunhos das vítimas”, disse em conferência de imprensa, adiantando que “o clima foi positivo e intenso, mas com a consciência da importância do encontro”, disse Federico Lombardi, presidente da Fundação do Vaticano, Joseph Ratzinger - Bento XV.

Os testemunhos surgiram de diferentes continentes, América, Europa, África e Ásia.

Também para o arcebispo de Malta, Charles Scicluna, especialista do Vaticano e enviado do papa para investigar os casos de abusos no Chile, os testemunhos foram emocionantes.

“Ouvimos vozes muito fortes e emocionadas e creio que precisávamos ouvir as vítimas. Sempre disse que para compreender a gravidade da situação é fundamental ouvir e encontrar as vítimas”, disse Charles Scicluna.

Dirigindo-se às vítimas, Charles Scicluna assegurou: "Vamos protegê-los a todo o custo”.