A Doença de Alzheimer é o tipo mais comum de demência e provoca uma deterioração progressiva e sem volta a dar de várias funções cognitivas. Cientistas de várias nacionalidades estão a desenvolver um teste ao sangue que identifica esta doença degenerativa.
A Doença de Alzheimer deteriora funções como a memória e a concentração, afetando o pensamento e a linguagem do doente, entre outras, de acordo com o relatório “Global action plan on the public health response to dementia 2017 – 2025” da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Recentemente, vários estudos descrevem que um exame experimental ao sangue mostra ser altamente preciso a distinguir pessoas com Doença de Alzheimer das que não têm.
Os avanços aumentam a esperança de haver em breve uma maneira simples de diagnosticar esta que é a forma mais comum de demência, que, ainda de acordo com o relatório da OMS, é uma doença que afeta mais os idosos, “acabando por interferir com a capacidade de executar atividade diárias”, afetando a autonomia.
Os testes ao sangue identificaram se as pessoas tinham Alzheimer, algum tipo de demência ou nenhum, com uma precisão que varia entre 89% e 98%.
Maria Carrillo, diretora científica da Alzheimer's Association, nos Estados Unidos, mostra-se positiva: “Nunca vimos tanta precisão nos esforços anteriores”, disse.
A doença é geralmente diagnosticada através de testes de memória e pensamento, formas de deteção imprecisas. Métodos mais confiáveis, como ressonâncias magnéticas cerebrais, são mais caros.
O neurocientista-chefe Eliezer Masliah, do Instituto Nacional de Envelhecimento americano (National Institute on Aging), diz que os dados “parecem muito encorajadores”. Para ele, este teste "parece ser ainda mais sensível e mais confiável" do que os métodos anteriores.
No entanto, os cientistas alertam para o facto de esta possível nova maneira de diagnóstico ainda precisar de ser aplicada em populações maiores e mais diversas. Se os benefícios do teste forem confirmados, Eliezer Masliah e Maria Carrillo esperam que um teste para uso generalizado esteja pronto em cerca de dois anos.
Devido à crise pandémica da covid-19, os resultados foram discutidos à distância, pela internet, na Conferência Internacional Alzheimer’s Association, que termina hoje, 30 de julho.
Alguns resultados também foram publicados no “Journal of the American Medical Association”, conhecido como JAMA.
Este é um esforço com muitos anos e que tem vindo a ter desenvolvimento. Já no ano passado, cientistas reportaram resultados encorajadores com análises ao sangue.
Estas análises agora conhecidas medem a presença de amiloide, uma das duas proteínas que se acumulam e danificam o cérebro dos pacientes com Alzheimer. A publicação na JAMA começa por perguntar qual é o nível de precisão do “plasma phospho-tau217” (p-tau217) na diferenciação da Doença de Alzheimer de outras doenças neurodegenerativas."
O termo p-tau217 refere-se a uma proteína presente no nosso sangue, que ao acumular-se pode danificar o cérebro do doente com Alzheimer. E é nesta proteína - tau – que se foca o trabalho destes cientistas. O p-tau217 é um indicador que dá mais confiança aos investigadores das várias empresas e universidades que desenvolvem testes.
Cientistas da Universidade da Califórnia, em São Francisco, descobriram que testes à p-tau217 ajudam a distinguir pessoas com Alzheimer daquelas com outra doença do foro neurológico, com precisão de 96%. Este estudo foi realizado com 617 pessoas.
O teste p-tau217 superou uma série de outras maneiras de indicar a presença da Doença de Alzheimer, como através de imagens de ressonância magnética, por exemplo.
Suzanne Schindler, da Universidade de Washington, em St. Louis, Missouri, também aponta a p-tau217 como melhor que outros indicadores para revelar pacientes com Alzheimer. Para esta cientista, se este teste for melhor comprovado, "ajudaria a diagnosticar [as pessoas com Alzheimer] mais cedo e com mais precisão". Para isso, já começou um estudo com um maior número de pessoas, em St. Louis.
Oskar Hansson, da Universidade de Lund, na Suécia, conduziu um estudo em mais de 1.400 pessoas. Os testes foram realizados em indivíduos dos Estados Unidos da América, da Colômbia e da Suécia.
Na parte americana do estudo foram incluídos 81 indivíduos, que doaram os cérebros aquando da sua morte. Assim, os investigadores foram capazes de provar que o teste ao sangue, feito em vida dos pacientes, corroborava a presença da Doença de Alzheimer.
A componente colombiana incluiu pessoas com um gene raro que faz com que desenvolvam Alzheimer em idade jovem, geralmente na faixa dos 40 anos. Naqueles com o gene, os níveis de p-tau217 no sangue começaram a subir "cerca de 20 anos antes dos sintomas", disse Hansson.
De entre os patrocinadores do estudo estão os Institutos Nacionais de Saúde dos EUA, grupos de saúde do governo sueco, a Alzheimer’s Association, várias fundações e empresas. Alguns líderes de estudo trabalham para a empresa farmacêutica Eli Lilly, nos EUA, ou consultam a empresa, como fez Hansson.
Demência pelo mundo e em Portugal
Segundo dados de 2019 da Organização Mundial de Saúde (OMS), há 50 milhões de pessoas em todo o mundo que sofrem de demência, sendo o Alzheimer a forma mais comum – perfaz 60 a 70% dos casos.
Portugal tem 19,9 casos por mil habitantes, um valor superior à média da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), segundo dados do relatório "Health at a Glance 2017". Isto faz com que Portugal ocupe o 4.º lugar entre os países da Organização com mais casos de demência.
Atualmente, a medicação apenas alivia os sintomas temporariamente e não diminui o declínio mental causado pela demência.
A investigação em Portugal tem várias vertentes.
Uma equipa de investigadores da Universidade de Coimbra (UC) descobriu “um possível novo alvo terapêutico para a Doença de Alzheimer”. A investigação procurou microARNs (“pequenas sequências genéticas com um papel regulador nas células”) que fossem “possíveis alvos terapêuticos inovadores para a Doença de Alzheimer, tendo filtrado o microARN-31 como alvo promissor para este tipo de estratégias”, afirma a UC à Lusa, em maio deste ano.
Mais recentemente, a Lusa noticiou que investigadores do Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP) estão a desenvolver, no âmbito de um projeto transfronteiriço INTERREG, biossensores descartáveis que, através da identificação de potenciais biomarcadores associados ao Alzheimer, visam detetar precocemente a doença.
Felismina Moreira, do BioMark, um grupo de investigação do ISEP, disse que estão a desenvolver “uma tecnologia barata, minimamente invasiva [através de uma picada] e com rápida resposta.”
A grande vantagem, diz Felismina é que “o clínico poderá utilizar no local e na hora. É um dispositivo fácil de usar e barato, com um custo de produção de cerca de um euro”, referiu à Lusa em julho deste ano.
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