Nas vésperas do início das primárias, o pretendente à candidatura presidencial republicana voltou a passar três dias no pequeno estado de Iowa, aonde chegou no seu Boeing particular. Trump desce sozinho do avião, sem papéis ou anotações, cruza a pista de aterrissagem e sobe ao púlpito, enquanto é ovacionado por um grupo de simpatizantes que mistura jovens e velhos, eleitores desiludidos e fervorosos republicanos conservadores.
"A questão é esta: os Estados Unidos fizeram uma encomenda de um avião de três milhões de dólares. Vocês não acham que poderiam ter feito um contrato melhor?", pergunta Trump, em alusão à decisão de comprar uma nova frota de Air Force One, o avião presidencial. "Siiiiiim!" responde, em coro, a multidão. Este espetáculo com um único protagonista prolonga-se por 35 minutos. Donald Trump oferece-se para mostrar o seu avião por dentro às crianças que estão no comício. "Os pais não, porque vão estragá-lo".
Um grupo de estudantes, usando bonés de Trump, olham uns para os outros e morrem de riso a cada brincadeira. Alguns manifestantes interrompem o discurso. Os partidários do candidato a candidato repetem: "Trump!, Trump!" e apontam na sua direção. Em seguida, o candidato mostra as câmaras que estão ao fundo e queixa-se da "falta de dignidade" da imprensa. "Podemos falar da concorrência por cinco minutos?", pergunta; "Siiiiim!", responde o público. E então menciona o seu adversário mais próximo no partido: Ted Cruz, nascido no Canadá, de quem fala rapidamente para depois se referir a Jeb Bush, com "2% nas sondagens".
Depois, é o momento de questionar os democratas e, em particular, Hillary Clinton, dizendo que contra a sua vontade será a vencedora das primárias do partido no governo. "Prisão para Hillary!", grita uma mulher do público. Depois vem uma leitura da atualidade: a organização jihadista Estado Islâmico, os refugiados sírios, China, Irão... Em cada ponto, Trump deplora a incompetência com que os dirigentes americanos abordam estes temas. "Os chineses estão a enviar génios, superinteligentes, que não brincam, não sorriem, não dizem olá, só chegam e querem trabalhar", afirma Trump. "Os persas são grandes negociadores", acrescenta em outro momento.
O público parece um pouco perdido quando ele desvia o assunto para mencionar John Kerry, secretário de Estado americano, ou quando se queixa dos que deixaram de ser parte do establishment para ser antissistema "em dois minutos". Mas, sem dúvida, Donald Trump sabe captar as atenções. E o seu boicote ao debate republicano de quinta-feira? "Que aborrecido. Muito difícil de ver. Mas se eu tivesse lá estado, tinham gostado, não tinham?"
Em seguida, fala de uma foto em que aparece a parte posterior da sua cabeça. "Que eu saiba, não há calvície", diz, provocando mais gargalhadas.
"Sem papas na língua"
Alguns só foram presenciar o espetáculo, mas a maioria admite a sua admiração. "Ele diz o que pensa", justificam alguns. Um dos estudantes que pouco antes morria de rir, explica: "Não tem papas na língua e acho que vai fazer tudo o que diz". A falta de definição do programa de Donald Trump é um problema? "É menos detalhado que o de Ted Cruz, mas é um homem de negócios e eu confio em que possa relançar a economia", diz Matt Simon, de 18 anos.
O propósito de Trump é mobilizar os americanos que deixaram de votar, desiludidos com a política. Farah Adams, que espera um autógrafo, conta que no passado votou sempre nos democratas. Este ano, não se teria interessado tanto na campanha se não fosse pela presença de Trump, que começou a admirar quando ele apresentava o reality show "O Aprendiz". Farah não se preocupa por o próximo ocupante da Casa Branca ser um presidente que costuma cometer gafes nas suas intervenções. "Quando se encontrar com líderes estrangeiros, sei que vai dar uma imagem diferente da dos debates. É brilhante", afirma esta enfermeira, que viajou do vizinho estado de Wisconsin.
Os seguidores de Trump têm confiança na sua capacidade para lidar com qualquer tipo de crise. Pouco importa que o seu conhecimento dos assuntos internacionais pareça ser um pouco superficial. "Não é estúpido, ele sabe como comandar um país", assegura Laura Anmeth, uma aposentada de 62 anos que acredita que há uma aura de mistério em torno de Donald Trump que aumenta a sua força. O marido, Jerry, veterano da guerra do Vietname, dá um exemplo: "O Estado Islâmico vai ter mais medo dele do que de qualquer outro presidente porque não vão saber o que vai fazer com eles, talvez os bombardeie, talvez não".
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