Na segunda audiência de julgamento, quando questionado pelo procurador José Nisa, o ex-diretor do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) explicou que estava de férias quando, no Natal de 2013, foi informado pela sua secretária de que António Figueiredo tinha estado no SEF e deixado na portaria dois envelopes, com 100 euros cada, dirigidos às funcionárias do seu gabinete, para que comprassem um perfume.
Jarmela Palos explicou que deu ordens para não mexerem nos envelopes até ele regressar de férias e resolver a situação com António Figueiredo. Adiantou que, após o regresso ao trabalho, colocou os envelopes num cofre até ter oportunidade de falar pessoalmente com António Figueiredo.
Quando isso aconteceu, devolveu os envelopes ao ex-diretor dos Registos e Notariado (IRN) e explicou-lhe que aquilo não era admissível.
Jarmela Palos voltou a ser questionado sobre a alegada entrega no SEF de duas garrafas de vinho “Pera Manca”, enviadas por António Figueiredo, que, antes, numa conversa com o então diretor do SEF, lhe tinha dito que lhe ia enviar uma “pinguinha”.
O ex-diretor do SEF assegurou que, na altura, disse a António Figueiredo para não concretizar a ideia, adiantando-khe que “não valia a pena”, tanto mais que ia estar fora de Lisboa.
Jarmela Palos disse desconhecer se porventura as ditas garrafas chegaram efetivamente a ser entregues ao SEF, e admitiu que sabia que António Figueiredo tinha um familiar que se dedicava ao negócio dos vinhos, com uma loja na Baixa de Lisboa.
O ex-diretor do SEF mostrou-se indignado com o facto de a acusação do Ministério Público colocar em causa a sua honorabilidade e reputação com episódios como o do vinho e outros, realçando que nunca deu qualquer “tratamento de favor” a António Figueiredo, que é também arguido neste processo.
Jarmela Palos declarou ainda que nunca se sentiu “influenciado” ou “pressionado” por qualquer dos ministros com quem trabalhou ao longo da sua carreira no SEF, incluindo Miguel Macedo, arguido neste processo por crimes de prevaricação e tráfico de influência.
O ex-diretor do SEF admitiu, contudo, que foi o então ministro Miguel Macedo que lhe telefonou a perguntar se ele tinha disponibilidade de se reunir com o empresário Jaime Gomes por causa da questão da vinda de doentes líbios para Portugal. A reunião foi marcada e ocorreu nas instalações do SEF, precisou.
Em resposta ao procurador, Jarmela Palos garantiu que só conheceu Miguel Macedo quando este assumiu o cargo de ministro da Administração Interna, em 2011.
Quanto à relação com António Figueiredo, disse que só houve maior aproximação a partir de 2008/2009, devido à “ligação profissional” motivada pela lei da nacionalidade que mexia com vários organismos públicos.
Jarmela Palos foi confrontado com a sua presença num jantar em Cascais, na casa de um cidadão chinês, a convite de António Figueiredo, tendo o ex-diretor do SEF revelado que aceitou o convite no pressuposto de que iam estar outras pessoas, incluindo um desembargador da Relação, mas nada disso aconteceu, tendo passado a noite a falar com um casal de portugueses que residia em Inglaterra.
Durante o seu depoimento, o ex-diretor do SEF negou que tenha concedido um tratamento de favor a alguém, quer na questão da vinda dos doentes líbios para Portugal, quer noutras situações, mostrando-se indignado com o estigma e a chancela que a acusação do MP lhe colocou para carregar o resto da vida.
O julgamento do processo “Vistos Gold”/Operação Labirinto conta com 21 arguidos - 17 pessoas singulares e quatro empresas - e está relacionado com indícios de corrupção ativa e passiva, recebimento indevido de vantagem, prevaricação, peculato de uso, abuso de poder e tráfico de influência na aquisição de vistos 'gold'.
Entre os arguidos estão o ex-ministro da Administração Interna Miguel Macedo, a ex-secretária geral da justiça Maria Antónia Anes e o empresário da área da saúde Paulo Lalanda e Castro.
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