Não sou nada o Leicester foi.
Nunca serei nada… Leicester foi.
Não posso querer ser nada… o Leicester quis.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo… o Leicester tinha, mas um empate acabou com o sonho.

(Tabacaria, Álvaro de Campos)

O empate a uma bola no King Power Stadium, na noite de terça-feira, ditou o afastamento do Leicester City, campeão inglês em título, da Liga dos Campeões. E, consequentemente, o fim de um novo sonho que muitos pensaram que se podia concretizar: depois da conquista da liga inglesa, um brilharete nunca antes visto na maior competição de clubes a nível europeu.

Primeiro que tudo confirmou-se que os espanhóis do Atlético Madrid são o carrasco do Leicester. Na quarta participação do clube inglês em competições da UEFA esta é a terceira vez que a sua caminhada europeia termina aos pés dos colchoneros.

Em 1961/62, na 1.ª ronda da Taça das Taças, os foxes caíram, depois de terem conseguido um empate a um golo em Inglaterra, após, em Espanha, terem sido derrotados por dois golos sem resposta.

Mais de 30 anos depois, há cerca de duas décadas, numa primeira eliminatória a contar para a edição de 1997/98 da Taça UEFA (atual Liga Europa), o Leicester voltou a ser eliminado perante os madrilenos, perdendo em casa por 0-2, e fora por 2-1.

Mas este ano talvez fosse diferente. Talvez porque depois de um sonho impossível concretizado na época passada, com a conquista da Premier League, e de uma nova temporada que, em Terras de Sua Majestade, não estava a dar os melhores frutos, todos acreditavam que na Liga dos Campeões a sorte podia voltar a sorrir.

Era legítimo.

A fase de grupos foi ultrapassada apenas com uma derrota, frente ao FC Porto, no Estádio do Dragão por 5-0, quando a passagem já estava assegurada. E a passagem aos quartos-de-final, após a reviravolta na eliminatória contra o Sevilha, depois de os ingleses perderam por 2-1 no Sánchez Pizjuán, não dava margem para dúvidas: havia possibilidades.

Mas o sorteio da nova eliminatória enganava. Se era certo que os campeões ingleses em título tinham ‘fintado’ os tubarões europeus (Bayer de Munique, Juventus, Real Madrid e Barcelona), certo é que o emblema do Atlético Madrid deu uma falsa esperança.

Esta é a 3ª meia-final da Liga dos Campeões em quatro anos de um clube que tem crescido de forma intensa desde que Diego Simeone assumiu o lugar de treinador, embalado pela, à época, recente conquista da Liga Europa por Quique Flores, num tempo em que os portugueses Simão Sabrosa e Tiago faziam a prata da casa.

Ainda com esperanças de virar a eliminatória, uma vez que na primeira mão a equipa inglesa tinha sido derrotada pela margem mínima, fora, o Leicester acabou por cair aos pés da turma liderada por Simeone.

Nice, Sevilha, Leipzig... Esta época, os sonhos morreram mais cedo

Depois de, na temporada passada, o Leicester ter levado os adeptos de futebol ao céu com a, provavelmente, mais inusitada conquista de um dos principais campeonatos neste século, este ano a sua eliminação acaba por colocar um ponto final nos sonhos de 2017.

O Nice, depois de uma primeira grande metade do campeonato, e com uma equipa que conjugava de capacidade reconhecida com jovens talentos, acabou por ceder perante o tricampeão francês, Paris Saint Germain, e do Mónaco, um gigante adormecido, afastando-se assim da luta pelo título francês. Acabou por conseguir algo não menos impressionante: a qualificação para a Liga dos Campeões.

Também o Leipzig - que chegou à Bundesliga no início da época, com um argumento em mãos de David contra Golias e que durante jornadas consecutivas ameaçou colocar um fim à hegemonia bávara do Bayern de Munique - cedeu na reta final. Ainda assim deverá conseguir qualificar-se, diretamente, para a Liga dos Campeões, algo sensacional para uma equipa acabada de chegar ao principal escalão do futebol profissional alemão.

Até o Sevilha do revolucionário Sampaoli, o homem que levou o Chile à conquista da Copa América, que chegou a ocupar a primeira posição da La Liga, foi lentamente caindo na classificação, afastando-se dos lugares que lhe permitiam lutar pelo título de campeão nacional após os blanquirrojos terem facilitado diante dos adversários mais complicados - perdeu dois jogos com o Barcelona, e saiu derrotado do Vicent Calderón.

Depois de Claudio Ranieri, o pai de todos os sonhos, ser afastado do King Power Stadium, agora morre a mãe - ou, se preferirem, a equipa, que lhes deu corpo. Durante dois anos, numa caminha histórica no mundo do futebol, os foxes foram gigantes, primeiro ingleses, depois europeus. O Leicester teve em si "todos os sonhos do mundo", ou quase. Agora, acabou... pelo menos no que a esta temporada diz respeito.

Que 2017/18 nos volte a fazer sonhar.