Um dérbi é um dérbi, mas não há necessidade de se passar paninho quente onde também não é preciso. Não se tratou obviamente de um jogo a feijões, embora seja conveniente dizer que não era, à partida, um jogo que puxasse entusiasmo até mais não.
É uma visão um pouco fatalista e redutora quando se fala de um dérbi regional com semelhante pergaminho, mas com bancadas despidas, sem a normal algazarra e arrufo dos adeptos, o ambiente pré e durante jogo, não foi o habitualmente vivido por alturas de embate entre os dois grandes de Lisboa. Faltava alguma coisa.
Uma situação que pode ter levado a isto pode ter sido o facto de que uma das equipas iria entrar em campo meio que resignada por ter o futuro já escrito (o Benfica iria manter sempre o 2º lugar) e outra estar ciente de que um empate seria suficiente para assegurar o objetivo do 3º lugar. Não foi o mais intenso dos dérbis — nem nada que se pareça. Mas foi um jogo aberto, disputado e com muitas ocasiões de golo.
Portanto, antes dos craques pisarem o relvado da Luz, os leões dispunham de três pontos de vantagem sobre o Braga, quarto classificado. Todavia, uma derrota na Luz, aliada a um triunfo bracarense na receção ao FC Porto, podia custar o pódio, uma vez que os minhotos tinham vantagem no confronto direto. O SC Braga já tinha provado esta época que sabia como ganhar ao campeão nacional — ironia das ironias com Amorim no banco da equipa minhota — e foi o acabou por acontecer. Mas já lá iremos.
Esta época, Benfica e Sporting já se tinham defrontado por duas vezes e a ficha de jogo ditou dois triunfos dos encarnados sem sofrer qualquer golo (5-0 na Supertaça e 0-2 no Estádio de Alvalade). Quem olhar somente para os resultados, pode pensar que houve domínio encarnado em ambas as partidas. Todavia, tal não foi o que se passou em campo. Houve mais equilíbrio do que o resultado transparece. Contudo, um 5-0 não deixa de ser um 5-0 e o bis do suplente (nesse encontro) Rafa no jogo da primeira volta não invalida que o saldo seja favorável ao Benfica e que não tenha sofrido qualquer golo.
Os onzes
No jogo de xadrez dos treinadores, três novidades do lado dos homens da casa. A principal foi dar conta de que Carlos Vinícius ficou no banco. O brasileiro até estava na corrida para ver quem se consagra como artilheiro-mor da liga portuguesa, mas Veríssimo optou pelo suíço Seferovic — que continua a exibir o novo visual, ostentando um tonalidade mais aloirada ao nível capilar. Na defesa, face à indisponibilidade de Nuno Tavares e de Grimaldo, houve necessidade de opção de recurso, acabando por Tomás Tavares ser chamado. Sem grande surpresa, porém, verificou-se que Julian Weigl regressou ao onze após cumprir castigo.
Assim, o Benfica alinhou com Vlachodimos, André Almeida, Ruben Dias e Jardel na defesa; Gabriel, Weigl, Pizzi e Cervi no meio campo, ao passo que Chiquinho e Severovic ficaram com as despesas do ataque.
Quanto ao Sporting, Ruben Amorim até pensou em alinhar com um onze mais ou menos esperado e sem grandes alterações ao que tem sido habitual nos últimos jogos, tendo em conta que Sporar e Jovane Cabral recuperaram (Geraldes e Tiago Tomás voltaram ao banco). Todavia, uma lesão durante o aquecimento do capitão Coates, atirou o uruguaio para fora do jogo. Luís Neto entrou para o seu lugar.
Assim, o Sporting alinhou com Luís Maximiano, Quaresma, Neto e Acuña na linha mais recuada; Stefan Ristovski, Wendel, Matheus Nunes e Nuno Mendes no meio campo; no ataque, Gonçalo Plata, Jovane Cabral e Sporar.
O jogo
Os leões entraram melhor, a pressionar alto e a dificultar a primeira fase de construção do Benfica. Nos primeiros seis, sete minutos, o Sporting esteve mandão e fez aquilo que fez durante quase todo o jogo: pressionou muito alto, quis recuperar a posse cedo e quis ter bola. No primeiro tempo, os leões eram quem tinha a iniciativa, ao passo que as águias estavam na expectativa para condicionar a sua ação a pressionar a zona de saída de bola.
O primeiro lance de perigo pertenceu aos encarnados (aos 10'), mas Max respondeu bem com os pés a um remate de Pizzi — que aos 18' fez um passe disparatado no corredor central que acabou nos pés de Plata; a jogada terminou com um remate frouxo de Sporar para as mãos de Vlochodimos, descaído sobre a esquerda, mas o lance podia ter resultado num dissabor bem agridoce para a sua equipa.
O Benfica não tinha a bola, mas provocou vários calafrios à defesa do Sporting. Fez mais remates (a sua maioria para fora), criou mais perigo e até teve lances em que podia ter ampliado a vantagem e podia ter ido para os balneários com uma vantagem mais dilatada. A equipa de Ruben Amorim ladeava a área do rival, mas só se verificou algum perigo nos primeiros dez minutos.
Até que houve canto, assistência e golo na Luz. Pizzi bateu largo, Ruben Dias ganhou nas alturas ao segundo poste e alguém se esqueceu de marcar Seferovic no primeiro — sozinho, embora em jogo, fez de cabeça o primeiro que fez avançar o placard. Aos 37', podia ter sido o 2-0, mas Ruben Dias mandou ao poste.
O central, diga-se, fez uma excelente exibição. Esteve quase sempre bem posicionado, esteve forte no capítulo da antecipação (foi dele a recuperação sobre Jovane que deu origem ao contra-ataque que acabou no canto em que o Benfica marcou) e dobrou várias vezes os laterais.
O segundo tempo começou como o primeiro acabou: com o Benfica acumular lances de perigo, mas sem conseguir capitalizar. Ainda não estavam disputados cinco minutos e as águas já tinham tido dois lances para aumentar a vantagem. Aos 50', Chiquinho deu para Pizzi no meio da área do Sporting, a bola pingou para Cervi, que bateu ao lado e a bola passou perto do poste. Antes, aos 47', Max defende um remate de pé esquerdo de Jardel, qual ponta de lança, na sequência de um livre batido por Pizzi na direita.
Depois, o jogo catapultou para aquele terreno que podia ser baptizado por um dos chavões futebolísticos mais batidos, mas que não deixam de ser certeiros: quem não marca, sofre. E não fosse Vlachodimos a parar o remate de Nuno Mendes — que num excelente rasgo individual combinou com Sporar e foi até à área contrária — podia ter havido golo na Luz. Este lance foi um aviso que ia resultar em algo mais amiúde.
Nesta altura, o Braga tinha conseguido a reviravolta na Pedreira e estava a ganhar aos campeões nacionais, o FC Porto, por 2-1, já que Ricardo Horta e Fransérgio tinham colocado os bracarenses no 3º lugar. Estávamos sensivelmente a meio da segunda parte, altura em que o Sporting começou a assumir as rédeas do encontro e estava a dar uma boa resposta ao Benfica — que na altura de capitalizar as oportunidades criadas esteve sempre pesaroso.
Plata, muito apagado, a forçar demasiado jogadas de índole individual, saiu ao intervalo para dar lugar a Tiago Tomás. A entrada do jovem veio mexer com o jogo. Além de agitar o ataque, teve um lance em que mandou a bola ao poste e foi dele o passe para aquilo que já se estava a prever: o golo do empate. Nuno Mendes cresceu no jogo, assim como Matheus Mendes e Jovane, mas bastou um contra-ataque com três ou quatro passes para voltar ao 3º lugar.
Aos 65', um daqueles momentos que não é suposto acontecerem. Um dos jogadores mais experientes em campo falhou um alívio, a bola sobrou para um dos mais novos e a redondinha acabou no poste. Os atores: Jardel, ao falhar um alívio sem dó nem piedade — leia-se despejar a bola com toda a força dali para a fora para sacudir a pressão — e Tiago Tomás, que ficou impávido e pouco sereno com tamanha falha, acabando por rematar ao ferro.
O lance de Tiago Tomás ao poste deve ter deixado Jardel atordoado, pois houve demasiado espaço nas costas da defesa do Benfica no lance do golo (69') que deu o empate aos leões. A finalização do esloveno foi boa, mas o passe do jovem leonino foi primoroso. Ruben Dias ainda tentou fazer a dobra ao seu capitão, mas o mal já estava feito — e Sporar fez aquilo que Chiquinho não fez na primeira parte: não teve cerimónia na hora de rematar à baliza.
Pouco antes do golo do Sporting, Veríssimo tentou controlar o ascendente da equipa leonina e respondeu com a entrada de Florentino Luís para o lugar de Gabriel (amarelado) e Carlos Vinícius (para o lugar de Seferovic). Foi a necessidade do jogo que ditou a mudança — é que a sensivelmente 10/15 minutos do fim, o conjunto de Ruben Amorim estava a jogar com personalidade e, diga-se, estava a evidenciar capacidade para manter o Benfica resguardado no seu meio-campo.
O cenário mudou com a entrada de Rafa (76'). Hoje não marcou, mas não deixou de ser um elemento que a turma do Sporting vigiava com cuidado redobrado devido à sua velocidade numa altura do jogo em que a frescura física já não era a melhor.
Em jeito de resposta, Amorim colocou Borja (no lugar de Nuno Mendes) e Vietto (por Jovane, visivelmente com debilidades físicas) para refrescar as pernas da equipa e fazer um último assalto à baliza de Vlachodimos, mas era o Benfica que acabaria por cima — embora não estivesse a jogar um futebol brilhante, voltara a criar lances de perigo.
Já perto perto do fim, aquilo de que se vai falar sobre o jogo: o golo de Vinicius. O lance foi à Cidade do Futebol avaliar possível lance de fora de jogo, mas acabou por contar. Pizzi cruzou descaído sobre o lado direito, Vinícius estava em linha com um adversário e empurrou a bola com o pé esquerdo para o fundo da baliza. As imagens da BTV mostraram depois que uma bota, um pé e 34cm colocaram o Sporting fora do pódio e no 4º lugar.
Com este tento, o brasileiro somou 19 golos na I Liga e deve sagrar-se Bota de Prata. De acordo com o ZeroZero, apesar de ter os mesmos golos de Pizzi e Taremi, o avançado encarnado jogou apenas 1784 minutos, em comparação com os 2553 de Taremi e com os 2826 minutos de Pizzi.
Assim, feitas as contas, com este 2-1 final, o Benfica fechou o campeonato com 77 pontos (2º lugar) atrás do campeão FC Porto (82), e à frente de Sporting de Braga e Sporting, ambos com 60 pontos, mas com os ‘arsenalistas’ a assegurarem o último lugar do pódio e a entrada direta na fase de grupos da próxima edição da Liga Europa.
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