
Numa movimentada rua do centro de Lisboa, as janelas não permitem ver o interior, mas os sinais não passam despercebidos e a atividade do estabelecimento é evidente: “Compra d’ouro”. Ali, acorrem cada vez mais clientes vendedores e “maioritariamente mulheres na casa dos 40 anos”.
Em declarações à Lusa, a representante da Metalpro, Mariana Barão, conta que agora compra “mais ouro às pessoas” e quem vende “são maioritariamente as mulheres […] na casa dos 40 anos”, explicando que estas tendem a ter “mais joalharia” guardada, que procuram rentabilizar numa altura em que o preço do ouro está perto dos 3.000 dólares por onça.
Na mesma linha, o gerente da OuroAvalia, outra loja situada também em Lisboa, Ricardo Serra Dias, reitera que atualmente “a venda [de ouro à loja] é superior”, em valor, na ordem dos “95%” em relação à compra e relata que o número de clientes estrangeiros tem vindo a aumentar, o que significa que o “mercado está aberto”.
Serra Dias nota também que há uma transição cultural no que toca aos motivos pelos quais as pessoas compram ouro e afirma que “culturalmente as coisas estão a mudar muito”, considerando que apenas “um nicho de pessoas gostam da tradição e continuam a comprar ouro por motivos […] de valor”.
A Associação portuguesa da Indústria de Ourivesaria (APIO) disse à Lusa que o paradigma de consumo mudou e assiste-se hoje a uma tendência que privilegia a rotatividade e a variedade, em vez da valorização patrimonial.
Isto é, ao contrário do que acontecia há 25, 40 ou 50 anos, quando a compra de artefactos de ourivesaria era muitas vezes feita com a perspetiva de aquisição de valor, as novas gerações passaram a encarar estes produtos mais como peças de moda e ‘design’.
De acordo com a mesma associação, a procura de ouro em Portugal baixou 12% no ano de 2024, sendo que os dados do mês de janeiro apontam para subida homóloga de 7%.
Também a Associação de Ourivesaria e Relojoaria de Portugal (AORP) explica que, entre meados do século XIX e século XX, assistiu-se ao ‘reflorescimento da ourivesaria’ onde os novos burgueses, pequenos comerciantes e lavradores abastados passaram a investir em peças de ouro como reserva de valor, tendência que consoante os dados apresentados, tem divergido.
Atualmente, uma parte considerável do setor da ourivesaria nacional já tem planos de internacionalização, ou já são mesmo exportadores, pelo que não estão tão dependentes do consumo nacional.
Segundo a AORP, o aumento considerável do valor desta matéria-prima a que se tem assistido provoca constrangimentos aos fabricantes, nomeadamente nas suas margens.
O preço do ouro, um dos ativos de refúgio em tempos de incerteza, atingiu no dia 20 de fevereiro um novo máximo histórico de 2.950,02 dólares por onça, segundo dados da Bloomberg.
Os analistas da Banca March explicam que o ouro permanece nos seus níveis mais elevados devido à incerteza geopolítica global, num contexto de negociações de paz na Ucrânia e das novas tarifas anunciadas pelos EUA.
Comentários