Factos: A concessão de crédito ao consumo está novamente a disparar em Portugal.

 
Só em Julho, os bancos emprestaram 276 milhões de euros para efeitos de consumo, o valor mais alto desde Março de 2011, em níveis pré-troika.”Somando a concessão de crédito feita pelas financeiras e também os montantes disponibilizados através de cartões, descobertos autorizados e linhas de crédito, então este valor sobe para os 436 milhões de euros em Julho, ou 2,8 mil milhões de euros nos primeiros sete meses do ano, mais 22% face ao homólogo”, escreve o Económico.

Certamente que alguns verão nisto uma notícia sinalizadora da confiança. Os banco voltaram a emprestar dinheiro para gastos quotidianos – pode ser um carro, pode ser uma viagem, mas também pode ser simplesmente dinheiro para pagar outras dívidas em atraso. Da mesma forma que os bancos voltaram a emprestar dinheiro para comprar casa.

Factos: Os bancos tinham, no final de Julho, quase 5,4 mil milhões de euros em crédito de cobrança duvidosa das famílias, segundo dados do Banco de Portugal. É no crédito à habitação que o montante de malparado é mais elevado. No crédito ao consumo, o montante dado como de difícil recuperação é superior a 1,3 mil milhões de euros.

O tema que vale a pena discutir é que para as pessoas reais e empresas reais muito pouco mudou para não dizer que tudo está na mesma. Dir-se-á que é da natureza conservadora da banca não ter golpes de asa para investir em coisas novas ou de forma diferente. Dir-se-á que as manobras financeiras dos últimos anos fizeram muito pouca evidência dessa natureza conservadora – pelo contrário, antes fosse.

Há poucos dias, em conversa com dois empresários de PME ou startups, como prefiram, um de uma empresa de aquacultura e outro de uma empresa de plantas aromáticas, ouvi exactamente o mesmo relato. O périplo pela banca à procura de financiamento, as palmadas nas costas – bela ideia, bela ideia – e o cartão de visita para voltar ao banco uns anos depois, quando o balanço evidenciar que aquela bela ideia é mesmo um bom negócio. Ou seja, quando não precisar do dinheiro, ou pelo menos não precisar desse dinheiro como prova de vida. As duas empresas encontraram caminhos alternativos – uma com investimento que chegou de fora de Portugal, outra com investimento que saiu do bolso de outro empresário. É um final feliz, ou um princípio feliz, como se queira ver, mas em nenhuma destas histórias a banca se portou de forma diferente daquela a que nos habituou nestes já longos 30 anos.

Para fazer negócios passou a ser exigível prever o futuro, o que é particularmente curioso quando, retrospetivamente, verificamos que nunca se correram tantos riscos supostamente apoiados em análises de crédito à prova de bala e em ratings inquestionáveis. Para emprestar dinheiro às famílias – na habitação ou no consumo – não há muito que saber. Se tem casa e se tem ordenado, é executável, penhorável, descartável. E hoje, como antes, isso continua a ser uma decisão muito mais fácil do que contribuir para fazer crescer a economia real. A mesma economia que deverá criar riqueza real e postos de emprego reais.

Não consigo evitar lembrar-me, uma vez mais, da frase de Henry Ford: «Se as pessoas soubessem como funciona a banca, haveria uma revolução antes da manhã do dia seguinte.»

Mas como as verdadeiras revoluções demoram algum tempo, há que não perder de vista as alavancas da mudança. E uma delas é certamente perdermos o medo dos números. É esse o grande objectivo do novo projecto da Pordata que podemos ler no Público.
“Na escola, as crianças aprendem a ler, a escrever e a contar. E o que sabemos hoje é que as estatísticas são o abecedário do futuro. Quem não estiver na posse desse abecedário fica com muitas limitações em termos da compreensão da sociedade em que vive.”, explica Maria João Valente Rosa, directora da Pordata.

E já que falamos em perceber os números, e no rescaldo de um debate em que as palavras-chave foram ‘
prestações sociais não contributivas’, aqui fica um artigo da Renascença para nos ajudar a perceber do que estamos a falar.