Foi notícia que a melhor jogadora de futebol feminino do mundo, Marta, rejeitou todos os patrocínios até que lhe paguem o mesmo que a um homem. A minha pergunta é: que homem? Como se estabelece o termo de comparação?
Se for provado que a Marta gera 100 e só recebe 10 e que o Tomané, avançado do Tondela, gera os mesmos 100 e recebe 50, então sim, acho injusto e é preciso ver quem anda a meter ao bolso, aproveitando-se do facto de o futebol feminino ainda estar pouco profissionalizado. Agora, parece-me que não é isso que acontece, por isso vamos criar a igualdade como? Sendo que a Marta é a melhor jogadora, vamos comparar com o melhor jogador? Seria ridículo comparar o valor de Marta ao de Cristiano Ronaldo, já que o segundo, com 50 anos e apenas a jogar matraquilhos com uma mão, tem mais valor para uma marca do que a Marta. Porquê? Porque atrai mais público, gera mais interesse e tem uma base de seguidores que são influenciados pela sua imagem muito superior aos da melhor jogadora de futebol feminino. E porque é que o futebol feminino tem menos espectadores do que o masculino? Porque elas jogam pior do que eles. Defendem pior, atacam pior, rematam pior, fintam pior, correm menos e as guarda-redes parecem da selecção paraolímpica. Reparem, a maioria dos espectadores de futebol são homens: acham que se elas jogassem tão bem quanto eles, nós não preferiríamos ver mulheres a suar e a fazer marcação mulher-a-mulher? Claro que sim, mas as melhores jogadoras do mundo são pinos quando comparadas com os homens, mesmo com o Éder.
Comparar futebol feminino com futebol masculino é como comparar o jogo da malha ao bombardeamento cirúrgico feito por drones. Sim, a modalidade é a mesma, mas a maturidade de uma indústria é totalmente diferente da outra, isto para não falar no número de espectadores. Lamento, mas os patrocinadores olham para números e não para genitais e nem tem a ver com a qualidade, mas com o retorno. Por exemplo, a Ronda Rousey, ex-lutadora de MMA, chegou a ser mais bem paga do que todos os lutadores masculinos, isto num desporto ainda mais predominantemente marcado pelos homens. Porquê? “Porque eu trago mais receitas, não é porque sou mulher ou deixo de ser, se querem ser bem pagos, trabalhem e gerem mais dinheiro que os outros para os organizadores e patrocinadores”, isto parafraseando palavras da senhora Rousey.
A Marta tem todo o direito em não aceitar o patrocínio se acha que merece mais, atenção, e tem ainda mais direito em lutar pela igualdade entre homens e mulheres em várias áreas. Talvez não se tenha sabido expressar bem – porque é jogadora de futebol e as palavras às vezes fazem-lhes vírgulas e cabritos – mas o que é certo é que a Marta está desde 2018 sem patrocínios. Porquê? Porque acha que merece mais e porque não precisa do dinheiro, convenhamos. Pode não ganhar tanto com um jogador de futebol masculino de topo, mas é estimado que leve para casa cerca de meio milhão de euros ao ano e isso faz dela uma privilegiada. A Marta podia aceitar o patrocínio e doar o dinheiro a uma associação de violência doméstica contra mulheres, por exemplo, mas isto sou eu a ser pseudo-moralista.
Não deixa de ser curioso que esta polémica lhe esteja a dar mais visibilidade e que, por isso, tenha em breve um patrocinador que lhe pague melhor. Se calhar é apenas isso que está em causa, encapotado de luta pelos direitos das mulheres, nunca saberemos. Também é importante alertar, não digo que não, que existem ainda muitos países em que há uma desigualdade salarial entre homens e mulheres para a mesma posição e com qualidade equiparável. Existem países onde muitas profissões estão vedadas às mulheres, noutros em que a educação é exclusiva aos homens e, com ela, a possibilidade de ter um emprego que pague melhor. Por isso, não deixa de ser curioso que as pessoas se insurjam mais para apoiar a luta das elites privilegiadas que reivindicam mais dinheiro, do que quando é gente pobre a fazer greves por melhores condições de trabalho.
Este caso tem um paralelismo com o que acontece no mundo do cinema: todos sabemos que a Meryl Streep é muito melhor a interpretar papéis do que o The Rock, mas o que acontece é que o The Rock leva mais espectadores ao cinema e gera mais buzz. Não é a genitália que faz o CV, tal como o contrário também acontece em muitas áreas, seja na pornografia (neste caso é a genitália que influência), ou com a Cristina Ferreira que ganha mais do que o José Figueiras. Porque é mulher e a SIC é femista (sim, femista e não feminista)? Não, porque ela gera mais audiências. É simples e sinto-me burro por ter de explicar isto. Por essa mesma razão, o Neymar ganha 269 mais vezes do que a Marta. Porque possui um pénis? Não me parece, mas porque gera 269 vezes mais receita aos patrocinadores e organizadores. Por exemplo, o Neymar vendeu 120 mil camisolas em menos de um mês quando foi transferido para o PSG. Duvido que a Marta tenha vendido metade disso na carreira toda.
Isto muda muito facilmente, basta as pessoas começarem a encher os estádios nos jogos de futebol feminino e a ver as transmissões televisivas. Se todos os que acham que a Marta devia ganhar tanto como o Cristiano Ronaldo enchessem os estádios e comprassem a sua camisola, talvez ela ganhasse mais. Sim, deve apostar-se mais na promoção das modalidades femininas e incentivar as raparigas a fazer desporto e a não olhar para o futebol apenas como um desporto de homens, tal como se deve mostrar que as mulheres podem ser programadoras informáticas e não apenas enfermeiras e, depois, deixá-las escolher o que preferirem. No entanto, ao contrário destas áreas, o futebol, televisão e outras, o teu ordenado nem sempre é proporcional à tua qualidade técnica, mas sim à quantidade de espectadores que te querem ver. A Maria Leal também deve estar a ganhar melhor do que muitos músicos de jazz brilhantes, mas enquanto os concertos dela estiverem cheios e o Zé Tó, que toca Saxofone com os pés, tiver apenas dois seguidores nas redes sociais, assim irá continuar.
Já agora, a Marta benze-se sempre antes de entrar em campo, o que é irónico já que um dos grandes motivos das mulheres terem sido ao longo de toda a história, e ainda serem em alguns países, diminuídas perante os homens, é exactamente a religião. Quando ela for à Igreja, era bom que pedisse as mesmas regalias para as freiras que os padres têm. Que se insurgisse contra as posições da Igreja em temáticas como o aborto ou os contraceptivos, que são uma forma de reprimir as mulheres, mas, como tem acontecido muitas vezes com esta nova vaga de feminismo, o motivo é justo e a causa é nobre, mas a mira está desalinhada. Quase tanto como os remates no futebol feminino.
Sugestões e dicas de vida completamente imparciais:
Para ouvir: O podcast Hotel, de Luís Franco-Bastos
Para ver: O filme Us, de Jordan Peele.
Para ir: Miniférias em Barcelona no fim de semana de 20 de Julho e aproveitar para ver o meu espectáculo de stand-up comedy.
Comentários