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Escolher o nome de uma startup ou PME pode parecer um detalhe criativo, mas é mais do que isso. Um nome é a sua identidade no mercado. É aquilo que te distingue dos concorrentes e que, no limite, pode valer dinheiro, ou trazer dores de cabeça legais. O caso recente da OpenAI, dona do ChatGPT, mostra porquê: a empresa está a processar duas empresas portuguesas que usaram “GPT” nas suas marcas. Um conflito que podia ter sido evitado com um planeamento mais cuidado.

Para perceber como funciona o processo de registo de uma marca em Portugal e como o deve preparar desde o início, falámos com José Ricardo Aguilar, Head of Legal & PI no Instituto Pedro Nunes, uma das entidades mais ligadas ao ecossistema de inovação no país. A conversa resultou neste guia prático, pensado para fundadores e empreendedores.

O que ensina o caso da OpenAI?

O litígio entre a OpenAI e duas empresas portuguesas, uma de formação e outra do setor imobiliário, é um exemplo claro do que acontece quando não se pensa a fundo na identidade de uma marca. Para José Aguilar, há aqui uma primeira lição evidente: fugir ao óbvio.

“O erro básico que muitos empreendedores cometem é o de encostar-se a identidades já conhecidas no mercado. Julgam que com isso estão a ter uma vantagem, quando não estão”, explica. “Quanto mais criativo for no processo de escolher um nome, mais fácil será obter exclusividade” e há menos riscos de enfrentar alegações legais.

A tentação de se colar a termos populares pode parecer útil no arranque, mas cria vulnerabilidades. Se o nome for demasiado genérico ou próximo de uma marca já registada, pode ser alvo de uma reclamação, mesmo sem ter consciência disso.

Quando deve registar a marca?

A resposta do Head of Legal & PI do IPN não podia ser mais clara: “The sooner the better. Ou seja, logo que um nome seja atrativo e sexy, deve-se avançar com o registo”, diz José Aguilar.

Isto significa que não precisa sequer de ter a empresa constituída para registar a marca. Se já tem uma ideia sólida e um nome definido, o registo pode (e deve) ser feito desde logo. No Instituto Pedro Nunes, conta o responsável, já houve equipas que registaram marcas enquanto ainda estavam a trabalhar num plano de negócio.

Antes disso, há um passo fundamental: confirmar se o nome está disponível. Isso faz-se através de bases de dados abertas, como a TMview ou a do INPI, em que é possível, numa “questão de segundos, perceber se este sinal distintivo está registado e em que países, para que classes, produtos ou serviços e quem é que tem esses registos”. É um processo rápido, gratuito e que pode poupar muito dinheiro mais tarde, sublinha José Aguilar. Caso o nome já esteja registado, mudar nessa fase é fácil. O mesmo já não se pode dizer depois de ter gasto dinheiro em comunicação, site ou branding.

Como se regista uma marca?

O processo não é complexo, mas exige método. Primeiro, pense no que quer proteger: que produtos ou serviços vão estar associados ao seu nome? A lei divide as marcas em 45 classes diferentes. Por exemplo, o software como produto e o software como serviço costumam enquadrar-se nas classes 9 e 42.

Se estiver tudo disponível, é altura de submeter o pedido online no site do INPI. Aí, tem de indicar quem será o titular do direito, a lista de classes e se a marca é apenas nominativa (o nome) ou também gráfica (o logótipo).

O pedido é normalmente publicado duas a três semanas depois, e abre-se então um período de dois meses para que terceiros possam apresentar reclamações. Se ninguém o fizer e não houver motivos legais para recusa, a marca é concedida. Todo o processo demora, em média, três a quatro meses.

Quanto custa registar uma marca?

O custo depende do número de classes e do âmbito geográfico da proteção. Em Portugal, o registo custa 148,71 euros por uma classe e 37,69 euros por cada classe adicional. A concessão da marca implica um pagamento adicional de 12,57 euros. Na União Europeia, os valores sobem: 850 euros por uma classe, 50 euros pela segunda e 150 euros por cada uma das seguintes.

No entanto, existe um incentivo europeu destinado a PME que pode reduzir estes valores: após o pagamento inicial, cerca de 675 euros são reembolsados. Feitas as contas, o valor continua a ser mais elevado do que o registo nacional, mas garante proteção em todos os 27 Estados-membros.

O registo tem validade de 10 anos, mas é renovável indefinidamente. E aqui há um alerta importante: se se esquecer de renovar, a marca caduca. “Caducando a marca, pode haver alguém mal intencionado que perceba que a marca caducou e a regista em seu nome. E depois vem impedir o titular originário de a usar”, lembra José Aguilar.

Nacional ou europeu: o que vale mais a pena?

Se o seu negócio tem ambição global desde o início, o responsável do Instituto Pedro Nunes não tem dúvidas: comece logo com o registo europeu. “Se o negócio, havendo o incentivo, claro, não havendo não vou tão longe com a minha vida, mas sendo o negócio um negócio reconhecidamente born to be global [nascido para ser global], eu acho que faz todo sentido começar logo com uma marca internacional.

Além de proteger a marca em 27 países, este registo facilita o acesso a investimento. “Há um estudo recente do Instituto Europeu de Patentes que mostra que startups com registos de propriedade intelectual têm muito mais facilidade em atrair capital de risco”, diz José Aguilar.

Quais são os erros mais comuns?

Para além de não registar a marca a tempo, há outros erros frequentes. Um deles é ignorar a fase de pesquisa e avançar sem confirmar se o nome está livre. Outro é continuar a usar a marca depois de ela ter sido recusada, o que pode levar a acusações de contrafação.

Também é frequente as startups não acompanharem publicações de novos registos, o que as impede de reagir a tempo a potenciais infrações. E há ainda burlas: “Hoje em dia, com este advento da inteligência artificial, essas abordagens têm sido cada vez mais sofisticadas, ao ponto de já serem enviados documentos com o timbre, com o papel timbrado do INPI, assinados por pessoas reais, que correspondem a pessoas reais dos departamentos”, alerta José Aguilar.

A marca como ativo estratégico

Mais do que um requisito legal, o registo de marca é uma ferramenta de negócio. É uma proteção contra concorrentes, um fator de diferenciação e até um argumento para investidores. “Vamos imaginar que alguém criou uma oferta de serviço radicalmente nova. Uma nova proposta de valor, uma maneira de entregar vantagens a alguém através de uma app que nunca ninguém tinha feito. Dificilmente alguém consegue ter um exclusivo sobre esta ideia. As ideias não se protegem. Os conceitos não se protegem. Agora, no momento em que ele lança a app, se tiver a marca registada, quem quiser oferecer o mesmo serviço vai ter de usar um nome completamente diferente”, resume o responsável.

Num mercado em que a reputação pode ser construída e destruída num instante, ter o nome protegido é mais do que uma formalidade. É uma forma de garantir que o esforço de criar algo novo não se perde no meio da confusão. E que a sua startup ou PME tem espaço para crescer com segurança.

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