Uma festa filmada por telemóvel na prisão de Paços Ferreira foi, esta semana, motivo de discussão e levou inclusive a diretora do estabelecimento prisional à Assembleia da República. O facto é que a tecnologia não conhece os muros das prisões e, em alguns casos, até está a ser bem acolhida por quem as gere. É o caso das aplicações Pigeonly, InmateAid, e Flikshop, todas criadas por ex-reclusos, e que já têm milhões de utilizadores. O objetivo é permitir que presos e famílias possam manter contacto sem por em causa a segurança.
No caso específico dos Estados Unidos, um país com 2,3 milhões de pessoas nas prisões, a questão do preço a pagar para manter contacto com a família tem contornos específicos. Um primeiro que se relaciona com o acesso aos computadores da prisão para poder estar online: os computadores não são muitos e paga-se 0.05 dólares por minuto para estar online ( o valor/ hora pago aos presos pelos trabalhos que desempenham é de 0,08 dólares). Se a opção for usar o telefone, o preço é de 0.21 dólares por minuto nas longas distâncias, com apenas três operadoras a poderem disponibilizar esse serviço.
Três apps criadas desde 2015 - todas elas desenhadas por ex-reclusos - têm por objetivo dar alternativas. A InmateAid, por exemplo, é uma plataforma que permite às famílias estarem em contacto mediante um pagamento mensal de 8.95 dólares. Tem mais de um milhão de utilizadores.
As outras duas - Pigeonly e Flikshop - aproximam-se mais do conceito de Instagram para famílias e reclusos (o Flikshop promove-se mesmo assim) , permitindo a partilha de imagens - ainda que não imediata, já que tem de ser escrutinada através do serviço de email das prisões.
“Vi em primeira mão como é difícil e caro manter o contacto”
A app Pigeonly - pigeon, de pombo, numa alusão às comunicações por pombo correio - foi desenvolvida por Frederik Hutson em 2013 depois de ter estado cinco anos numa prisão federal por tráfico de droga. “Vi em primeira mão como é difícil e caro manter o contacto”, disse à Bloomberg. “Também vi o impacto que tinha nas pessoas que estavam presas. Quem tinha meios para manter o contacto com família, quando saía as coisas corriam bem; mas aqueles que não o podiam fazer, eu via-os a regressar”. Hoje a empresa que desenvolveu, a Pigeonly, emprega 20 pessoas, metade delas também ex-reclusos. Todos os dias a app envia 4000 emails com partilha de imagens entre familiares e quem está preso.
Scott Levine é o criador da InmateAid. Foi condenado por roubar informação numa companhia de gestão de dados e passou cinco anos na Miami Federal Correctional Institution. Soferu na pele a dificuldade de manter o contacto com os filhos e quando foi libertado começou a trabalhar na ideia de uma app que permitisse realizar chamadas a um preço mais baixo, independentemente da distância geográfica. Nasceu assim a InmateAid que significa hoje para as famílias que a utilizam uma redução de custos de comunicação de 750 para 50 dólares por mês.
Marcus Bullock teve a ideia da Flikshop por causa dos amigos que tinha deixado na cadeia. Aos 15 anos foi preso por carjacking e passou oito anos numa prisão de segurança máxima na Virginia. Todos os dias, enquanto lá esteve, a mãe tirava fotografias que depois lhe enviava. “Permitiu-me manter as ideias em ordem e ver o mundo através dos olhos dela, sabendo que ainda existia uma vida para mim depois da prisão”. Hoje com 37 anis gere uma aplicação que permite o envio de fotos e de mensagens por 99 cêntimos, um negócio que começou com ajuda da família mas que entretanto conquistou a atenção - e o financiamento - de celebridades como a estrela da NBA Baron Davis ou o cantor John Legend.
Do ponto de vista social, este tipo de soluções desempenha também um papel ao manter uma ligação dos presos com o mundo “cá fora”. Vários estudos demonstram que a reincidência de ex-reclusos desce significativamente quando é mantido o contacto com as famílias durante o tempo de prisão. Não é por acaso que advogados e ONGs ligadas à reabilitação de ex-reclusos também estão a usar estas app como forma de se manterem por perto.
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