Em “Emilia Pérez”, acques Audiard, realizador francês de 72 anos, conhecido por “O Profeta” ou “Dheepan - O Refúgio” (Palma de Ouro em 2015), mergulha no tema da transexualidade com delicadeza ao contar a história de um líder de cartel de droga que decide mudar de sexo.

“É surpreendente ver esta questão abordada por cineastas confirmados, muitas vezes ‘cis’ [cisgéneros, pessoas que se identificam com o género atribuído no nascimento], fora da esfera LGBT”, afirma Franck Finance-Madureira, presidente da Queer Palm em Cannes, dedicada a esta comunidade.

“Mas tem sido 'A' questão emergente do combate LGBT há uma década e já era hora de haver personagens transexuais protagonistas em filmes, como em ‘Emilia Pérez'”, acrescenta.

“A normalização dos personagens gays e lésbicas demorou 30 anos, mas com os personagens trans será muito mais rápida. O cinema tem mais capacidade de medir rapidamente o pulso da sociedade”, afirma.

"Há um reducionismo"

Em Cannes, o assunto é abordado em vários filmes, alguns em competição, como "Emilia Pérez", e outros em secções paralelas, como "Transmitzvah", do argentino Daniel Burman, em que Rubén, filho de família judia, quer celebrar o evento que marca a passagem para a idade adulta, o Bar Mitzvah, na sua versão feminina, o Bat Mitzvah.

Para o realizador argentino, é hora de virar a página. “É preciso visibilizar estas situações, mas não encapsulá-las", afirma. O cineasta garante que há “uma aposta excessiva na identidade de género como único pilar da identidade” e por vezes há até um “reducionismo”.

Neste sentido, o facto de o festival incluir vários filmes com esta temática é um gesto forte. Embora a maioria dos atores transexuais interpretem personagens LGBTQIAPN+, alguns recusam-se a continuar a aceitar papéis que os limitem a esta condição.

Hunter Schafer, atriz conhecida por “Euphoria” e que faz parte do elenco de “Tipos de Gentilezas”, que concorre à Palma de Ouro, declarou em abril que não iria aceitar mais papéis queer ou relacionados à sua transição.