TECTÓNICA DE PLACAS

Quando olhamos para um mapa, o nosso primeiro instinto passa por encontrar o nosso país ou a nossa cidade. Se estivermos com vontade de viajar, talvez paremos para traçar a distância entre a nossa casa e o próximo destino de férias. Mas, se nos afastarmos um pouco e começarmos a observar o traçado de cada continente, começamos a ver algumas semelhanças.

A mais óbvia é a forma como a costa da América do Sul parece encaixar perfeitamente com a costa africana. Como duas peças de um puzzle à escala continental.

Mais estranha esta coincidência fica quando descemos ao terreno e encontramos estruturas geológicas, como vales e montanhas, que parecem ter sido partidos ao meio pela separação destas duas massas continentais.

Para além disso, quando escavamos o solo, encontramos rochas e fósseis idênticos em ambas as margens dos continentes.

Atualmente, sabemos que isto acontece porque África e América do Sul fizeram parte de um supercontinente chamado Gondwana, juntamente com Madagáscar, com o subcontinente indiano, com a Austrália e com a Antártida.

Este supercontinente começou a separar‐se há cerca de 140 milhões de anos, num mundo ainda dominado por dinossauros. E, muito antes disso, a própria Gondwana tinha‐se já separado de outro supercontinente, conhecido por Pangeia que, para além da Gondwana, era composto também pelas massas continentais que um dia viríamos a chamar de Europa, Ásia e América do Norte.

Pedro Mexia junta-se ao É Desta Que Leio Isto no próximo encontro, marcado para dia 19 de outubro, pelas 21h00.

Poeta e crítico literário, escolheu para a conversa no clube de leitura o livro "A Terra Devastada", de T. S. Eliot.

Para se inscrever no encontro basta preencher o formulário que se encontra neste link. No dia do encontro receberá um e-mail com todas as instruções para se juntar à conversa.

Pedro Mexia, da poesia às traduções

Pedro Mexia nasceu em Lisboa, em 1972, e licenciou‑se em Direito pela Universidade Católica. Escreveu crítica literária e crónicas para os jornais Diário de Notícias e Público e também faz traduções; atualmente colabora com o semanário Expresso. Além disso, é um dos membros do "Programa Cujo Nome Estamos Legalmente Impedidos de Dizer" (SIC Notícias) e mantém, com Inês Meneses, o programa PBX. Foi subdiretor e diretor interino da Cinemateca.

T.S. Eliot e "A Terra Devastada"

A estreia de T. S. Eliot na poesia deu-se em 1915, na revista Poetry, de Chicago, onde saiu um dos seus mais famosos poemas, The Love Song of J. Alfred Prufrock. Este e outros poemas constituíram, em 1917, o seu primeiro livro

Em 1922 surgiu o poema The Waste Land — "A Terra Devastada", na tradução em português —, considerado um dos mais belos e mais importantes poemas do Modernismo.  O tema de The Waste Land é a decadência e fragmentação da cultura ocidental, concebida imaginativamente por analogia com o fim de um ciclo de fertilidade natural. O poema divide-se em cinco partes, que não obedecem a uma sequência lógica, e estende-se por 433 versos. A justaposição de símbolos, imagens, ritmos, citações e sequências temporais, contribuem para a dimensão épica do poema e reforçam a sua coerência artística.

O movimento dos continentes e das placas oceânicas é hoje conhecido por tectónica de placas. Um fenómeno que moldou a superfície da Terra desde há 3,4 mil milhões de anos e que continua ativo ainda hoje.

Catastrofismo vs. Uniformitarismo

Durante décadas, a comunidade científica estava dividida entre duas teorias, o catastrofismo e o uniformitarismo.

No início do século XIX, Georges Cuvier, um naturalista francês considerado por muitos como o pai da Paleontologia, propôs que ao longo da História a Terra tinha sofrido eventos catastróficos, na sua maioria inundações, que tinham provocado as alterações geológicas que podemos observar atualmente.

Esta teoria ficou conhecida como catastrofismo e propunha que estas catástrofes, ou revoluções, como dizia Cuvier, levavam à extinção de ecossistemas inteiros numa dada região do globo, e que esta seria depois repovoada por organismos oriundos de outra região.

Cuvier desenhou esta teoria como forma de justificar a ocorrência de fósseis de espécies marinhas em regiões afastadas da costa.

No entanto, o catastrofismo cedo encontrou oposição na comunidade científica através de um movimento conhecido por uniformitarismo.

O uniformitarismo é uma teoria que sugere que os acontecimentos geológicos do passado tiveram lugar devido a forças da natureza idênticas às que se observam na atualidade, e que estes resultam de processos lentos e graduais. Estes dois princípios são conhecidos como atualismo geológico e gradualismo, respetivamente.

Esta ideia foi inicialmente proposta em 1785 pelo geólogo e médico escocês James Hutton, que acreditava que através da observação dos processos geológicos atuais era possível estudar a evolução de diferentes estruturas geológicas.

Hutton deu como exemplo destes processos a forma como a erosão re‐ move sedimentos das rochas que depois são depositados por ação do vento e da água dos rios e dos mares para formar camadas de sedimentos que se acumulam na superfície da Terra.

Mas foi preciso esperar por 1830, quando Charles Lyell, um geólogo escocês, publicou os Princípios de Geologia, uma obra em três volumes que se inspirou nas ideias de James Hutton para explicar como os processos geológicos que ocorrem hoje em dia eram responsáveis por moldar a superfície do nosso planeta ao longo do tempo.

E assim, com base no trabalho de Hutton e Lyell, em 1832, William Whewell, um cientista e filósofo britânico, deu a esta teoria o nome de uniformitarismo.

Aos poucos, o uniformitarismo começou a ganhar tração na comunidade científica, acabando por suplantar o catastrofismo no final do século XIX, em parte graças aos estudos de Charles Darwin e Russel Wallace sobre a evolução e a origem das espécies.

Estabelecida enfim a ideia de que a superfície do nosso planeta era moldada por processos geológicos que ocorriam ao longo dos séculos, a comunidade científica virou‐se então para o mistério que envolvia a forma dos continentes e as semelhanças entre zonas costeiras separadas por milhares de quilómetros de oceano.

Deriva Continental

Para resolver esta questão, o meteorologista alemão Alfred Wegener propôs em 1912 uma ideia que viria a ser conhecida como a deriva continental.

Esta teoria foi publicada no livro A Origem dos Continentes e dos Oceanos e sugeria que os continentes tinham em tempos feito parte de uma grande massa continental conhecida como Pangeia, um termo derivado da palavra grega «pangaia» que significa «toda a Terra».

Wegener propôs que os continentes como hoje os conhecemos se separaram através de um processo similar à formação de um icebergue que, após se separar de um glaciar, flutua à deriva pelo oceano.

Estes «icebergues» continentais teriam então lentamente «flutuado» ao longo da crosta terrestre até atingirem a forma que hoje conhecemos. Um processo ao qual Wegener deu o nome de deriva continental.

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Autor: Adriano Cerqueira

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Esta teoria foi apoiada pelo facto de as costas de África e da América do Sul parecerem encaixar entre si e conterem formações rochosas ao longo da costa que aparentavam ter continuidade entre ambos os continentes.

A descoberta de fósseis de plantas e de animais como o Lystrosaurus, um antepassado dos mamíferos, não só em África e na América do Sul, mas também na Antártida, na Austrália e na Índia, ajudaram a suportar esta ideia.

O acumular destas evidências levou o geólogo sul‐africano Alex du Toit a publicar em 1937 uma obra que, apoiada no trabalho de Wegener, demonstrou como os continentes do hemisfério sul estiveram em tempos juntos numa grande massa continental conhecida por Gondwana.

Tal como o uniformitarismo, também a deriva continental de Wegener foi fortemente criticada na sua altura. Contudo, ao longo do século XX começaram a surgir evidências que apoiaram a sua hipótese e a fizeram ganhar maior popularidade.

Paleomagnetismo

Uma dessas evidências foi a descoberta de que rochas de diferentes idades tinham uma orientação diferente do seu campo magnético. Atualmente, sabe‐ mos que os polos magnéticos da Terra invertem de forma periódica ao longo do tempo através de um processo conhecido por inversão geomagnética.

Ou seja, ao fim de um período de tempo, o polo norte magnético pode inverter e passar para o polo sul. Se isto acontecesse hoje, ao usarmos uma bússola, esta apontaria para sul, em vez de apontar para norte.

A última vez que esta inversão de polaridade do campo magnético terrestre ocorreu foi há cerca de 780 mil anos.

Quando esta ocorre, a orientação dos polos magnéticos fica registada nas rochas que são formadas durante esse período. Isto significa que duas rochas com a mesma idade terão também a mesma orientação magnética.

Para além disso, a posição dos polos magnéticos também varia ao longo do tempo, e essas pequenas variações também podem ser encontradas no registo geológico.

Ou seja, duas rochas com a mesma idade terão a mesma orientação magnética, e esta ajudar‐nos‐á a identificar a posição relativa dos polos magnéticos na altura em que estas foram formadas.

O estudo da inversão magnética dos polos ao longo da História é conhecido como paleomagnetismo.

Partindo desta informação, quando encontramos rochas com a mesma idade em continentes diferentes, com a mesma orientação magnética, mas com posições relativas distintas, podemos concluir que os continentes estavam eles próprios numa posição diferente em relação ao polo norte magnético atual quando estas rochas foram formadas.

Na década de 1950, ao explorar o fundo do oceano, foi possível observar que esta variação ocorria também nas propriedades magnéticas da crosta oceânica.

Esta descoberta sugeriu que a crosta oceânica se estaria a expandir a partir de zonas de rifte como a crista média atlântica.

Esta ideia foi depois suportada por dados de atividade sísmica que apoiavam a teoria de que a crosta oceânica estaria a desaparecer sob o manto quando esta entrava em contacto com a crosta continental.

Todas estas evidências levaram à formação da teoria da tectónica de placas em meados da década de 1960.

Placas Tectónicas

Se cortarem uma cebola ao meio, podem ver que esta é feita por camadas que se diferenciam a partir de um núcleo central. E, tal como acontece com a cebola, também o nosso planeta está dividido em camadas.

A camada que vai desde a superfície até uma profundidade entre os 40 e os 70 quilómetros é conhecida por crosta. A crosta é constituída maioritariamente por rocha sólida e tem uma espessura que pode variar entre os 5 e os 70 quilómetros.

A parte mais fina da crosta terrestre pode ser encontrada na bacia oceânica. Esta é composta essencialmente por basalto, uma rocha vulcânica, e tem uma espessura que varia entre os 5 e os 10 quilómetros.

Por baixo da crosta está o manto. O manto é a camada mais espessa da estrutura terrestre, atingindo uma profundidade de 2900 quilómetros. Esta camada está, na verdade, dividida em duas, o manto superior e o manto inferior, separados por uma zona de transição.

O manto é composto por minerais de silicatos ricos em ferro e magnésio que, por ação da pressão e das temperaturas elevadas, adquire uma viscosidade que lhe confere propriedades próximas às de um líquido.

A viscosidade destas rochas faz com que elas se movam em correntes de convecção entre o limite do núcleo e a crosta. O material mais quente sobe enquanto o material mais frio se afunda.

O movimento destas correntes tem um papel fundamental na tectónica de placas, permitindo que estas se movam.

A seguir ao manto encontramos o núcleo. Este está dividido em duas regiões, o núcleo externo e o núcleo interno. O núcleo externo é uma camada líquida composta essencialmente por ferro e níquel e situa‐se entre os 2900 e os 5150 quilómetros de profundidade.

O núcleo interno está a 6371 quilómetros de profundidade e é onde, por fim, chegamos ao centro da Terra. Mas, em vez de uma praia paradisíaca com dinossauros e homens primitivos, o núcleo interno da Terra é na verdade uma camada sólida com 70% do tamanho da Lua composta por uma liga de ferro e níquel. Esta camada tem uma temperatura média próxima da da superfície do Sol, atingindo os 5430 °C.

De regresso à superfície, para explicar a tectónica de placas primeiro precisamos de compreender a natureza da litosfera e da astenosfera.

A litosfera é a camada sólida mais exterior do nosso planeta e é composta pela crosta e pela parte superior do manto, podendo atingir os 100 quilómetros de profundidade. Já a astenosfera é a zona superior do manto terrestre, localizada entre os 80 e os 200 quilómetros de profundidade.

É na litosfera que encontramos as placas tectónicas que assentam e interagem diretamente com a astenosfera.

Como a astenosfera é uma camada menos rígida que a litosfera, esta permite que as placas tectónicas se movimentem sobre si. Isto faz da astenosfera uma camada fundamental para a movimentação horizontal e vertical das placas tectónicas.

Como se lembram, este movimento é alimentado pelas correntes de convecção entre o manto e a crosta terreste.

Choque de Placas

Se pensarmos nestas placas como peças de um puzzle gigante que suporta os continentes e os oceanos, podemos encontrar nas margens de cada peça regiões caracterizadas por uma forte atividade sísmica e vulcânica, e pela for‐ mação de montanhas e de fossas oceânicas.

Estas regiões podem ser descritas como convergentes, divergentes ou transformantes, consoante o comportamento das mesmas.

Nos limites convergentes entre placas, a placa mais densa é movida para baixo da placa menos densa, num fenómeno conhecido por subducção. Isto acontece quando uma bacia oceânica colide com uma bacia continental. Como a placa oceânica é mais densa que a placa continental, a primeira é movida para baixo da segunda, formando uma fossa abissal.

Nos casos onde duas placas oceânicas convergem, estas dão origem a arcos vulcânicos, cadeias de montanhas ou de ilhas vulcânicas localizadas perto das margens dos continentes e que são formadas em zonas de subducção.

O maior arco vulcânico do nosso planeta é conhecido como o Anel de Fogo do Pacífico e prolonga‐se ao longo de toda a sua extensão, desde a Nova Zelândia ao Chile, passando pela Indonésia, pelo Japão e pelo Alasca.

Quando encontramos um limite convergente entre duas crostas continentais, a semelhança entre a densidade de ambas as placas torna difícil que uma placa mergulhe sob a outra.

Contudo, é possível que por vezes ocorra um fenómeno conhecido por obdução, quando uma placa é puxada para cima da outra. Em outros casos, a colisão entre duas placas continentais pode levar à formação de uma cadeia montanhosa como é o caso dos Himalaias, formados após o choque entre a placa indiana e a placa euroasiática.

Os limites divergentes são zonas onde nova crosta está a ser formada a partir do magma com origem no manto. Estas zonas dão origem a longas cordilheiras submarinas, como é o caso da crista média atlântica.

Nos limites transformantes, as placas deslizam uma pela outra, ao longo de uma falha transformante, sem que haja destruição nem criação de nova crosta. Estes limites são conhecidos por uma forte atividade sísmica.

Movida pelas correntes de convecção do manto, a tectónica de placas está em constante movimento, moldando os continentes e a superfície do oceano a uma velocidade de cem milímetros por ano.

Estes movimentos podem ser impercetíveis ao longo de uma vida humana, mas ao longo de milhões de anos são capazes de provocar alterações profundas na superfície do nosso planeta.