Localizado em 2016 pela Confederação – Coletivo de investigação teatral, um grupo fundado no Porto em 2010, o documentário, de 15 minutos, mostra a cidade de Vila Nova de Famalicão, através de filmagens que decorreram em 1968.
O filme será exibido pelas 19:00 de terça-feira, na Biblioteca Municipal Almeida Garrett, no Porto, antes da projeção de “Nasci com a Trovoada – Autobiografia Póstuma de um Cineasta”, um filme realizado por Leonor Areal “a partir de filmes e textos de Manuel Guimarães”, utilizando materiais de arquivo, de filmes, fotografias e artigos de jornal a cartas e diários para traçar um documentário “quase ficção” sobre o neorrealista, narrado pelo próprio cineasta.
A obra foi localizada na Escola Básica Dr. Francisco Sanches, em Braga, depois de um contacto do diretor, Jorge Amado. “Na altura da reformulação, o diretor liga-me a dizer que tinha pedido para reunir tudo o que era material de cinema numa sala”, contou à Lusa Miguel Ramos, um dos fundadores da Confederação.
No meio do material encontrado, que foi depositado no Arquivo Nacional de Imagens em Movimento (ANIM), estava uma fita “que dizia ‘Ulisseia Filmes’ e ‘Homenagem ao Dr. Nuno Simões’”.
“Achei estranho pelo formato, porque estava em 35mm, que não era projetado, só em salas de cinema, e não era uma reportagem, porque era muito grande para o ser”, comentou Miguel Ramos, que ao assistir percebeu tratar-se de “A Terra e o Homem”, o filme perdido de Manuel Guimarães, que o apontou “em duas anotações em listas biográficas”.
O próximo passo foi telefonar a Leonor Areal, que se encontrava na fase final da montagem de “Nasci com a Trovoada”, antes do depósito do filme e dos trabalhos de recuperação depois de um conjunto de “muitos fatores e muita gente a trabalhar junta” para um resultado positivo.
O restauro, levado a cabo no ANIM, foi financiado pela Câmara Municipal de Famalicão e foi outro resultado feliz do processo. “Explicámos que tínhamos a verba e íamos avançar, eles tinham um curso interno de recuperação em analógico e o filme foi por aí”, revelou Miguel Ramos.
A película, “em ótimo estado”, permite deixar a obra de Manuel Guimarães “completa”, com um filme que “tem muito interesse, primeiro para Famalicão, que já tinha um do Manoel de Oliveira (‘Famalicão’, de 1941), que é um pouco mais pitoresco, enquanto este é um pouco mais direto, mais cru”.
“Está muito bem filmado, é muito cru, porque o Guimarães é um neorrealista e quer ir para a rua e filmar aquelas pessoas em primeiro plano. É um documentário com tempo, a filmar a feira, e depois toca na tal homenagem ao Nuno Simões, um republicano que tem ainda hoje muita relevância”, comentou.
A homenagem, que segundo as informações recolhidas pelo coletivo ocorreu a 09 de abril de 1968, foi levada a cabo pelo município de Vila Nova de Famalicão, concedendo ao republicano (1894-1976) a insígnia de “Grande Oficialato da Ordem de Benemerência”.
É neste ponto que termina o documentário de Manuel Guimarães, até aqui considerado desaparecido, e que foi encomendado pela autarquia à Cultura Filmes, de Ricardo Malheiro.
O documentário enquadra-se mais nos filmes “mais institucionais” da filmografia do realizador, embora tenha já “um cunho altamente neorrealista”.
“Ele vai filmar para a rua, as pessoas, passa muito tempo na feira, interessa-lhe a paisagem, mas ele dedica muito tempo à feira, filmar as pessoas em primeiro plano, a vinda delas, o que é que se está a vender”, apontou.
A equipa por detrás da recuperação também encontrou o negativo do filme, que se encontra “em muito mau estado”, e está a preparar um texto sobre o filme, uma investigação apoiada pelas autarquias do Porto e de Braga, que será disponibilizado na Internet.
Nascido em 1915, em Albergaria-a-Velha, Manuel Guimarães destacou-se como cineasta neorrealista, tendo-se estreado com "O Desterrado – Vida e Obra de Soares dos Reis", em 1949, antes de realizar uma das suas obras mais conhecidas, a longa "Saltimbancos", em 1951.
Antes de morrer, em 1975, na cidade de Lisboa, o cineasta criou longas e curtas-metragens, entre ficção e documentário, como "O Crime da Aldeia Velha" (1964) ou "A Costureirinha da Sé" (1958), além de "Tráfego e Estiva", em 1968, que foi o primeiro filme português rodado em 70mm.
Desenvolveu ainda atividade como pintor e caricaturista, numa carreira na qual viu, em várias películas, a censura 'cortar' várias cenas, devido à crítica social patente, como "Nazaré", de 1952, que contava com argumento do escritor Alves Redol (1911-1969).
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