A 24 de dezembro de 1943 abria em Campo de Ourique a pastelaria Aloma. Em plena véspera de Natal, a casa com nome de personagem de filme - interpretada por Dorothy Lamour no filme "Aloma of the South Seas" - pretendia "deliciar a boca dos lisboetas".
Os anos foram passando e a pastelaria continuou com o mesmo propósito. Em 2009 chegou a vez de João Castanheira 'meter a mão na massa'. O atual gerente assumiu os comandos e quis levar a pastelaria longe. E conseguiu.
A 17 de abril de 2012, o pastel de nata da Aloma foi considerado "O Melhor Pastel de Nata do Mundo", distinção que se repetiu em 2013 e 2015. Mas o reconhecimento não ficou por aqui.
Em maio deste ano, aquando da visita a Fátima do Papa Francisco, como peregrino, para celebrar o Centenário das Aparições de Nossa Senhora aos pastorinhos, João Castanheira começou a colocar em prática o plano que lhe permitiria concretizar um sonho: o Papa Francisco tinha de provar os seus pastéis de nata.
Ao SAPO24, o gerente da Aloma explica como tudo se passou.
"Isto começou como uma brincadeira. Já tinha pensado há muito tempo que havia de conseguir dar pastéis de nata ao Papa. As pessoas diziam que era impossível, mas eu dizia sempre 'eu consigo'. Eu sou uma pessoa um bocado brincalhona mas muito determinada, por isso avancei. Quando foi o Centenário, consegui mesmo", começa por contar.
"Consegui o número de telemóvel do Cardeal Saraiva Martins, através do sobrinho dele, e quando dei por mim estava a falar para o Vaticano. Ele não me facilitou a vida, disse que era impossível passar todas as barreiras de segurança, devido aos problemas com o terrorismo. Então tentei através da Dra. Aura Miguel, que é minha cliente de Campo de Ourique. Falei com ela e propus-lhe essa missão. Também me disse a mesma coisa: 'Oh João, isto é impossível, isto não dá, é uma utopia!'. Mas eu só dizia que tentar não custa", refere entre risos.
Nunca deixando o pensamento positivo de lado, João continuou a pensar em como se faria a viagem dos pastéis de nata até ao Papa Francisco. "Um colaborador meu foi para Fátima de madrugada, de mota para conseguir passar o trânsito. Por sorte ele é da zona, por isso conhecia todos aqueles caminhos por estradas e terras, aqueles ziguezagues que é preciso dar. Então foi ter à casa onde estava alojada Sua Santidade", diz.
Chegado à porta, o que fazer? Conseguiria passar? "Correu tudo bem. Este meu colega era ex-militar e conseguiu passar logo a primeira barreira de segurança e esteve mesmo à porta da casa. Vieram logo buscar os pastéis. Só soube que tinham chegado ao Papa quando a Aura Miguel disse em direto na Rádio Renascença que os estava a entregar, dentro do avião".
Satisfeito pela missão cumprida, João Castanheira já não esperava que a situação pudesse melhorar. Mas aconteceu. "Recebi uma carta a semana passada, foi muito engraçado. É uma carta escrita pelo assessor do Papa, Monsenhor Paolo Borgia, que me foi dirigida e aos colaboradores da Aloma. A carta tem a data de 22 de agosto, mas só chegou agora", diz.
Orgulhoso, publicou a carta recebida na página de Facebook da pastelaria. "Pelos bons préstimos dos Serviços do Santuário de Fátima, fez chegar ao Santo Padre uma saborosa lembrança produzida nessa pastelaria, aparecendo o sentido do preito explicitado na carta (datada "13 de Maio de 2017") que a acompanhava: tornar mais doce a presença do Papa Francisco na Cova de Iria", lê-se.
"Nunca quis fazer disto uma publicidade. Acreditem ou não, cada um é como cada qual", refere o gerente. "Mas senti um orgulho enorme com tudo, claro. Fiquei muito contente, naquele dia fiquei mesmo a desfrutar de um acontecimento único, que foi receber uma carta vinda do Vaticano. A minha vida são negócios, mas estes momentos não o são. Nem consigo pôr por palavras. Deu-me um gozo tão grande que não consigo explicar".
Apesar das dificuldades, João chegou até ao Papa. "Eu não tive um único colaborador meu que dissesse que isto era possível. Mas eu só dizia 'acreditem, as coisas são possíveis!'. No lutar é que está o ganho, a sorte dá muito trabalho. E este é um trabalho de equipa. Eu só pedi a quem foi entregar para ir confiante: 'Vais e entregas. Sais daqui a pensar que sim, se não a mota ainda avaria, fica sem óleo ou gasolina'. E ele conseguiu! Conseguimos! Foi uma questão de fé e também muito pessoal. É teimosia, também. Quando mais me diziam que não conseguia, mais eu queria".
E qual é a razão do sucesso? "É acreditar. É isto que nos faz mexer. Se estivermos sempre satisfeitos não procuramos coisas novas, não tentamos alcançar nada de novo, quer seja profissional ou pessoal. E aqui é uma das questões: por mais difícil que pareça, também é o que tem mais sabor".
Agora, depois de entregar os pastéis de nata ao Papa Francisco, qual é o próximo passo? João ri e a resposta mostra o quão grande foi este feito. "Não é que eu não tenha mais objetivos, porque tenho muitos mais, mas não consigo pensar em ninguém mais importante. Não existe em Portugal ou no mundo alguém mais importante do que o Papa para receber os meus pastéis de nata, que justifique tanto esforço. Não sou particular admirador de ninguém. Por outro lado, os meus fãs mais incondicionais já os provam todos os dias, são os meus filhos", remata.
* Créditos fotografia: Facebook Pastelaria Aloma
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