A peça termina mesmo com um longo discurso de um membro do partido então no poder, que em 2020 tinha apenas um deputado mas que entretanto conseguiu chegar aos 117, alcançando maioria absoluta.
Um partido que fala numa nova República, numa nova Constituição e em mais de meio século de um país “governado por bandidos” e que, então no poder, critica “as minorias que não respeitam as maiorias”.
“É uma peça que nos coloca num contexto imaginário, ficcionado, para pensarmos sobre as nossas vidas e sobre o que poderá ser o futuro se não tivermos cuidado e não refletirmos e agirmos no presente”, referiu Tiago Rodrigues.
Para o encenador e diretor artístico do Teatro Nacional D. Maria II, trata-se de uma “abordagem muito clara à ameaça da ascensão de populismos de extrema-direita, de tendência fascista, para não lhe chamar efetivamente fascistas”.
A peça, sublinha, alerta para a premência de a sociedade se questionar sobre a forma como a democracia se pode relacionar “com essa ameaça que não é democrática, que é mesmo antidemocrática”.
Sobre o discurso final da peça, e questionado pelos jornalistas se foi escrito “à medida do Chega”, Tiago Rodrigues respondeu: “Escrevi um discurso para uma personagem que está nesta peça, um populista de extrema-direita que chegou ao poder. Não dou um nome ao movimento, o mais importante não é o nome do movimento, mas sim as ideias desse movimento”.
Trata-se, sublinhou, de um discurso para um conjunto de ideias “antidemocráticas” que “passaram a existir com uma presença esmagadora desde as últimas legislativas, independentemente do nome que as carrega”.
“E nós temos de dizer que essas ideias não são normais, não são aceitáveis”, disse ainda Tiago Rodrigues, sublinhando que a peça pretende “provocar um debate”.
Admitindo que o título da obra e o seu conteúdo são uma “provocação”, e que há o risco de alguns espectadores ficarem suscetibilizados ou perturbados, o encenador vinca que o objetivo “não é ofender”.
“Esperamos que não se ofendam, o nosso desejo é oferecer prazer, mas não apaziguar. No fundo, levamos a tragédia ao palco para não termos que a viver na vida”, disse ainda o vencedor do Prémio Pessoa 2019.
A peça estreia-se no sábado, no Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães, com nova apresentação marcada para domingo, estando já ambas as sessões esgotadas.
Segue depois para palcos da Suíça, França e Itália, em digressão, após o que regressa a Portugal, designadamente ao Porto.
Só em abril de 2021 é que será apresentada em Lisboa.
Com texto e encenação de Tiago Rodrigues, esta produção do Teatro Nacional D. Maria II conta com um corpo de oito atores portugueses — António Fonseca, Beatriz Maia, Isabel Abreu, Marco Mendonça, Pedro Gil, Romeu Costa, Rui M. Silva e Sara Barros Leitão.
A cenografia é de F. Ribeiro, os figurinos assinados por José António Tenente, o desenho de luz é de Nuno Meira e a sonoplastia está a cargo de Pedro Costa.
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