Capítulo 3

FAZER MENOS COISAS

O primeiro princípio da produtividade lenta

No final de outubro de 1811, um anúncio num jornal londrino promovia «um novo romance escrito por uma dama». O nome da autora não foi anunciado, mas num anúncio subsequente, publicado no mês seguinte, foi mais especificamente identificada como «Lady A». O livro era Sensibilidade e Bom Senso, e o pseudónimo era, claro, da autora Jane Austen, que fazia a sua estreia na publicação. Austen tinha passado mais de uma década a trabalhar numa coleção de manuscritos que estava agora, aparentemente ao mesmo tempo, a aperfeiçoar em versões finais impressionantes. Sensibilidade e Bom Senso deu início a uns admiráveis cinco anos de publicações, talvez inigualáveis na história da literatura moderna, em que Austen pouco depois também lançou Orgulho e Preconceito, Mansfield Park, e finalmente, em 1815, Emma. Dois anos depois, morreu, com apenas 41 anos.

Uma explicação popular para a produtividade de Austen é que dominava a arte de escrever em segredo, de escrevinhar prosa em rompantes entre as inúmeras obrigações perturbadoras do seu estatuto social. A fonte desta ideia foi o sobrinho de Austen, James, que em 1869, mais de 50 anos após a morte de Austen, publicou uma biografia vitoriana da tia que ajudou a expor as suas obras a um público mais vasto. No Capítulo 6 da biografia, James fornece a seguinte descrição memorável:

É surpreendente como ela conseguiu concretizar tudo isto, sendo que não tinha um escritório separado para trabalhar, a maior parte do trabalho deve ter sido feita na sala de estar, sujeita a todo o tipo de interrupções casuais. Era cautelosa para que os criados não suspeitassem da sua ocupação, nem visitas ou pessoas além do seu núcleo familiar. Escrevia em pequenas folhas de papel que conseguia guardar facilmente, ou tapar com um pedaço de papel borrão. Havia, entre a porta da frente e os gabinetes, uma porta basculante que rangia ao abrir; ela não quis arranjar este pequeno inconveniente, porque a avisava quando alguém vinha lá.

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Esta história da aspirante, mas frustrada, dama que exerce sub-repticiamente o seu ofício poderia ter saído diretamente de um dos romances de Austen. Como era de esperar, dada esta agradável simetria, o mito persistiu. É repetido em registos modernos, como o delicioso livro de 2013 de Mason Currey, Daily Rituals, assim como em tentativas mais antigas de explorar o mundo de Austen. «No entanto, Jane Austen alegrava-se por uma dobradiça ranger, para que pudesse esconder o seu manuscrito antes que alguém entrasse», repete Virginia Woolf em Um Quarto Só para Si, de 1929.

Esta história pode servir múltiplos propósitos. Woolf, por exemplo, usa-a como parte de um argumento sobre os papéis dos géneros e autonomia intelectual. Relatos menos sofisticados consagram-no como um sermão sobre como não desistir dos nossos sonhos. Mas quando nos concentramos no tema da produtividade, o retrato que James faz da tia torna-se subitamente inquietante. Parece promover um modelo de trabalho em que a obtenção de melhores resultados exige que se insira cada vez mais trabalho no seu horário. O obstáculo que se interpõe entre si e a sua própria Sensibilidade e Bom Senso, sugere, é a vontade de fazer mais. Austen usava os pequenos intervalos entre as intermináveis visitas sociais para escrever em pedaços de papel na sua sala de estar, por isso, porque não pode acordar às cinco da manhã ou fazer melhor uso da hora de almoço?

Uma observação mais de perto da vida de Austen, porém, rapidamente revela problemas nas histórias de escrita secreta que o sobrinho conta. As biografias modernas, que recorrem mais extensivamente a material de fonte primária, revelam que a verdadeira Jane Austen não era exemplo de uma árdua azáfama, mas, pelo contrário, um caso de estudo de algo bastante diferente: uma abordagem mais lenta da produtividade.

Jane Austen cresceu em Inglaterra no final do século XVIII, na aldeia rural de Steventon, em Hampshire, no que era basicamente uma pequena quinta. Havia vacas para ordenhar e aves para cuidar. A sua família cozia pão e fabricava a própria cerveja. No verão, as crianças recebiam ancinhos para o feno, compotas e geleias. No outono, ajudavam a fazer a colheita. Quando Austen ainda era uma rapariga jovem, o seu pai, o reitor da paróquia, transformou a casa paroquial onde viviam numa escola improvisada para rapazes, acrescentando à lista de tarefas diárias as exigências de cuidar e alimentar meia dúzia de rapazes em debandada.

Isto não quer dizer que a família Austen fosse estritamente da classe trabalhadora. Como Claire Tomalin explica na sua biografia, Jane Austen: A Life, de 1997, a família Austen habitava um mundo social de «pseudoaristocracia», constituído por «famílias que aspiravam a viver de acordo com os valores da aristocracia, sem possuir terras ou riqueza herdada de grande significado». Mas é evidente que Austen não cresceu como uma personagem de um dos seus livros, passando os seus dias numa sala de estar bem apetrechada, a receber visitas enquanto os criados preparavam refeições abundantes. Tinha trabalho a fazer. Embora Austen fosse uma leitora voraz e, encorajada pelo pai, tenha começado a escrever desde muito nova, estava demasiado ocupada com o trabalho diário da gestão da casa, da quinta e da escola da família para explorar seriamente o ofício.

Tudo isto mudou no verão de 1796, quando o pai de Austen decidiu encerrar a escola para rapazes que funcionava em sua casa. «[Isto levou à] facilitação de todo o trabalho envolvido no planeamento e preparação de refeições, na lavandaria, limpeza e feitura das camas», escreve Tomalin. E com as suas obrigações súbita e drasticamente reduzidas, Austen entrou num período de produtividade «fenomenal». A trabalhar numa secretária no andar de cima, a ler esboços do seu trabalho à família durante o serão, produziu versões prévias do que iriam acabar por ser três romances importantes. Como Tomalin salienta, foi a capacidade de Austen de «se abstrair da vida quotidiana à sua volta» que lhe permitiu encontrar a sua voz literária.

Em 1800, este período de responsabilidades muito reduzidas terminou abruptamente quando os pais de Austen decidiram, aparentemente do nada, fechar a casa em Steventon e mudar-se para a cidade turística de Bath. Durante a década seguinte, Austen esteve constantemente em movimento, em transição de uma nova casa para outra, a assumir mais tarefas enquanto cuidava do pai doente, que acabou por falecer. Roubada da possibilidade de estabelecer um «ritmo de trabalho», nas palavras de Tomalin, Austen parou de escrever.

O mundo teria sido privado do brilhantismo de Austen se não fosse uma decisão fatídica tomada em 1809, que fez com que as condições de produtividade voltassem dramaticamente a ser favoráveis a Austen. Exausta da tumultuada década anterior, Austen, juntamente com a mãe, a irmã Cassandra e a amiga da família Martha Lloyd instalaram-se num chalé modesto, situado no cruzamento da pacata cidade de Chawton. O chalé fazia parte de uma grande quinta, propriedade do irmão de Austen, Edward, herdeiro das terras de parentes distantes da família Austen que nunca tiveram filhos e que anos antes tinham nomeado Edward como herdeiro legal.

De forma crítica para a obra de Austen, a sua família, desgastada pelas complicações e provações dos anos anteriores, abraçou uma pausa muito necessária ao decidir ausentar-se em grande parte da cena social em Chawton. Esta não foi uma decisão tomada de ânimo leve. O facto de o irmão de Austen ser praticamente o dono da cidade e de viver numa propriedade impressionante apenas a algumas centenas de metros significava que as oportunidades para uma presença social ativa eram certamente abundantes. Mas o círculo de Austen não estava interessado. «Não havia bailes e só alguns jantares», escreve Tomalin, «e permaneciam em grande parte fechadas nas suas atividades privadas».

A mãe de Austen, agora na casa dos 70, trabalhava no jardim do chalé, vestida como os trabalhadores, para a diversão dos outros reside tes da cidade. Igualmente importante foi o acordo tácito que libertava a filha mais jovem da família Austen da maior parte do restante trabalho doméstico. Preparava o pequeno-almoço de manhã para a família, mas, fora esta tarefa, estava livre para escrever. «Desta forma, tinha o privilégio de ser isentada da maioria das tarefas domésticas, quando Cass e Martha estavam em casa», explica Tomalin.

Escondida do mundo no chalé de Chawton, de repente, quase por milagre livre da maioria das responsabilidades tanto domésticas como sociais, Austen, pela primeira vez numa década, tinha conseguido espaço real e significativo para pensar e trabalhar com criatividade. É aqui, a trabalhar numa modesta escrivaninha à janela com vista para a estrada, que finalmente termina os manuscritos de Sensibilidade e Bom Senso e Orgulho e Preconceito, antes de passar a escrever Mansfield Park e Emma.

O sobrinho de Austen pode ter popularizado a história de uma Austen com uma agenda excessiva, impecável e organizada na sua sala de estar, a trabalhar em rajadas frenéticas entre distrações incessantes, mas a realidade dos seus notáveis anos em Chawton é claramente muito diferente.* Longe de enaltecer uma ocupação secreta e disciplinada, a história de Austen, quando contada corretamente, parece promover o oposto desta abordagem. Austen não foi capaz de produzir criativamente durante os períodos mais movimentados da sua vida. Foi apenas quando, por circunstâncias e artifícios, as suas obrigações foram bastante reduzidas que Austen conseguiu, finalmente, concluir o seu melhor trabalho.

Esta lição — fazer menos pode permitir melhores resultados — desafia o nosso preconceito contemporâneo no sentido da atividade, baseado na crença de que fazer mais mantém as nossas opções em aberto e gera mais oportunidades de recompensa. Mas relembrem que a Jane Austen ocupada não era nem feliz nem produzia trabalho memorável, enquanto a Jane Austen desafogada, a escrever contente no chalé de Chawton, transformou a literatura inglesa.

Livro: "Produtividade Lenta"

Autor: Cal Newport

Editora: Actual

Data de Lançamento: 24 de outubro de 2024

Preço: € 19,90

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De facto, a simplificação é tão importante para a nossa filosofia emergente que vou consagrá-la aqui como o primeiro princípio oficial da produtividade lenta:

PRINCÍPIO 1: FAZER MENOS COISAS

Esforcem-se por reduzir as vossas obrigações até ao ponto em que possam facilmente imaginar-se a cumpri-las com tempo de sobra. Aproveitem esta carga reduzida para abraçar e avançar mais plenamente o pequeno número de projetos que mais importam.

O pedido aqui feito, claro, é mais fácil de explicar do que de implementar. No contexto da vossa vida profissional, é provável que a azáfama pareça inevitável. Os clientes exigem atenção, e os gestores têm pedidos infinitos. Mesmo que sejam solopreneurs com o controlo total dos vossos dias, a necessidade de rendimento pode prejudicar a vossa intenção de reduzir a carga de trabalho. As longas sessões de escrita de Jane Austen na sua secretária no chalé de Chawton podem parecer uma miragem fantástica para o trabalhador do conhecimento que enfrenta uma caixa de e-mails infinitamente cheia.

O meu objetivo neste capítulo é persuadir-vos a não desistirem desta visão aspiracional de simplicidade projetada. É possível na maioria dos ambientes de trabalho modernos, se estivermos dispostos a ser criativos — e talvez, por vezes, até radicais — na forma como pensamos sobre a seleção e organização do nosso trabalho. Nas páginas que se seguem, vou explicar-vos ao pormenor porque é que um compromisso com a simplicidade pode ser tão benéfico (e exequível) no trabalho moderno do conhecimento como foi para a escrita de ficção da era vitoriana de Austen e depois detalhar algumas técnicas concretas para implementar este primeiro princípio de produtividade lenta.

Do chalé de Chawton para o cubículo; ou, porque é que os trabalhadores do conhecimento devem fazer menos coisas

Na primavera de 2021, um gestor de programas da HSBC chamado Jonathan Frostick, a trabalhar remotamente do seu escritório de casa, sofreu um ataque cardíaco. Sabemos disto, porque, subsequentemente, publicou no LinkedIn uma fotografia sua na cama do hospital, anotada com uma lista de seis resoluções sobre como mudaria a sua vida se sobrevivesse. A publicação tornou-se viral, gerou perto de 300 mil comentários e foi assunto na imprensa internacional.

O incidente de Frostick chamou-me a atenção devido ao que escolheu como a primeira resolução entre as seis elencadas: «Vou deixar de passar o dia inteiro no Zoom.» Como Frostick mais tarde explicou numa entrevista à Bloomberg, durante o primeiro ano da pandemia, dedicou cada vez mais tempo às chamadas de vídeo. Consequentemente, os seus dias de trabalho começaram a alargar-se. «Quando antes terminava mais ou menos entre as cinco e as seis e meia, dava comigo numa sexta-feira às oito da noite exausto, a pensar que tinha de preparar algo para segunda-feira e que não teria tempo», disse ele. «Na altura, comecei a trabalhar aos fins de semana.» Frostick não era o único a sentir-se assoberbado pela sua agenda neste período. Um relatório de tendências de trabalho publicado pela Microsoft revelou que o tempo passado em reuniões aumentou 2,5 vezes durante o primeiro ano da pandemia, enquanto a quantidade de chats de mensagens instantâneas e e-mails recebidos também explodiu. Como resume o relatório, «a intensidade digital dos dias dos trabalhadores aumentou substancialmente».

A maioria dos trabalhadores do conhecimento, claro, não precisa de estatísticas para se convencer de uma tendência que experimentou diretamente. À medida que 2020 dava lugar a 2021, comecei a ouvir regularmente os leitores a queixarem-se de que perdiam mais ou menos todo o dia em reuniões virtuais consecutivas, com quase todos os momentos de inatividade entre elas preenchidos com conversas hiperativas no Slack. Os relatos tornaram-se tão terríveis que comecei a referir-me a este período como o «Apocalipse do Zoom». Não é de estranhar que Jonathan Frostick tenha tido um ataque cardíaco e que a sua principal resolução quando recuperou tenha sido escapar a este inferno de videoconferências. A questão importante para nós, no entanto, é saber porque é que tudo isto aconteceu.

No trabalho do conhecimento, quando se aceita um novo compromisso, quer se trate de uma pequena tarefa ou de um grande projeto, isso acarreta uma certa quantidade suplementar administrativa contínua: por exemplo, as mensagens de correio eletrónico necessárias para recolher informações ou as reuniões agendadas para se sincronizar com os seus colaboradores. Este esforço geral é ativado assim que se assume uma nova responsabilidade. À medida que a sua lista de tarefas aumenta, aumenta também a quantidade de esforço geral que está a pagar. Uma vez que o número de horas do dia é fixo, estas tarefas administrativas irão retirar cada vez mais tempo ao seu trabalho principal, abrandando o ritmo a que os objetivos são alcançados.

Com cargas de trabalho moderadas, este efeito pode ser frustrante: uma sensação geral de que a conclusão do trabalho está a demorar mais tempo do que deveria. No entanto, à medida que o volume de trabalho aumenta, o esforço geral que investimos acabará por atingir um ponto de rutura, além do qual os esforços logísticos consumirão tanto do vosso horário que não conseguirão concluir as tarefas antigas com rapidez suficiente para cumprir as novas. Este ciclo de feedback pode rapidamente ficar fora de controlo, aumentando cada vez mais a nossa carga de trabalho até darmos por nós a perder o dia inteiro com atividades gerais: reunião após reunião, conduzida contra um zumbido de fundo de incessantes e-mails e conversas. Eventualmente, a única solução passa por empurrar o trabalho real para sessões ad hoc adicionadas após o expediente — à noite e de manhã cedo, ou durante o fim de semana — numa tentativa desesperada de evitar um colapso total de toda a produção útil. Estamos mais ocupados do que nunca e, no entanto, quase não conseguimos fazer nada.

É exatamente esta dinâmica que explica o Apocalipse do Zoom. Para entendermos o motivo, vamos analisar mais de perto o que mudou para os trabalhadores do conhecimento como Jonathan Frostick quando a pandemia chegou. Esta emergência de saúde afetou os diferentes sectores económicos de maneiras distintas. No trabalho do conhecimento, a disrupção óbvia foi a mudança para o teletrabalho, que criou uma torrente súbita de novas tarefas centradas a ajustar os nossos trabalhos a funcionarem fora do escritório. Como professor universitário, por exemplo, lembro-me de ter andado às voltas durante a primeira primavera da pandemia para descobrir como passar as minhas aulas para um formato online. Comprei um tablet de plástico barato e uma caneta eletrónica para poder desenhar num quadro branco virtual partilhado com os meus alunos através do Zoom, mas achei a tecnologia deficiente, pelo que acabei por experimentar várias aplicações baseadas no Apple Pencil, até encontrar algo que funcionasse. Também me vi obrigado a dominar finalmente o software de gestão de cursos Canvas para poder aceitar a entrega de trabalhos por via eletrónica. Isoladamente, estas novas tarefas não eram de uma dimensão avassaladora, mas chegaram de forma inesperada e acompanhadas de um sentido de urgência. Muitos outros trabalhadores do conhecimento tiveram uma experiência semelhante. A pandemia não os afogou em trabalho novo, mas pareceu inflacionar subitamente a quantidade de esforço geral necessário.

A mudança para o trabalho remoto também tornou a colaboração um pouco menos eficiente, aumentando o tempo necessário para satisfazer as exigências deste novo ónus. Se estivermos a trabalhar no mesmo edifício e eu tiver uma pergunta sobre um projeto, posso esperar que porta do seu gabinete se abra e passar lá para uma conversa improvisada de cinco minutos. Contrariamente, se estivermos a trabalhar a partir de casa, podemos, em vez disso, marcar uma reunião no Zoom, que, devido ao formato da maioria das agendas digitais, vai provavelmente exigir que ponha de lado pelo menos 30 minutos. «Quando trabalhamos remotamente, este tipo de coordenação ad hoc torna-se mais difícil de organizar», escrevi num artigo de 2020 sobre os custos do trabalho remoto, «e as decisões começam a arrastar-se».

O aumento tanto da quantidade como do custo do esforço geral foi modesto. (Precisei de aprender novas tecnologias para as minhas aulas da faculdade, mas não tive de, por exemplo, criar novas unidades curriculares do zero.) E, no entanto, este aumento modesto foi suficiente para levar muitos, como Jonathan Frostick, para lá do ponto crítico do esforço geral, o que os arrastou numa espiral de consumo de quantidades de logística geral que definiu os piores momentos do Apocalipse do Zoom. Esta observação é importante não só pelo que nos diz sobre o nosso trabalho durante a pandemia, mas também pelo que nos diz sobre o nosso trabalho mesmo antes destas disrupções. Quando a alteração para o trabalho remoto começou, na primavera de 2020, muitos trabalhadores do conhecimento já tinham ultrapassado o esforço geral investido no trabalho, a quantidade máxima possível de generalidades administrativas que ainda lhes permitia mais ou menos acompanhar. Tudo o que era preciso para desestabilizar as suas vidas profissionais era um empurrão final inesperado. À medida que as disrupções da pandemia foram suprimidas e escapámos ao Apocalipse do Zoom, muitos parecem ter regressado exatamente para o mesmo limiar perigoso, mal conseguindo terminar coisas suficientes e receando que mais uma exigência ou emergência os faça perder novamente o controlo.

Não é preciso ser um perito em operações para concluir que este jogo de confronto com o ponto crítico do esforço geral é uma forma louca de organizarmos as nossas vidas profissionais. Para tornar isto mais concreto, consideremos alguns números simples. Imaginemos que produzem relatórios que a vossa empresa vende. Mais, imaginemos que é necessário um esforço de sete horas para terminar um único relatório, e que cada relatório que se comprometeu a escrever gera uma hora por dia de esforço geral (e-mails, reuniões, espaço mental ocupado, e por aí adiante) até estar completo.** Nesta experiência de pensamento, se nos comprometermos com apenas um relatório de cada vez, dando-lhe toda a nossa atenção mental até que esteja concluído, antes de concordar em começar a trabalhar noutro, completaremos relatórios ao ritmo de um por dia (presumindo que trabalhamos oito horas por dia). Se, por outro lado, concordarmos trabalhar em quatro relatórios ao mesmo tempo, a sobrecarga combinada de manter todos os quatro na sua lista de tarefas consumirá metade do seu dia em trabalho logístico, duplicando efetivamente o tempo necessário para completar um único relatório. Neste exemplo, fazer menos coisas acaba por produzir mais resultados.

* Um paralelo interessante com o mito da produtividade da sala de Jane Austen encontra-se no exemplo de J. R. R. Tolkien. De acordo com o biógrafo de Tolkien, Raymond Edwards, alguns acreditavam que Tolkien escreveu as primeiras histórias para o seu Livro de Contos Perdidos, as primeiras incursões do autor nas mitologias que se desenvolveriam nas suas famosas fantasias, enquanto estava debaixo de fogo nas trincheiras infernais do batalhão da Primeira Guerra Mundial em que tinha sido destacado. Como Edwards refere, o próprio Tolkien mais tarde «apontou a mera inviabilidade de interligar trabalho literário naquelas condições», alegando que esta afirmação era uma «farsa». A realidade é que Tolkien não começou a escrever os seus Contos Perdidos até estar a convalescer da febre das trincheiras num hospital britânico, uma circunstância não muito diferente do chalé de Chawton de Austen, uma vez que subitamente lhe tinha sido concedido imenso tempo livre. Raymond Edwards, Tolkien (Ramsbury, Reino Unido: The Crowood Press, 2022, 96).

** Uma propriedade fundamental do esforço geral é que tem tendência a expandir-se para preencher o tempo que lhe é concedido. Enquanto um projeto for algo com que nos comprometemos e ainda não estiver concluído, terá tendência a gerar um esforço contínuo, sob a forma de reuniões de verificação, conversas improvisadas por e-mail e simples espaço mental.