Na ocasião, a então ministra da Cultura, Isabel Pires de Lima, afirmou que o Arquivo Sonoro Nacional (ASN) iria ser o depósito legal dos fonogramas, cumprindo a lei em vigor desde em 1982.
Qualificado pela etnomusicóloga Salwa Castelo-Branco como um projeto “importantíssimo para o país”, o ASN foi sendo adiado. Mas o Museu do Fado, em Lisboa, colocou mãos à obra e, em junho de 2016, começou a desenvolver o Arquivo Sonoro Digital no quadro do Plano de Salvaguarda, inerente à inscrição do Fado na Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade.
Na ocasião, a diretora do museu, Sara Pereira, disse que as gravações iam ser “devidamente tratadas e digitalizadas”, referindo-se a um acervo que se situa, cronologicamente, entre 1900 e 1950, sendo, “cerca de metade, de ainda antes da gravação elétrica, isto é anterior a 1927”.
Em setembro de 2006, o Governo, tendo em vista a instituição do ASN, nomeou uma comissão presidida por Dulce Helena de Brito, assessora do então secretário de Estado da Cultura, constituída também pelos etnomusicólogos Salwa Castelo-Branco e António Tilly dos Santos, pela ex-diretora do Museu da Música Maria Helena Trindade, por um representante do então Instituto Português de Museus, João António Herdade, e pelo adjunto da ministra Luís Machado.
Esta comissão tinha até 30 de novembro para apresentar um relatório sobre a criação de uma estrutura que incluísse o Museu da Música e o ASN, e da qual publicamente nada foi anunciado.
O ASN voltou a ser referenciado em janeiro de 2016, quando o atual Governo o incluiu nas Grandes Opções do Plano, o que foi visto como cumprimento de uma das promessas do programa eleitoral do PS, o único partido que prometeu criar o ASN e valorizar o arquivo da RTP.
Em novembro de 2016, o atual secretário de Estado da Cultura, Miguel Honrado, numa audição parlamentar, adiantou que havia conversações com o município de Lisboa para a integração do ASN no “Hub Criativo” da autarquia, localizado na zona oriental da cidade.
Todavia, em janeiro último, o ministro da Cultura, Luís Castro Mendes, anunciou, também no parlamento, que o ASN iria fazer parte do Museu Nacional da Música, e seria instalado num “polo, que [ainda] não está definido”, mas que não seria em Mafra, onde se prevê a instalação do museu.
Já em dezembro de 2014, para era claro para a tutela da Cultura que o arquivo sonoro deveria ficar sob a alçada do Museu da Música, mas instalado no Palácio Nacional de Mafra.
Na ocasião, em declarações à agência Lusa, o então diretor-geral do Património Cultural, Nuno Vassallo e Silva, disse que o Museu da Música incluiria “naturalmente, um arquivo sonoro”, e adiantou que, à data, eram "pertença do museu cerca de 15.000 fonogramas, em variadíssimos suportes”.
Estas declarações vinham na sequência do anúncio, pela então secretaria de Estado da Cultura, da criação de uma equipa de trabalho para preparar a criação do ASN, em janeiro de 2014.
Meses antes, em novembro de 2013, a Assembleia da República aprovara uma recomendação ao Governo PSD/CDS-PP para a "proteção dos documentos sonoros que façam parte do património cultural português, de forma a tornar-se mais acessível tanto a investigadores e entidades públicas ou privadas, como ao público em geral".
Parlamento debate criação de Arquivo Sonoro Nacional, prometido desde 2006
O parlamento debate, na sexta-feira, um projeto do PCP que propõe a criação de um Arquivo Sonoro Nacional, que começou a ser prometido por vários governos desde 2006 e nunca foi criado.
A bancada comunista é a única a apresentar um projeto de lei próprio, enquanto os restantes partidos (PSD, CDS, BE, PEV) optaram por projetos de resolução.
Ao arquivo compete “conservar toda a produção musical e registo fonográfico e radiofónico nacionais editados e difundidos em Portugal” e é tutelado pelo ministério que tiver a tutela da área da Cultura, de acordo com o texto do diploma.
O PCP recorda, no seu projeto, que o atual executivo “admitiu já que o Arquivo Sonoro Nacional seria uma das componentes de um dos polos do Museu Nacional da Música”, mas “falta concretizar”.
Portugal “é um dos poucos a nível europeu que não tem um arquivo sonoro nacional”, alegaram os comunistas, afirmando que ao Estado “também incumbe, no cumprimento dos seus desígnios constitucionais, preservar esta expressão cultural que é contida no som e na música”.
O PCP criticou “a forma como sucessivos governos têm encarado o património cultural”, caracterizada “pelo abandono, por concessões e privatizações, pelo subfinanciamento da conservação e salvaguarda, a ausência de fiscalização, depauperação de meios financeiros, materiais e humanos”.
O BE recomenda ao Governo, na sua resolução, que seja criado o Arquivo Sonoro Nacional até ao fim da legislatura (2019) e que o concurso público seja lançado no prazo de seis meses.
O Partido Ecologista “Os Verdes” sugere no seu texto a criação de um Arquivo Sonoro Nacional “com vista à compilação, armazenamento, preservação e divulgação do património sonoro, musical e fonográfico nacional”.
Já o projeto de resolução do PSD propõe ao Governo que tome medidas para a salvaguarda e projeção nacional do património sonoro, musical e radiofónico através da Direção Geral do Património Cultural, incluindo um levantamento sobre as opções em análise.
O CDS sugere ao executivo que seja feito um estudo para analisar as melhores opções para a “criação de um Arquivo Sonoro Nacional, com vista à compilação, armazenamento, preservação e divulgação do património sonoro, musical e fonográfico nacional”.
Arquivo Sonoro Nacional é "essencial"
A etnomusicóloga Salwa Castelo-Branco, ex-vice-reitora da Universidade Nova de Lisboa, qualificou de “essencial” a criação de um Arquivo Sonoro Nacional (ASN), para o qual Portugal tem "especialistas com experiência no trabalho técnico, de curadoria e de investigação”.
A investigadora, que fundou o Instituto de Etnomusicologia - Centro de Estudos em Música e Dança, faz parte de uma comissão conjunta para criação do ASN, que inclui os secretários de Estado da Ciência e Tecnologia, e o da Cultura, a par de outros investigadores como Pedro Félix, também da Universidade Nova de Lisboa.
Esta comissão inclui ainda o músico e compositor Miguel Azguime, o investigador Paulo Ferreira de Castro e o reitor da Universidade de Aveiro, Manuel António Assunção.
Salwa Castelo-Branco, em declarações à agência Lusa, afirmou que “a criação de uma infraestrutura, como o Arquivo Sonoro Nacional, é fundamental, e, em Portugal, já temos especialistas com experiência no trabalho técnico, de curadoria e de investigação, três componentes que são fundamentais”.
Já em novembro último, falando à Lusa, a ex-coordenadora do Departamento de Ciências Musicais da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova, lamentou que tivesse ficado em espera o projeto do arquivo sonoro, previsto desde 2006, por ser "uma infraestrutura que permitiria as condições tecnológicas para preservar e disponibilizar 'online' e presencialmente o património fonográfico de Portugal, e até, eventualmente lusófono”.
A investigadora, que preside o Conselho Internacional da Música Tradicional, órgão consultivo da UNESCO, que dirigiu a edição da "Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX", qualificou como “muito preocupante” ter ficado em suspenso este arquivo, depois de ter sido feito “muito trabalho” pelo Instituto de Etnomusicologia, em colaboração com o Museu do Fado, na digitalização e disponibilização do espólio que foi adquirido por Portugal ao colecionador inglês Bruce Bastin.
A diretora do Museu do Fado, em Lisboa, Sara Pereira, por seu lado, recordou à Lusa que o processo de digitalização das cerca de 3.000 gravações de fados da primeira metade do século XX, da coleção Bastin, se iniciou em junho de 2016.
Sara Pereira afirmou que os discos da coleção adquirida a Bruce Bastin se encontram “devidamente acondicionados” em depósito no Museu do Fado.
O Museu do Fado tem procedido à digitalização e restauro do acervo discográfico na sua posse, “promovendo a publicação ‘on-line’ do Arquivo Sonoro Digital, um dos compromissos estratégicos do Plano de Salvaguarda da Candidatura do Fado à Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade”.
Segundo a responsável “trata-se de um importantíssimo repositório de fonogramas históricos, desde o início do século XX, facultando o acesso gratuito e integral a vários milhares de gravações históricas, num projeto de continuidade, da parceria desenvolvida entre o Museu do Fado e o Instituto de Etnomusicologia da Universidade Nova de Lisboa.
Esta parceria científica contempla a “digitalização de diferentes tipos de suporte", como "discos de goma-laca a 78 rotações, discos de vinil (a 33 e 45 rotações), discos instantâneos (de acetato), discos não tipificados (a diferentes velocidades e de diferentes dimensões), suportes digitais, fita magnética, cassetes, entre outros”.
Prevê ainda o “estudo do som gravado e a investigação permanente em tecnologia e procedimentos no quadro da arquivística do som (metadata, processamento digital, transferência de suportes, migração, restauro, bases de dados)".
Um terceiro ponto desta parceria de investigação é a “edição de fonogramas com repertório histórico devidamente restaurados e masterizados”.
Em julho de 2016, etnomusicólogos, especialistas e responsáveis de arquivos de vários países de expressão portuguesa enfatizaram, num colóquio realizado em Aveiro, a importância de criar um arquivo sonoro lusófono.
Neste encontro científico estiveram presentes o diretor do Museu Nacional de Etnologia, Paulo Ferreira Costa, e Eduardo Leite, responsável pelo arquivo sonoro da RTP.
Em Lisboa, o Museu de Etnologia tem no seu espólio fonogramas de música tradicional, e o Museu Nacional do Teatro tem também um acervo sonoro.
O grupo RTP anunciou, em outubro de 2007, que estava a preparar um projeto que ia permitir o acesso livre dos cidadãos a parte do arquivo sonoro da RDP, com quase um século de história.
O projeto, intitulado Arquivo Criativo, apostava na colocação de uma amostra das mais de cem mil horas de fonogramas do espólio da RDP numa plataforma 'on-line', onde os utilizadores podem ter acesso direto e gratuito.
O depósito legal de fonogramas, por força do decreto-lei n.º 74/82, é assegurado pela Biblioteca Nacional de Portugal.
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