O primeiro-ministro António Costa, em entrevista à Rádio Renascença na manhã desta sexta-feira, 3 de abril, salientou que este não é o momento de "baixar a guarda, porque infelizmente vamos continuar a ter todos os dias mais pessoas infetadas e a falecer" até se chegar ao pico deste surto e a curva se inverter no sentido de haver menos casos a cada dia.
António Costa assinalou que o mundo passou ontem a marca de um milhão de infetados com o novo coronavírus — uma marca que apenas se conhecia na História ou na ficção, assinalando assim o enorme desafio que o país, e o mundo, enfrentam com a pandemia de Covid-19.
Questionado sobre uma inicial resistência sua a que fosse decretado o Estado de Emergência no início desta crise, António Costa explicou que tal se prendeu não com o facto de ser clara a necessidade de isolamento social para responder a esta pandemia, mas antes por dúvidas sobre se esta seria a medida mais adequada numa primeira fase.
"Isto tem de ser corrido como uma longuíssima maratona e não como uma estafeta", explicou o primeiro-ministro, salientando porém que o prolongamento do Estado de Emergência ontem decretado é "absolutamente imprescindível".
"Agora estamos na fase mais crítica, porque este é o mês de maior risco, uma vez que se vão avolumando os casos [de infeção], porque há também um cansaço que se vai acumulando, a dor que as pessoas sentem pelas medidas que foram adotadas começa a sentir-se e, além disso, é um momento que, pelos nossos hábitos, é de grande circulação e convívio", disse, referindo-se à Páscoa.
E tanto a circulação como o convívio são inimigos no combate à propagação do vírus, salientou António Costa.
O primeiro-ministro fez questão, todavia, de salientar que as medidas de restrição à circulação não são "um castigo", mas antes "um dever de recolhimento" para que as pessoas se possam proteger e proteger os outros.
4 de maio. A data limite para que alguma normalidade regresse ao ano letivo
Questionado sobre se tem uma estimativa de um regresso à normalidade no ensino, ou seja, às aulas presenciais, António Costa assumiu que — em particular para alguns graus de ensino, como o ensino secundário — existe uma data em mente, mas sem garantias: 4 de maio.
Explica o primeiro-ministro que se as aulas regressarem ao formato habitual até 4 de maio é possível garantir alguma normalidade ao ano letivo com recurso a ajustes no calendário, mas que para já não é possível assegurar que tal seja possível.
"Há uma coisa que nós sabemos, que a data limite para que o calendário escolar, designadamente do ensino secundário possa ser cumprido com a maior normalidade possível é o ensino presencial recomeçar a 4 de maio. Esse é o limite para que tudo possa decorrer de forma normal, possamos ter ainda uma época de exames até ao final de julho e deixar uma segunda época de exames para setembro de forma a não perturbar o ciclo normal de pausa letiva do mês de agosto".
A decisão, todavia, foi remetida para 9 de abril, depois de se ter uma reunião técnica no dia 7 e de ouvir os partidos no dia seguinte.
"O essencial para medir como estamos a evoluir não é o número absoluto de casos [confirmados de infeção], mas o aumento relativo, ou seja, a percentagem, [e a forma como ela evolui] de dia para dia. No início desta crise estávamos a crescer a 40% ao dia e nos últimos dias a 15%. Não podemos desarmar", reiterou.
Questionado sobre ajustamentos no acesso ao Ensino Superior, o primeiro-ministro referiu que o decreto presidencial que renova o estado de emergência até dia 17 de abril cria sobretudo um quadro geral para um conjunto de oportunidades.
"O critério que temos usado é o da máxima contenção com o mínimo de perturbação, e o que desejo é que não tenham que se alterar regras especificamente para este ano, sendo possível apenas ajustar calendários recuperando na medida possível este tempo - um tempo que não foi perdido, mas em que as escolas fizeram enorme esforço e os alunos também", respondeu.
"Temos de conseguir terminar este ano letivo da forma mais justa, equitativa e mais normalizada possível", frisou.
"O essencial é que a Europa não desista de si própria"
Questionado sobre as lições a tirar desta pandemia e sobre a solidariedade europeia necessária para a enfrentar, António Costa salientou que "o essencial é que a Europa não desista de si própria e não dê uma mensagem errada aos seus povos e ao mundo".
Fazendo referência à II Guerra Mundial, o primeiro-ministro disse que este é o maior desafio que o bloco europeu enfrenta deste então e que "o cerne está em saber se a Europa prova que é capaz enfrentá-lo em conjunto e de um modo solidário".
Se é com coronabonds, eurobonds, com emissão de dívida ou apoios diretos com base no Orçamento da União Europeia, Costa não se quis prender com o detalhe, já que "o fundamental é a UE ter em conjunto uma capacidade de resposta a um desafio é que comum".
O primeiro-ministro considerou ainda que a "maior lição" desta crise foi perceber "que as cadeias económicas não podem estar tão dependentes" de um só país, neste caso, da China.
"A Europa tem de perceber que vai ter de produzir interiormente aquilo que se habituou a importar da China", disse, aproveitando para salientar a reconversão de algumas empresas nacionais para a produção de equipamento de proteção individual — como batas e viseiras — e ventiladores.
A nível nacional, Costa destacou ainda o "consenso generalizado" da classe política em torno da resposta a esta crise sanitária.
"O conjunto dos partidos políticos tem sido exemplar na forma como tem sabido agir, sem prescindir do dever de crítica e fiscalização, mas agindo de forma solidária e unida", notou.
Costa diz que não haverá compensações extraordinárias a Parcerias Público Privadas
António Costa foi questionado sobre a razão pela qual se colocou agora no decreto de renovação do estado de emergência a possibilidade de os contratos de execução duradoura poderem ser temporariamente modificados, havendo também uma suspensão de pagamentos de rendas e outros rendimentos de capital.
O primeiro-ministro assumiu que esse princípio, entre outros objetivos, pretende travar eventuais pedidos de compensações por parte de PPP, sobretudo rodoviárias.
"Alguns contratos previam que pudesse haver compensações ou reequilíbrios contratuais em situações de estado de emergência - e, manifestamente, a mim, ao senhor Presidente da República e à também à Assembleia da República não pareceu que fosse um momento para que pudessem ser invocadas cláusulas dessa natureza", justificou.
De acordo com o primeiro-ministro, essas cláusulas sobre compensações a cargo do Estado "não foram seguramente pensadas para uma situação de estado de emergência causada por uma pandemia desta natureza, mas por fatores de disrupção política ou social, face às quais as empresas legitimamente pretendem proteger-se".
"Neste caso, obviamente, não é imputável qualquer responsabilidade a ninguém. Portanto, seguramente, não deve ser um fator de compensação ou de reequilíbrio contratual", sustentou o líder do executivo.
O novo coronavírus, responsável pela pandemia da Covid-19, já infetou mais de um milhão de pessoas em todo o mundo, das quais morreram mais de 53 mil.
Em Portugal registaram-se 209 mortes associadas à Covid-19 e 9.034 casos de infeção confirmados, segundo o balanço feito hoje pela Direção-Geral da Saúde.
Portugal iniciou às 00:00 de hoje a renovação do estado de emergência devido à pandemia de Covid-19 por mais 15 dias, até 17 de abril, abrangendo o período da Páscoa.
Costa “chocado” com suspeita de homicídio de cidadão ucraniano por funcionários do SEF
O primeiro-ministro manifestou-se hoje chocado com a suspeita de que três funcionários do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras são responsáveis pelo homicídio de um cidadão ucraniano no aeroporto de Lisboa, embora saliente a presunção da inocência.
"Claro que fiquei chocado só com a existência da acusação, mas todos gozam da presunção da inocência", afirmou António Costa em entrevista à Rádio Renascença, depois de confrontado com este caso em que três agentes foram detidos pela Polícia Judiciária (PJ), encontrando-se agora em prisão domiciliária.
Segundo o primeiro-ministro, em primeiro lugar, é preciso "aguardar que as autoridades judiciárias desenvolvam a investigação e procedam ao seu julgamento para o apuramento das responsabilidades".
"Se foi verdade é algo de imperdoável e chocante, porque quem exerce poderes de autoridade tem um especial dever de cuidado no exercício desses poderes", frisou o líder do executivo.
No interrogatório judicial, os três arguidos optaram por não prestar declarações sobre os factos que lhe são imputados, tendo-lhes sido aplicada a medida de coação de obrigação de permanência na residência, vulgo prisão domiciliária.
Em comunicado, a PJ referiu que os três homens, de 42,43 e 47 anos, "serão os presumíveis responsáveis da morte de um homem de nacionalidade ucraniana, de 40 anos, que tentara entrar, ilegalmente, por via aérea, em território nacional", no passado dia 10 de março.
O alegado crime terá sido cometido nas instalações do Centro de Instalação Temporária do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), no aeroporto de Lisboa, no passado dia 12 de março, após a vítima ter supostamente provocado alguns distúrbios no local, acrescenta a PJ.
O Governo também abriu um inquérito à Direção de Fronteiras de Lisboa do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras na sequência da detenção dos três elementos daquele serviço em funções no aeroporto por suspeitas de homicídio.
O ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, determinou também a abertura de processos disciplinares ao diretor e subdiretor de Fronteiras de Lisboa, cujas comissões de serviço foram cessadas, ao coordenador do Espaço Equiparado a Centro de Instalação Temporária (EECIT), bem como a todos os envolvidos nos factos relativos à morte de um cidadão estrangeiro naquelas instalações.
Na sequência deste caso, o diretor e o subdiretor da Direção de Fronteiras de Lisboa do Serviço de Estrangeiros e Fonteiras (SEF) foram demitidos na passada segunda-feira.
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