“O Estatuto, que se propôs responder à precariedade e insegurança dos profissionais da área da cultura com medidas capazes de mudar a realidade, não cumpre os seus objetivos. A proposta do Governo, tal como está, não responde aos problemas principais do setor: não estão previstos verdadeiros incentivos para a celebração de contratos de trabalho e não é assegurada uma proteção social eficaz que responda à intermitência dos rendimentos dos profissionais da cultura”, refere a AAVP, num comunicado hoje divulgado.

O Estatuto dos Profissionais da Cultura, aprovado em Conselho de Ministros em 22 de abril, e em consulta pública até hoje, está em elaboração desde meados de 2020, quando o Governo anunciou a criação de um grupo de trabalho interministerial, “para análise, atualização e adaptação dos regimes legais dos contratos de trabalho dos profissionais de espetáculos e respetivo regime de segurança social”.

O grupo de trabalho contou também com contribuições de diversas associações representativas da Cultura, entre as quais a fundação GDA - Gestão de Direitos dos Artistas, a Sociedade Portuguesa de Autores, o Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculos, do Audiovisual e dos Músicos (Cena-STE), a associação Plateia, a Performart, a Rede de estruturas para a dança contemporânea e a Associação Portuguesa de Realizadores (APR).

Para a AAVP, “são inglórios os progressos alcançados e os esforços efetuados depois de quase um ano de trabalho bilateral intenso no qual participaram diversas organizações com contributos e propostas” para o estatuto.

“O Governo que, no mês passado, avançou sozinho para o anúncio de uma proposta de Estatuto dos Profissionais da Cultura, regressou em meados de maio, depois de pressões, ao diálogo junto das organizações, admitindo rever alguns aspetos fortemente contestados, mas continuando a defender o essencial da sua proposta e das suas limitações”, relata.

Em 02 de junho, no Parlamento, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, reforçou a disponibilidade do Governo para fazer alterações ao estatuto.

“Estamos disponíveis para ajudar, alterar. Estamos todos muito a tempo de introduzir alterações. Temos em Portugal um momento histórico para aprovar um estatuto global para o setor da cultura. Trabalhemos em conjunto em vez de trabalhar para o espelho”, afirmou Graça Fonseca na altura.

A AAVP, considerando que “se alguns setores dos profissionais da Cultura têm condições para debater enquadramentos e medidas insuficientes”, lamenta que “o estatuto nunca tenha sido sensível aos problemas estruturais do setor das Artes Visuais”.

“E por isso o processo estava desde o início condenado a falhar. Neste momento não nos predispomos a enumerar as falências do diploma a discussão, já que os contributos têm vindo a ser dados junto do Ministério da Cultura, e sentimos ter sido iludidos por um processo ingrato”, afirma.

Além da AAVP, outras entidades do setor já manifestaram publicamente algumas reservas em relação ao estatuto aprovado.

Na terça-feira, no Parlamento, estruturas representativas da Cultura apontaram “problemas muito graves” no Estatuto dos Profissionais da Cultura, concluindo, de forma unânime, que "não serve" o setor.

A Associação Portuguesa de Realizadores, a Associação Portuguesa de Empresários e Artistas de Circo (APEAC), a Plateia - Associação de Profissionais das Artes Cénicas, a Associação de Estruturas para a Dança Contemporânea (Rede) e a Performart - Associação para as Artes Performativas em Portugal foram ouvidas em audição na Comissão de Cultura e Comunicação da Assembleia da República, durante a manhã, sobre o novo estatuto, na sequência de um requerimento do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE).

Na segunda-feira, em comunicado, a Ação Cooperativista considerou que o estatuto contém pressupostos imorais e que representam um recuo na situação laboral dos trabalhadores.

Na semana passada, o Cena-STE lamentou que o Governo queira “instituir por muitos anos a manutenção, naturalização e legalização da precariedade” na Cultura, enquanto a Plateia considerou que, “para cumprir os objetivos, o estatuto tem de responder à precariedade e insegurança de todas as pessoas que trabalham no setor, com medidas capazes de mudar a realidade atual”.

No final de maio, a APR defendeu igualmente que o estatuto, “tal como está, não responde aos problemas principais do setor: não estão previstos verdadeiros incentivos para a celebração de contratos de trabalho e não é assegurada uma proteção social eficaz e que responda à intermitência dos rendimentos dos profissionais da cultura”.

Também no final de maio, a SOS Arte PT, que representa artistas visuais, considera que o estatuto carece de maior abrangência operacional”.

Ao querer abarcar a totalidade dos profissionais da cultura, “não tem em conta, em diversos aspetos, as especificidades inerentes a cada um dos setores, nomeadamente, no que diz respeito aos profissionais das artes visuais”, referem em comunicado.