“Este não é o modo norte-americano”, disse à Lusa Tyler Massey, 46 anos, que compareceu ao protesto no vale de São Fernando, uma das zonas mais populosas de Los Angeles, com um cartaz onde se lia “No Kings” (‘sem reis’).

“Temos de exercer o nosso direito à liberdade de expressão e protestar contra a tirania”, afirmou o norte-americano, que se mostrou muito preocupado com a situação atual. “Fizemos uma revolução contra um rei e não vamos permitir que outro seja coroado”, garantiu.

Massey questionou os motivos por detrás das rusgas de imigração que abalaram a cidade na última semana. “Se fossem atrás de criminosos, eu apoiava. Mas estão a perseguir pessoas de família, trabalhadores, e isso causa mais mal que bem”, acrescentou

A presença da agência de imigração ICE (Immigration and Customs Enforcement) na cidade foi uma das principais motivações para as centenas de milhares de pessoas que saíram à rua em Los Angeles, mas muitos protestaram também contra a parada militar que decorreu em Washington, D.C. e coincidiu com o aniversário de Donald Trump.

O advogado Jonathan Starre levou um livro de lei constitucional para o protesto, uma forma de sublinhar que as leis do país não podem ser subvertidas pelo Presidente.

“Este é o fundamento dos nossos direitos e é o que está a ser abusado”, disse à Lusa. “Temos de defender a lei e mostrar que ela é necessária”, acrescentou.

Entre cartazes coloridos e palavras de ordem, os participantes deixaram claro que não querem um presidente com poder absoluto que se comporta como um rei. “Não é o meu führer” (título usado por Adolf Hitler), lia-se num cartaz. “Este protesto é legal”, dizia outro; “Nós o povo não servimos qualquer rei”, lia-se ainda mais à frente.

Na baixa de Los Angeles, onde os protestos da última semana se concentraram, a Guarda Nacional acompanhou as multidões maciças que gritaram e cantaram durante várias horas, empunhando cartazes e bandeiras dos Estados Unidos, do México e da Califórnia.

Os protestos foram pacíficos durante quase todo o dia, mas houve momentos de tensão com a polícia, que acabou por lançar gás lacrimogéneo e balas de borracha já a meio da tarde. Alguns manifestantes precisaram de assistência médica.

Em outras partes da cidade houve sobretudo indignação, sem confrontos. Foi o que viu o português Jose Da Veiga, que vive em Los Angeles desde 1997 e participou no protesto em Culver City.

“Tivemos uma manhã, que infelizmente é demasiado rara, em que estivemos rodeados em comunidade por todo o tipo de gente”, afirmou.

“Ainda estamos à espera da Guarda Nacional e dos Fuzileiros para nos salvar deste socialismo violento e devastador”, ironizou o arquiteto.

A ‘mayor’ de Los Angeles, Karen Bass, tinha apelado a que os participantes marchassem de forma pacífica e informou que estavam a ser tomadas “precauções extras” para prevenir distúrbios. Havia receios de que as grandes quantidades de pessoas previstas exacerbassem as tensões, mas a maioria dos protestos terminou sem problemas.

Para Mary Perloe, de 73 anos, o dia foi de protesto em família. “Vim pelo futuro do meu neto”, disse, apontando para uma criança de sete anos.

“Tenho receio de que não continuaremos a ter uma democracia, de que não possamos falar livremente, votar, estar em comunidade com outras pessoas”, afirmou a norte-americana, que se mostrou chocada pela mobilização da Guarda Nacional, contra a vontade do governador da Califórnia, Gavin Newsom.

“Os governadores devem poder mandar nos seus estados”, salientou. “Os republicanos sempre falaram de direitos dos estados e agora querem o poder federal”, lembrou.

Os protestos do “Dia Sem Rei” aconteceram por todo o país, reunindo centenas de milhares de pessoas de Filadélfia a Nova Iorque.