No inverno o destino era África. No outono, começavam a movimentar-se e passavam pelo Sahel (Mauritânia, Senegal, Gâmbia, Mali, Burkina Faso, Níger e Nigéria). Atualmente, quase tudo mudou, conta o El País.

Segundo um estudo da Sociedade Ornitológica Espanhola [SEO/Birdlife], 80% dos espécimes adultos de cegonha-branca de Espanha e da Europa Central diminuiu o percurso e não sai da Península Ibérica ou, no máximo, chega ao norte de Marrocos. Os únicos que mantêm a tradição intacta são os espécimes jovens, até que, quando atingem a maturidade — entre os quatro e os cinco anos —, aprendem que não vale a pena enfrentar os perigos de uma migração de milhares de quilómetros.

A organização centrou-se em mais de três milhões de locais onde as aves são encontradas nas épocas de reprodução, inverno e migração e equipou 79 cegonhas nativas de Espanha e da Europa Central (34 adultos e 45 jovens), desde 2012. Os dados recolhidos permitiram conhecer com precisão os movimentos migratórios, as áreas de invernada, a sobrevivência das diferentes faixas etárias e ainda o estudo da ecologia.

"As informações recolhidas mostram claramente uma mudança na estratégia de migração das cegonhas-brancas na Europa Ocidental", referiu a SEO/Birdlife. As mudanças de hábitos são justificadas por "um clima mais benigno e, acima de tudo, pela modificação que o homem fez no território com a criação de novos habitats".

Assim, os aterros tornaram-se nos locais favoritos das cegonhas para se alimentarem: encontram sempre comida, seja no verão ou no inverno. "Quase todas as capitais possuem aterros imensos que atraem e focalizam a população de cegonhas, que aproveitam toda a pequena fauna associada a estes lugares, além de comer restos do que encontram", explica Ana Bermejo, chefe de migrações da SEO/BirdLife . Os animais alimentam-se também nos arrozais, que agora ocupam "grandes áreas", aproveitando ainda algumas das espécies invasoras que ali encontram, como é o caso do caranguejo vermelho americano.

Se anteriormente as cegonhas na Península Ibérica percorriam uma média de 2.500 quilómetros nas suas migrações, agora chegam a voar apenas 200 — o que leva os especialistas a afirmar que as aves se tornaram mais sedentárias.

Esta diminuição de distâncias faz com que uma das grandes provações da viagem se torne inexistente: não existe passagem pelo estreito de Gibraltar, um lugar perigoso para esses pássaros de grande envergadura que precisam de correntes térmicas para se mover. "As cegonhas podem bater as asas por um tempo, mas isso torna-se complicado por causa do seu peso [uma média de 3,5 kg], pelo que chegam a cair no mar e morrer”, acrescenta Bermejo.

Por outro lado, as aves escapam também à aridez do deserto do Saara, onde não há comida nem pouso e as tempestades de areia são frequentes.