Tudo começou, a 11 de outubro, com uma visita da Polícia Judiciária à residência na Quinta Patiño, em Cascais, onde estavam guardadas as 124 obras que foram arrestadas a João Rendeiro, num processo em que foi condenado pelos crimes de fraude fiscal qualificada, abuso de confiança e branqueamento de capitais. Os inspetores pretendiam assegurar a integridade das obras, uma vez que havia uma forte suspeita de que alguns originais teriam substituídos por falsificações.
Na sequência da visita, não foram encontradas 15 obras que deviam estar na casa e à guarda de Maria de Jesus da Silva de Matos Rendeiro.
Perante estas informações, a fiel depositária e mulher do ex-banqueiro João Rendeiro foi interrogada sobre o desaparecimento e as suspeitas de falsificação de algumas das obras em questão.
Segundo informação revelada pelo advogado do Banco Privado Português (BPP), Miguel Coutinho, durante o interrogatório à fiel depositária da coleção de arte arrestada, João Rendeiro terá vendido oito quadros. Não haveria problema caso as obras não estivessem apreendidas e pertencessem ao Estado.
Na audiência de hoje, Maria de Jesus Rendeiro poucos esclarecimentos prestou à juíza. A advogada disse, na sessão, que a sua cliente não queria prestar declarações, até porque à margem deste processo deverá correr um processo-crime - no qual poderá ser acusada do crime de descaminho. A juíza insistiu que este processo não é crime e que Maria de Jesus Rendeiro não era arguida, sendo ouvida como fiel depositária das obras, mas a defesa insistiu que não deveriam ser prestadas declarações. A juíza ainda fez perguntas à mulher de Rendeiro, mas esta alegou não estar “em condições psicológicas de responder” a qualquer pergunta, mesmo confrontada com a venda (ilegal) de oito quadros.
A procuradora considerou que, por não prestar declarações, Maria de Jesus Rendeiro não cumpriu os seus deveres de fiel depositária e pediu que fosse sancionada com uma prestação pecuniária.
Segundo a defesa da massa insolvente do BPP, João Rendeiro vendeu as respetivas obras, entre outubro do ano passado e deste ano, por 1,3 milhões.
Uma das obras originais vendidas está até em exposição em Bruxelas. As pinturas fazem parte de um total de 124 obras de arte arrestadas há cerca de dez anos para o pagamento de indemnizações a eventuais lesados do BPP.
O advogado do BPP pediu o arresto do recheio da casa de Rendeiro e da mulher, assim como de outros bens e valores que lhes pertençam.
À saída do tribunal, o advogado disse que não queria prestar mais informações, referindo apenas que destes processos fica “clara a mensagem de que, de facto, o crime não compensa”.
Este é mais um capítulo da saga de João Rendeiro, condenado a três anos e seis meses de prisão efetiva, num processo por crimes de burla qualificada. No entanto, apesar de condenado, Rendeiro tinha passaporte e foi para o estrangeiro antes da execução da pena, comunicando, entretanto, que não tenciona regressar. O antigo presidente do Banco Privado Português estava apenas sujeito ao termo de identidade e residência, não se tendo considerado haver risco de fuga.
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