“Passar as competências que eram do governador civil, no caso concreto da Proteção Civil, para o comandante distrital de operações de socorro [CODIS] é que, eventualmente, não foi a melhor opção”, declarou à Lusa o presidente da Associação Portuguesa de Bombeiros Voluntários (APBV), Rui Silva.

No seu entender, a passagem das competências do governador civil para o comandante operacional distrital “acabou por ser um pouco artificial” e “carecia até de alguma atualização”, uma vez que o CODIS “não tem competências políticas, tem só competências operacionais”.

De acordo com Rui Silva, existe um défice na ligação entre o poder local, regional e central, porque com a extinção do governador civil desapareceu a figura ao nível político, que era “uma figura intermédia entra a administração local e a administração central”.

“Entendíamos e continuámos a entender que os governadores civis, em termos políticos, em cada distrito, seriam e eram imprescindíveis na estrutura e na organização da Proteção Civil”, afirmou à Lusa o presidente da Associação Nacional de Bombeiros Profissionais (ANBP), Fernando Curto, advogando que a ausência deste órgão da administração pública tem provocado “alguma desorganização” no âmbito de acionar meios e de organizar planos municipais e distritais de emergência.

Neste sentido, Fernando Curto considerou que os Governos Civis fazem “uma grande falta”, o que se tem refletido na prevenção e combate aos incêndios: “Este ano é a prova evidente”.

“O impacto é sempre grande, porque não havendo um decisor político intermédio entre a Câmara e o Governo é complicado. Quando há um incêndio onde estejam em causa mais que um município a situação política e a decisão é complicada, porque a decisão vem do Ministério da Administração Interna e do Governo”, declarou.

Na perspetiva de Fernando Curto, atualmente “há uma distância muito grande” entre o poder local e o poder central, já quando havia o governador civil “essa distância era minimizada e a decisão era muito mais célere, era muito mais pronta e contribuiria de certa absoluta” para melhorar a prevenção e o combate aos incêndios.

“Era importante rever e repor a figura do governador civil enquanto decisor político e enquanto responsável em cada distrito”, considerou o representante dos bombeiros profissionais.

Em declarações à Lusa, a ex-governadora civil de Faro e atual presidente da Câmara de Portimão, Isilda Gomes, afirmou que os Governos Civis fazem “imensa falta” para a coordenação política, sobretudo nas áreas da Segurança e da Proteção Civil.

A ausência dos governadores civis sente-se “ao longo de todo o ano”, referiu Isilda Gomes, explicando que “o trabalho na área da Segurança e da Proteção Civil é contínuo, não é só um trabalho de verão, é um trabalho que se faz ao longo do ano inteiro”.

“Oiço muitos comandantes referir-me, pessoalmente, que sentem essa ausência, alguns confidenciaram-me, inclusivamente, que se sentem de certo modo ‘órfãos’ […], porque viam no governador civil uma figura política de coordenação ativa e efetiva”, contou.

José Miguel Medeiros, antigo governador civil de Leiria e antigo secretário de Estado da Proteção Civil, disse à Lusa que foi “uma imprudência” a extinção dos Governos Civis, advogando que os territórios ficaram “sem interlocutores” para falar com o Governo central.

“Há todo um trabalho que deixou de ser feito e que não foi substituído por ninguém, portanto é natural que, em geral, todo o sistema estivesse mais frágil em todo o país”, indicou José Miguel Medeiros, referindo que o governador civil “era um patamar que fazia toda a diferença”, sobretudo na área dos incêndios, uma vez que tinham o poder de ativar os planos de emergência e de promover a mobilização e a articulação de recursos.

A extinção dos Governos Civis e a transferência das suas competências para outras entidades públicas foram aprovadas pelo Governo PSD/CDS-PP a 08 de setembro de 2011.