Em causa está um edifício que, no centro daquela cidade do distrito de Aveiro, foi inaugurado em 1944 no estilo arquitetónico do Estado Novo e esteve em funcionamento até aos anos 90, após o que entrou num processo de degradação que, em 2016, culminou na derrocada de parte da fachada principal.
Para evitar riscos de segurança, a Câmara tomou então posse administrativa do prédio e disponibilizou-se a adquiri-lo aos seus vários proprietários, o que se concretizou em 2018, quando o então presidente da autarquia, o social-democrata Salvador Malheiro, defendia a adaptação do imóvel a novas valências.
Pondo de parte que o prédio viesse a ser transformado em mais uma casa de espetáculos, o autarca anunciava nessa altura à Lusa: “Este é um dia simbólico porque o Cineteatro de Ovar é um dos edifícios mais carismáticos para a comunidade vareira, faz parte do legado do Município e, apesar do seu avançado estado de degradação, vai entrar numa nova fase”.
Agora que a câmara é liderada por Domingos Silva, que era vice-presidente de Salvador Malheiro por altura da aquisição, a autarquia defende que “o Cineteatro já se encontra demolido desde 2016” e confirma a intenção de derrubar o que resta do prédio para construção no local de uma futura “Praça Cineteatro”.
“Pode adiantar-se que o conceito passa pela requalificação do espaço, garantindo mais uma praça no centro da cidade de Ovar, com uma entrada privilegiada para o Parque Urbano e permitindo polivalência no uso do local, também para fins culturais”, informa fonte oficial da câmara.
O conceito definitivo ainda não está, contudo, acabado e o projeto encontra-se “numa fase inicial, pelo que não é possível apontar, com rigor, uma data para a intervenção”.
O membro da Assembleia Municipal de Ovar, eleito pelo CDS-PP mas entretanto desvinculou-se do partido, Fernando Camelo de Almeida, considera que "a possibilidade de a Câmara Municipal ter a intenção de demolir a fachada e o que resta do edifício do Cineteatro é inaceitável".
"Este executivo não tem qualquer legitimidade política para tomar uma decisão desta natureza sem, pelo menos, fazer uma consulta pública, pois não constava do programa eleitoral do PSD a demolição do imóvel”, acrescentando que o edifício pode ser reabilitado de forma a “ter uma utilidade que seja benéfica para a cidade, sem se destruir mais um elemento da sua memória coletiva”.
No mesmo sentido, este fim de semana apareceu nas redes sociais a petição “Demolição do Cineteatro de Ovar NÃO”, que contava esta manhã com mais de 160 assinaturas contra “a demolição total e definitiva do histórico edifício” e a consequente “perda irreversível de património edificado com um importante valor sentimental para muitas gerações de ovarenses”.
Os subscritores da petição reivindicam “a conservação e reabilitação do edificado existente, enquanto símbolo maior da identidade da cidade e do município de Ovar”.
Argumentam que “o que resta do saudoso Cineteatro de Ovar permanece esteticamente relevante, pelo seu princípio de funcionalidade, simplicidade, elegância intemporal e beleza singular, e deve ser protegido”, até porque, apesar do aspeto “pouco digno do edifício subsistente, não se pode resumir este imóvel a um mero conjunto de pedras e tijolos”, porque "a sua relevância reside na história riquíssima, nas memórias que guarda e nas histórias que ainda poderá contar”.
"Tal como outros municípios do nosso país têm compreendido o potencial de edifícios equiparados ao Cineteatro de Ovar, avançando com obras de reabilitação, revitalizando-os e adaptando-os a novos usos com assinalável sucesso, promovendo a regeneração urbana e a sustentabilidade, também este imóvel deve ser merecedor de uma segunda vida”, propõem.
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