O Congresso (câmara baixa) dos Estados Unidos aprovou as duas acusações apresentadas para a destituição do Presidente, Donald Trump, um processo que será agora julgado no Senado (câmara alta).

A maioria democrata aprovou a acusação de abuso de poder com 230 votos a favor e 197 votos contra, a que se seguiu a votação sobre a acusação de obstrução ao Congresso, aprovada por 229 votos a favor e 198 contra. A democrata Tulsi Gabbard, um dos nomes na corrida à nomeação pelo partido para as eleições do próximo ano, absteve-se em ambas as votações, tornando o seu voto num dos temas da sessão.

A congressista publicou um comunicado em que clarifica a sua posição e onde conclui que depois de ter lido as 658 páginas do processo contra Donald Trump não conseguiu "em boa consciência" votar sim ou não. Tulsi Gabbard termina a nota afirmando que o seu voto de abstenção é um voto pela muito necessária reconciliação e que espera que juntos [democratas e republicanos] possam sarar as feridas do país.

Na sessão, a líder democrata da Câmara de Representantes dos EUA, Nancy Pelosi, disse que Donald Trump é uma “ameaça constante” à “segurança nacional” dos EUA, durante o debate para votação dos artigos de destituição do Presidente. “Os atos irresponsáveis do Presidente tornaram necessário o seu ‘impeachment’. Ele não nos deixou outra escolha”, afirmou Nancy Pelosi, referindo-se à decisão dos democratas de levarem artigos de destituição para aprovação no plenário da Câmara de Representantes.

Segundo Pelosi, o Presidente agiu como uma “ameaça constante à segurança nacional e à integridade das eleições”, ao tentar pressionar um líder estrangeiro a investigar um rival político de Trump.

No final da votação, que considerou "histórica", Nancy Pelosi em conjunto com os líderes do comité responsável pelo processo fizeram uma declaração conjunta:

Enquanto se votava, Trump estava num comício

Durante o dia, Donald Trump voltou a declarar-se inocente no inquérito para destituição, que arrancou no início de outubro e à mesma hora que os congressistas votavam, Trump realizava um comício em Battle Creek, Michigan e comentou o caso: "não sinto verdadeiramente que esteja a ser destituído".

Antes, escreveu no Twitter: “Querem acreditar que eu vou ser hoje destituído pela esquerda radical, pelos democratas que nada fazem, quando eu não fiz nada errado!”

"Os democratas que nada fazem estão a declarar o seu profundo ódio e desdém pelo povo americano", disse Trump aos participantes no comício, considerando que se trata de "uma marcha de suicídio político para o Partido Democrata".

A assessora de imprensa do presidente americano, Stephanie Grisham, disse aos jornalistas que Trump está "confiante que o Senado irá restaurar a ordem, justiça e averiguações, tudo coisas que foram ignoradas nos procedimentos da Câmara dos Representantes". "Ele está preparado para os próximos passos e confiante que será totalmente ilibado", acrescentou.

Feliz "Impeachment"

Antes da votação desta quarta-feira [madrugada de quinta-feira em Portugal], Donald Trump escreveu mesmo uma carta à líder da Câmara de Representantes, Nancy Pelosi, denunciando o que considera ser uma “cruzada cruel” contra o Presidente, com puras motivações políticas de fragilizar a sua recandidatura em 2020.

“Quando as pessoas olharem para trás, quero que entendam e aprendam, para que nunca mais aconteça com outro Presidente”, escreveu Trump na carta enviada.

Mas o presidente fez mais que isso. A Casa Branca enviou a todos os senadores que serão potenciais júris do processo de impeachment no Senado, onde os Republicanos têm maioria, aquilo que poderia ser confundido como uma cortesia de Natal, mas que na realidade era uma cópia da carta enviada a Nancy Pelosi acompanhada de um cartão natalício.

"Isto é verdade: está um funcionário da Casa Branca no Senado a entregar em cada gabinete, como encomenda, a carta incoerente enviada a Pelosi e ... vejam só ... um cartão de Natal gigante de 16x12 da Casa Branca, acompanhado de um mais pequeno", escreveu no Twitter o senador Chris Murphy.

A líder democrata da Câmara de Representantes preferiu enviar uma mensagem para a sua bancada parlamentar pedindo para que vote unida na votação que hoje decorreu.

“Na América, ninguém está acima da lei”, escreveu Pelosi na missiva aos representantes, lembrando-os de que “os factos deixaram claro que o Presidente abusou do seu poder para benefício político e pessoal, para além de ter obstruído o Congresso”, referindo-se ao teor dos argumentos dos dois artigos de destituição que serão votados.

A frase (“Na América, ninguém está acima da lei”) foi inscrita nas camisolas de muitos apoiantes do processo de destituição que se manifestaram em várias cidades norte-americanas, desde Aspen, no Colorado, até Boston, no Massachusetts.

Com votação de hoje, Donald Trump torna-se assim no terceiro Presidente norte-americano a passar a fase seguinte do processo para ser destituído, depois de Andrew Johnson (1868) e de Bill Clinton (1998).

Nesse caso, o processo passará para o Senado, que se constituirá com um tribunal para o julgamento político de Donald Trump, de acordo com a Constituição.

Democratas e republicanos já estão em negociações sobre os termos do julgamento político, que analisará se o Presidente cometeu um crime passível de levar à demissão, o que nunca sucedeu na história dos EUA, já que Andrew Johnson e Bill Clinton foram absolvidos no Senado.

O julgamento será conduzido pelo juiz John Roberts, mas serão os senadores quem servirá de juízes, perante os advogados nomeados pelo Presidente. Se houver uma maioria de 2/3 de votos favoráveis no Senado, Donald Trump será o primeiro Presidente dos EUA a ser demitido.

Contudo, este cenário é pouco provável, já que os republicanos têm uma maioria confortável no Senado e já manifestaram a intenção de se unir na rejeição da pretensão de rejeitarem o processo espoletado pelos democratas.

O que está em causa

Os democratas tinham já afirmado ter o número de votos suficientes para garantir a vitória na votação no plenário da Câmara de Representantes, depois de o Comité Judiciário ter aprovado os dois artigos de destituição, na semana passada: abuso do exercício do cargo e obstrução ao inquérito do Congresso.

A investigação de ‘impeachment’ foi aberta, no início de outubro, depois de um delator ter revelado que Donald Trump tinha pedido ao Presidente ucraniano para investigar a atividade de Hunter Biden – filho de Joe Biden, ex-vice-Presidente e atual rival político do Presidente — junto de uma empresa da Ucrânia suspeita de corrupção, condicionando ajuda financeira ao anúncio dessa investigação.