No ato eleitoral de domingo, a socialista Ana Gomes ficou com cerca de 13%, o dirigente comunista João Ferreira com 4,27% e a eurodeputada do Bloco de Esquerda Marisa Matias com 3,95%. Há cinco anos os candidatos de esquerda obtiveram em conjunto 41,19%, então, já aí, o pior resultado desde as primeiras eleições presidenciais de 1976.
Nessas eleições presidenciais de 2016, surgiram duas candidaturas na área do PS, a do antigo reitor da Universidade de Lisboa Sampaio da Nóvoa, que alcançou 22,88% com mais de um milhão de votos, e a da antiga ministra Maria de Belém que teve 4,24%. O resultado de conjunto dos dois candidatos na área socialista, na ordem dos 27%, ficou bem acima daquele que agora foi obtido por Ana Gomes.
Das presidenciais de 2016 para 2021, a bloquista Marisa Matias perdeu mais de 300 mil votos, enquanto o dirigente do PCP João Ferreira ficou ligeiramente acima em termos percentuais do comunista Edgar Silva.
Mas o resultado dos três candidatos presidenciais de esquerda é ainda significativamente mais baixo se comparado com a dimensão popular dos partidos que pretenderam representar neste ato eleitoral.
Nas eleições legislativas de outubro de 2019, PS venceu com 36,34% (1.908.036 votos), o PAN teve 3,32% (174.511 votos) e o Livre 1,09% (57.172 votos), sendo que estes dois últimos partidos apoiaram formalmente a candidatura presidencial da diplomata e ex-eurodeputada socialista.
Ainda em relação às legislativas de outubro de 2019, o Bloco de Esquerda chegou aos 9,52%, com meio milhão de votos, e a CDU 6,33% (332.473 votos).
Os resultados destas eleições presidenciais indiciam por isso, em primeiro lugar, que uma larga maioria dos eleitores do PS votou pela reeleição do Presidente da República. Uma circunstância à qual não será estranha o facto de o secretário-geral do PS e primeiro-ministro, António Costa, assim como figuras socialistas como Ferro Rodrigues ou Augusto Santos Silva, terem sido incisivos nos elogios ao primeiro mandato presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa.
Marcelo Rebelo de Sousa teve mesmo o apoio formal de socialistas como o presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina, dos ex-ministros Vieira da Silva e Adalberto Campos Fernandes, de vários autarcas de peso, casos de Manuel Machado (Coimbra) e Eduardo Vítor Rodrigues (Porto), e do membro da Comissão Política do PS Álvaro Beleza.
Ana Gomes, dentro do PS, teve consigo o apoio de figuras históricas como Manuel Alegre, João Cravinho ou Vera Jardim, e também as chamadas "franjas" do partido: na ala direita, o antigo líder parlamentar Francisco Assis; na ala esquerda o ministro Pedro Nuno Santos e o líder da Federação da Área Urbana de Lisboa e secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro.
Além dos indicadores que revelam que o eleitorado de centro esquerda optou maioritariamente por Marcelo Rebelo de Sousa, houve também perdas relevantes por parte da bloquista Marisa Matias. Perdas que poderão ter beneficiado em parte a socialista Ana Gomes e que acontecem um mês e meio depois de o Bloco de Esquerda ter votado contra no parlamento a proposta do Governo de Orçamento do Estado para 2021, que foi viabilizado pelo PCP, PAN e PEV.
Observando a evolução política do Bloco de Esquerda desde 1999, outra quebra relevante aconteceu em 2011, com o fim do segundo executivo do PS de José Sócrates e na sequência de eleições legislativas antecipadas em que o PSD de Pedro Passos Coelho venceu e formou depois maioria de Governo com o CDS-PP de Paulo Portas.
Em relação à área do PCP, apesar de a campanha eleitoral feita pelo eurodeputado João Ferreira ter sido elogiada na esquerda política, sobretudo nos meios socialistas, o resultado ficou longe dos 7,4% de Francisco Lopes em 2011 ou dos 8,59% de Jerónimo de Sousa em 2006.
No PCP, tem-se registado uma perda eleitoral desde 2015 em legislativas e também em autárquicas, sobretudo nas de 2017, em que os comunistas perderam câmaras municipais como Almada, Barreiro ou Alcochete na Área Metropolitana de Lisboa.
Os analistas dividem-se se as mais recentes quedas do PCP em termos de votos são um resultado direto da viabilização dos governos de António Costa no parlamento, ou se, pelo contrário, apresentam uma causa mais estrutural e que estará ligada ao envelhecimento do seu eleitorado.
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