Hoje vulgarizado, o Cartão Jovem, lançado pelo então secretário de Estado da Juventude, Couto dos Santos, foi a 1 de julho de 1986 um acontecimento e um sucesso tal que “apanhou todos de surpresa”.
Explica-o José Garrido, na altura adjunto de Couto dos Santos e que liderou o projeto desde o início. Era tudo novo, a própria Secretaria de Estado da Juventude era uma ideia nova, e a equipa, instalada no Palácio das Laranjeiras, em Benfica (Lisboa), queria fazer um cartão para jovens. “Estávamos num cantinho nas Laranjeiras e na época não havia os equipamentos que há hoje. Estávamos no final de 1985, início de 1986, tínhamos um número minúsculo de pessoas a trabalhar nisso”, recorda o antigo responsável em entrevista à Lusa.
O projeto, lembra, trabalhou desde logo a ideia de ser um cartão para jovens dos 14 aos 25 anos, para ser visto como um ritual de passagem, um cartão identificativo, que tem a ver com uma geração, e que se tem orgulho em exibir na carteira.
Criada a filosofia era preciso ir atrás de empresas e instituições para conseguir descontos. Garrido lembra-se que a TAP não quis colaborar e da boa receção da CP e da Rodoviária, entre muitas outras empresas. Adesões confirmadas, imprimiu-se “um livrinho em A6 para entregar com o cartão, com as empresas e instituições participantes”, mais de 3.500.
E no dia 1 de julho, uma terça-feira, foi oficialmente lançado o cartão. E à equipa do “cantinho” das Laranjeiras “caiu-lhe o mundo em cima”. O livro “desapareceu do mercado” em dois dias, as tipografias não tinham capacidade de resposta, os cartões esgotaram-se, nalguns locais em poucas horas, e havia empresários “ofendidos” porque não tinham aparecido na lista, por lapso.
“As primeiras três semanas foram dramáticas porque todos queriam e nós não tínhamos o livrinho. E não havia cartões para toda a gente. Não fazíamos a menor ideia de que ia ser uma coisa assim. Sabíamos que era uma coisa com graça, que alguns iam aderir, mas nunca se pensou que fosse assim”, diz o responsável.
E no “cantinho” da Secretaria de Estado outro problema, este de consciência: “Começámos a pensar se seria correto estar a recolher aquela verba dos jovens”. O cartão custava 500 escudos (2,5 euros) mas com tamanha adesão a verba era elevada. Dados da altura indicaram que começou por haver 200 locais de venda do cartão e que os primeiros 50 mil exemplares se esgotaram no primeiro dia.
O cartão dava descontos entre cinco e 50 por cento e até “havia empresários a meterem cunha para entrar (na lista) a papelaria que tinha sido excluída”, porque era “era uma boa forma de comunicação”.
José Garrido ri-se quando lembra a “complexidade logística” da iniciativa, de ter de colocar os cartões nos pontos de distribuição, de fazer a lista de adesões. “Parece que foi há cem anos”, diz.
Porque desde então muito mudou. Hoje o Cartão Jovem banalizou-se e Garrido não sabe se será relevante para os jovens. Mas sabe que há 30 anos “as pessoas eram mais participativas, o acesso à informação era limitado” e a geração de então não era “uma geração videogame e facebook”.
A verdade é que o Cartão continuou a evoluir nos anos seguintes, com mais vantagens, alargado na idade e válido para outros países. Hoje continua assim e as vantagens, em Portugal ou no estrangeiro, são facilmente conhecidas numa rápida pesquisa na internet.
Nada como há 30 anos. Como as diretas a carregar dados e organizar as listas de adesões, num cantinho da Secretaria de Estado da Juventude.
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